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Neurologia14 maio 2025

Diretrizes baseadas em evidências de tratamento abortivo para migrânea

Diretriz buscou fornecer aos profissionais de saúde recomendações baseadas em evidências para o tratamento farmacológico da migrânea
Por Danielle Calil

Neste ano, a revista Cephalalgia atualizou as recomendações para o tratamento farmacológico da migrânea, abrangendo tanto o manejo abortivo quanto o preventivo. Dada a extensão do documento, esta primeira parte abordará as principais novidades referentes ao tratamento abortivo, enquanto a próxima coluna será dedicada ao tratamento profilático. 

Entre as atualizações, destaca-se a incorporação de evidências recentes sobre o uso de gepantes e ditans como alternativas aos triptanos, especialmente em pacientes com contraindicações cardiovasculares. O guideline orienta a escolha terapêutica com base no perfil clínico e nas comorbidades do paciente, sempre fundamentado em evidências científicas robustas. 

Evidências de drogas abortivas  

Classe Droga e doses  Nível de recomendação 
Analgésicos e AINEs Ibuprofeno 200-600 mg  Forte 
Naproxeno 500-825 mg 
Diclofenaco 50 mg 
Triptanos Sumatriptano (oral/nasal/SC)  Forte 
Rizatriptano 
Zolmitriptano 
Eletriptano 
Frovatriptano 
Paracetamol Paracetamol 1.000 mg oral Moderado 
Combinações analgésicas Paracetamol + AAS + Cafeína Moderado 
Ditans Lasmiditan 50-200 mg oral Forte (em contraindicação aos triptanos) 
Gepants Rimegepant 75 mg  Forte (em contraindicação aos triptanos) 
Ubrogepant 50-100 mg 
Zavegepant nasal 
Antieméticos Metoclopramida 10 mg  Adjuvante 
Opioides e derivados do ergot Evitar rotineiramente; uso restrito Não recomendado de rotina 

Diretrizes baseadas em evidências de tratamento abortivo para migrânea

Tratamento para migrânea: Opiniões sugeridas por especialistas

AINEs 

Não há diferenças clínicas relevantes entre os AINEs (ibuprofeno, naproxeno, diclofenaco) para tratamento agudo. A escolha deve ser guiada por perfil de segurança, tolerabilidade e disponibilidade. 

É recomendada que a administração do AINE seja na menor dose efetiva (a fim de evitar efeitos gastrointestinais adversos), de forma mais precoce possível para aumentar a eficácia da droga. Sempre priorizar AINEs caso o indivíduo tenha tolerância em comparação aos coxibes (diante do risco de efeito colateral cardiovascular desse último). 

O uso de indometacina é limitado para casos particulares como algumas cefaleias trigeminoautonômicas. Portanto, é medicação que não deve ser considerada inicialmente para migrânea visto que faltam ensaios clínicos para mostrar sua eficácia. 

Triptanos 

Conforme a Tabela acima, as drogas dessa classe apresentam forte recomendação para eficácia. Tais drogas devem ser também administradas o mais precocemente possível, idealmente dentro da primeira hora após o início da crise e ainda com dor leve. O uso dos triptanos deve ser considerado primeira linha em pacientes com crises graves e incapacitantes, e como segunda linha quando analgésicos simples não forem eficazes em crises de leve a moderada intensidade.  

As formulações intranasal e dispersíveis orais devem ser preferíveis em caso de crises com presença de náuseas moderadas a graves (para garantir uma rápida ação); por outro lado, a formulação subcutânea pode ser priorizada para crises de dor de difícil resposta. 

Na recidiva da cefaleia após um tratamento inicialmente eficaz, a orientação é repetir a administração do triptano (respeitando um intervalo mínimo de 2 horas em relação à dose anterior). No entanto, se as recidivas forem frequentes, recomenda-se a troca para outro triptano com maior tempo de meia-vida (ex. naratriptano, eletriptano, frovatriptano) ou associação com formulações de AINEs de ação rápida (ex. naproxeno, ibuprofeno ou diclofenaco).     

Para definir se um paciente é ou não respondedor ao triptano, é necessário administrar o mesmo medicamento em pelo menos duas ocasiões adicionais após uma primeira tentativa sem sucesso, antes de considerá-lo “não-respondedor”. Ademais, é sugerido testar pelo menos três triptanos diferentes antes de concluir que o paciente não responde à classe como um todo. Em situações em que o triptano não seja bem tolerado, mas os efeitos adversos sejam leves a moderados, recomenda-se considerar a redução da dose antes de descontinuar a medicação. 

Para prevenir a cefaleia por abuso de analgésicos, orienta-se limitar o uso de triptanos a menos de 10 dias por mês. As diferenças farmacocinéticas entre triptanos devem ser levadas em conta na escolha do fármaco: frovatriptano, eletriptano e naratriptano são preferíveis para crises de longa duração ou com alta taxa de recidiva, enquanto o rizatriptano é mais indicado em crises com rápida escalada da dor ou que se manifestam de forma intensa ao despertar. 

