O cuidado neurocrítico representa uma das fronteiras mais desafiadoras e tecnológicas da medicina intensiva. Pacientes com lesões neurológicas agudas — como AVC, TCE, status epilepticus ou encefalopatia anóxica — exigem abordagem especializada, centrada na prevenção de lesão secundária e otimização da recuperação funcional. Neste cenário, o avanço das estratégias de neuromonitoramento, o uso racional de terapias neuroprotetoras e a integração entre especialidades são fundamentais para reduzir mortalidade e incapacidade grave.
O que as evidências mostram até agora?
O campo evoluiu significativamente com a introdução de tecnologias como o EEG contínuo, a monitorização da pressão intracraniana (PIC) e a tomografia por perfusão cerebral. O EEG contínuo destaca-se por permitir a detecção precoce de crises subclínicas e por oferecer parâmetros prognósticos úteis mesmo em pacientes comatosos. Já a monitorização da PIC orienta intervenções terapêuticas baseadas em alvos de pressão de perfusão cerebral (PPC), ajudando a evitar hipoperfusão e herniação cerebral.
No arsenal terapêutico, o Targeted Temperature Management (TTM) permanece como uma das poucas intervenções com benefício consolidado após parada cardiorrespiratória, com crescente investigação em traumatismos e AVC. As inovações também se estendem ao uso de inteligência artificial (IA), dispositivos vestíveis com sensores fisiológicos e telemedicina, ampliando o alcance e a precisão da assistência neurointensiva.
O que ainda não está claro?
Apesar dos avanços, persistem lacunas importantes. Ainda não se estabeleceu o impacto definitivo da neuromonitorização contínua sobre desfechos funcionais em larga escala. A aplicação de terapias neuroprotetoras farmacológicas, como antagonistas de receptores NMDA ou sequestradores de radicais livres, carece de evidência robusta em ensaios clínicos.
Adicionalmente, questões éticas relacionadas à limitação de suporte, prognóstico e futilidade terapêutica continuam desafiadoras, especialmente em pacientes com lesão cerebral severa. O alto custo de tecnologias emergentes impõe barreiras à implementação ampla, principalmente em sistemas de saúde com recursos limitados.
Aplicações práticas para a beira do leito
Para o jovem médico e o residente que atuam na UTI, compreender os pilares do cuidado neurocrítico é essencial. Monitorização multimodal (EEG, PIC, imagem), protocolos bem definidos e trabalho interdisciplinar são fundamentais. A identificação precoce de deterioração neurológica, o manejo individualizado da PPC e a utilização criteriosa de TTM devem nortear a prática.
Mais do que tratar números, o objetivo é preservar cérebros em risco. O neurointensivismo não é apenas uma subespecialidade: é uma mentalidade baseada em vigilância contínua, raciocínio fisiopatológico e decisões compartilhadas com neurologistas, neurocirurgiões e intensivistas.
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