A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), tradicionalmente vista como uma doença degenerativa dos neurônios motores com progressão rápida e homogênea, tem se revelado, à luz das últimas décadas de pesquisa, um espectro clínico muito mais amplo e complexo. Para os médicos que realizam atendimentos em neurologia, entender essa heterogeneidade é essencial tanto para o diagnóstico quanto para a estratificação terapêutica e o acolhimento dos pacientes.
AAN 2025: Acompanhe a cobertura do congresso da American Academy of Neurology
Subtipos de início motor
A ELA pode se manifestar em diferentes territórios anatômicos motores, cada um com implicações prognósticas distintas:
- ELA de início espinhal
É o subtipo mais comum, com fraqueza assimétrica e indolor em membros. Costuma ter progressão mais lenta e melhor sobrevida (média de 3–5 anos). Sinais de neurônio motor inferior (atrofia, fasciculações) coexistem com sinais de neurônio motor superior (hiperreflexia, espasticidade).
- ELA de início bulbar
Representa cerca de 20% dos casos e tem início com disartria, disfagia e fasciculações linguais. Está associada a um pior prognóstico (sobrevida média de 2 anos), em parte por complicações precoces como aspiração e insuficiência respiratória.
- ELA de início respiratório
Subtipo raro (3–5%), com dispneia e ortopneia como primeiras queixas, muitas vezes sem sinais evidentes em membros. Evolui rapidamente, com sobrevida média inferior a 1,5 ano.
Leia também: Novas pesquisas em esclerose lateral amiotrófica
Subtipos de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) por padrão de envolvimento motor
A apresentação clínica da ELA pode variar conforme o predomínio relativo dos neurônios motores superiores (NMS) e inferiores (NMI):
a) Atrofia muscular progressiva (AMP)
Doença do adulto com envolvimento exclusivo dos NMI. Evolui rapidamente e corresponde a cerca de 5% dos casos. Alguns autores veem a AMP como parte do espectro da ELA.
b) Esclerose lateral primária (ELP)
Afeta predominantemente os NMS, com espasticidade e hiperreflexia marcadas. A progressão costuma ser lenta, e a sobrevida é significativamente maior que na ELA clássica. Só é diagnosticada após pelo menos 4 anos sem envolvimento dos NMI.
c) Síndromes de “flail arm” e “flail leg”
Subtipos com envolvimento predominantemente distal e assimétrico dos membros superiores ou inferiores, respectivamente. Têm curso mais indolente e sobrevida levemente superior à ELA clássica.
d) ELA hemiplégica (Síndrome de Mills)
Forma rara, com envolvimento unilateral inicial de NMS. A progressão é lenta, e o diagnóstico pode ser confundido com outras doenças corticospinhais.
e) ELA–DFT: Um Espectro clínico
A disfunção cognitiva deixou de ser um critério de exclusão para ELA. Hoje, entende-se que ELA e demência frontotemporal (DFT) fazem parte de um mesmo contínuo neurodegenerativo. Até 50% dos pacientes com ELA têm alguma alteração cognitiva, e 15–25% preenchem critérios para FTD. As formas ELA-DFT têm pior prognóstico (sobrevida média de 2,4 anos).
f) ELA como doença multissistêmica
Embora classicamente definida como doença motora, a ELA pode afetar outros sistemas:
- Extrapiramidal: parkinsonismo leve em 5–15% dos casos.
- Cerebelar: ataxia em pacientes com mutações C9orf72.
- Autonômico e sensorial: geralmente subclínicos, mas presentes em estudos específicos ou em fases avançadas.
- Oftalmoplegia e disfunção urinária: raras, associadas à longa sobrevida ou mutações específicas (como SOD1 D90A).
Implicações clínicas e terapêuticas
Compreender os subtipos de ELA vai além da mera taxonomia: afeta diretamente a abordagem terapêutica, o aconselhamento ao paciente e o desenho de ensaios clínicos. A heterogeneidade clínica está intrinsecamente ligada à diversidade genética, à variabilidade da progressão e às comorbidades neuropsiquiátricas. Estratégias futuras de tratamento precisarão ser cada vez mais personalizadas.
Conclusão
A ELA não é uma entidade única, mas um espectro de doenças com diferentes pontos de partida, ritmos de progressão e sistemas envolvidos. O reconhecimento e a compreensão desses subtipos clínicos são cruciais para neurologistas que desejam praticar uma medicina de precisão, humanizada e cientificamente embasada.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.