Em relação a situações especiais, como gravidez, o uso de triptanos pode ser considerado uma opção de segunda linha nos casos em que o paracetamol não seja eficaz, sendo sumatriptano, naratriptano e rizatriptano as opções preferenciais. Durante a lactação, triptanos também podem ser utilizados como segunda linha em caso de falha dos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), com preferência para o eletriptano. Nesses casos, recomenda-se suspender a amamentação por 12 horas após a administração da dose. 

Paracetamol 

A administração de paracetamol 1.000 mg por via oral no início dos sintomas de migrânea. Caso a primeira dose não seja eficaz, uma segunda dose pode ser tomada após um intervalo de seis horas. No entanto, não se recomenda ultrapassar duas doses de 1.000 mg em um período de 24 horas. Se a segunda dose também não for eficaz, orienta-se a utilização de um medicamento alternativo para o tratamento agudo da crise. 

Combinações analgésicas 

Indicadas para crises de intensidade moderada a severa, principalmente quando monoterapias falham. As combinações de analgésicos, como paracetamol + AAS + cafeína, mostraram eficácia superior ao placebo em crises leves a moderadas. Sua indicação permanece como alternativa em pacientes que não respondem a monoterapia com AINE ou triptano. 

Ditans e gepants 

Gepants (rimegepant, ubrogepant, zavegepant) e ditans (lasmiditan) são indicados para pacientes com contraindicação ao uso de triptanos. A decisão pelo uso deve considerar perfil de segurança e preferência do paciente​. 

Lasmiditan pode ser utilizado sem restrições em pacientes com risco ou doença cardiovascular. Os gepants surgiram nos anos 2000 como opção para tratamento sintomático da migrânea, mas seu desenvolvimento inicial foi interrompido pela toxicidade hepática do telcagepant. Gepants de segunda geração corrigiram esse problema e foram aprovados pelo FDA para uso agudo: rimegepant, ubrogepant e rimegepant. O zavegepant, de terceira geração, destaca-se pela administração intranasal. 

Antieméticos 

Apesar de amplamente utilizados para controlar náuseas nas crises de migrânea, os antieméticos não são recomendados como monoterapia abortiva da dor, devido à baixa qualidade das evidências. Sua principal indicação é como terapia adjuvante, associada às medicações padrão. O uso isolado deve ser reservado a casos em que paracetamol, AINEs ou fármacos específicos para migrânea sejam ineficazes ou contraindicados, especialmente em pacientes com náuseas e vômitos intensos. 

Opioides e ergotamínicos 

Desaconselhados como primeira linha devido ao alto risco de dependência, efeitos adversos e uso excessivo. Reservados para casos refratários sem alternativa viável. 

Comparações head-to-head no tratamento abortivo para migrânea

O guideline publicado na Cephalalgia também expôs as evidências de comparações diretas entre estudos que comparam dois tratamentos diretamente entre si, sem grupos placebo intermediários.  

Analgésicos versus AINEs 

Analgésicos simples (como paracetamol isolado) são menos eficazes do que AINEs em crises moderadas a graves, devendo ser reservados para crises leves ou em situações específicas. 

AINEs versus triptanos 

Comparando triptanos e AINEs, os triptanos mostraram-se mais eficazes em crises moderadas a graves, enquanto os AINEs seguem como primeira opção em crises leves ou moderadas. A associação de triptano com AINE (ex. naproxeno) pode ser considerada em crises de difícil manejo ou com alta taxa de recidiva. 

Triptanos versus triptanos 

Em relação aos triptanos, não houve superioridade consistente de um agente sobre outro. O sumatriptano subcutâneo destaca-se por seu início de ação mais rápido, embora com maior incidência de efeitos adversos, enquanto eletriptano e rizatriptano apresentam boa eficácia e tolerabilidade. A escolha entre triptanos deve considerar via de administração, perfil do paciente e resposta prévia. 

Triptanos versus ditans e gepants 

Embora eficazes, ditans e gepants não demonstraram superioridade em eficácia quando comparados diretamente aos triptanos, mas apresentam perfis de segurança mais favoráveis, especialmente em populações com risco cardiovascular. Comparações head-to-head entre ditans e gepants ainda são limitadas e carecem de estudos robustos. Ambas as classes são consideradas alternativas seguras para situações específicas, como contraindicação ou intolerância aos triptanos. 

Mensagens práticas 

  • AINEs e triptanos continuam como primeira escolha; 
  • Tratamento precoce é fundamental na eficácia em abortar a crise migranosa; 
  • Gepants e ditans são alternativas seguras para populações específicas; 
  • Associações analgésicas oferecem benefício adicional em casos selecionados; 
  • Antieméticos são coadjuvantes importantes; 
  • Opioides e ergotamínicos devem ser evitados.

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Referências bibliográficas

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