Os aspectos clínico-laboratoriais da vitamina D são um assunto sempre atual, que gera um grande interesse e repercussão no meio médico.
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Contexto histórico
Em 2017, a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML), em conjunto com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), lançaram o primeiro consenso de especialidades médicas sobre esse tema. Tal documento foi produzido com a finalidade de auxiliar a prática clínica quanto à solicitação, interpretação dos resultados e definição dos valores de referência.
No ano seguinte, houve uma atualização do consenso, com a inclusão de 3 novas patologias (diabetes, sarcopenia e neoplasias malignas) no grupo de risco para hipovitaminose D. Outra informação importante acrescentada, diz respeito à possibilidade de uma variação analítica de até 21,5% entre os diversos kits/ensaios laboratoriais disponíveis, o que pode levar a resultados discrepantes entre os diferentes Laboratórios Clínicos.
A nova publicação
Recentemente, a SBPC/ML e a SBEM publicaram um novo posicionamento sobre os valores de referência no periódico Archives of Endocrinology and Metabolism. Dessa vez destacando, além de outros aspectos, o intervalo de referência (mais precisamente o limite superior) considerado normal para a população geral. Também foi alterada a idade, de 60 para 65 anos, dos pacientes considerados do grupo de risco, além da revisão das doenças sistêmicas e osteometabólicas listadas.
O artigo trouxe considerações sobre as atuais metodologias para a determinação da 25(OH)D, os grupos de risco mais suscetíveis à hipovitaminose D, as condições clínicas sob as quais estão indicadas a manutenção de níveis mais altos (entre 30 e 60 ng/mL), bem como os limites superiores considerados seguros e as concentrações com risco aumentado de intoxicação.
Os grupos com maior risco para a deficiência de vitamina D foram divididos em 3 conjuntos principais, de acordo com a sua fisiopatologia:
- Produção insuficiente: idade avançada, pele escura, barreiras físicas (ex.: roupas religiosas, protetor solar), obesidade, exposição solar diminuída (ex.: gravidez, pós-transplantados), insuficiência hepática, insuficiência renal, raquitismo hipofosfatêmico ligado ao X, dentre outros;
- Consumo/metabolização aumentada: medicamentos (ex.: antibióticos, carbamazepina, fenobarbital, fenitoína, efavirens, tenofovir, isoniazida), condições inflamatórias (lúpus eritematoso sistêmico, tuberculose, artrite reumatoide), hiperparatireoidismo primário, tratamento para osteoporose com teriparatida ou PTH (1-84);
- Absorção intestinal diminuída: má absorção (ex.: doenças inflamatórias, fibrose cística, doença celíaca, doença de Crohn, insuficiência pancreática), cirurgia bariátrica, ressecção intestinal ou pancreática, medicamentos (orlistate, colestiramina);
As categorias clínicas e grupos que se beneficiam de concentrações acima de 30 ng/mL, foram assim elencadas: Idosos (> 65 anos), gestantes, osteoporose (primária ou secundária), fraturas devido à fragilidade, doenças osteometabólicas (ex.: osteogênese imperfeita, osteomalácia, hiperparatireoidismo primário), hiperparatireoidismo secundário, sarcopenia, doença renal crônica, quedas recorrentes, síndrome de má-absorção, anorexia nervosa, câncer e insuficiência hepática.
Já o excesso de vitamina D (acima de 90-100 ng/mL em adultos) pode levar a um quadro de intoxicação e hipercalcemia (devido ao aumento da absorção intestinal, bem como da reabsorção óssea e renal desse íon). Sintomas associados aos altos níveis de cálcio podem estar presentes, como náuseas/vômitos, anorexia, prostração, desidratação e insuficiência renal aguda. Em crianças, o risco de toxicidade e hipercalcemia parece ocorrer concentrações menores de 25(OH)D.
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Novo modelo de laudo laboratorial
Até o momento, as evidências indicam que não há benefício em se manter níveis de 25(OH)D superiores a 60 ng/mL, independentemente da condição clínica. Dessa maneira, foi proposto um novo padrão de laudo para os intervalos de referência da 25(OH)D, evidenciando os valores do limite superior da normalidade para a população geral:
Deficiência: < 20 ng/mL;
Valores normais para a população geral: de 20 a 60 ng/mL;
Valores ideais para população de risco*: de 30 a 60 ng/mL;
Risco de intoxicação: > 100 ng/mL.
* Entende-se por população de risco: idosos (acima de 65 anos), gestantes, indivíduos com fraturas e quedas frequentes, pós-cirurgia bariátrica, em uso de fármacos que interferem no metabolismo da vitamina D, doenças osteometabólicas (osteoporose, osteomalácia, osteogênese imperfeita, hiperparatireoidismo primário e secundário), sarcopenia, diabetes mellitus tipo 1, doença renal crônica, insuficiência hepática, anorexia nervosa, síndrome de má absorção e câncer.
Conclusão
Embora a 1,25(OH)2D seja o metabólito biologicamente ativo, a 25(OH)D é o marcador de preferência para a avaliação do status nutricional da vitamina D; em função de sua meia-vida mais longa (2 a 3 semanas), menor flutuação, facilidade e ampla disponibilidade para sua quantificação.
Devido às suas propriedades calciotrópicas, a vitamina D possui um papel essencial no metabolismo ósseo e mineral, além de estar envolvida em outros processos biológicos (funcionamento do sistema neurológico, imunológico e na diferenciação celular, por exemplo).
Os valores de referência para vitamina D ainda permanecem um tema controverso, com diferentes propostas em guidelines internacionais. Os valores abordados por esse consenso estão baseados em dados recentes da literatura, e que podem ser alterados no caso do surgimento de novas evidências.
Referências Bibliográficas:
- Posicionamento Oficial da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) – Intervalos de Referência da Vitamina D – 25(OH)D – 2017 [Internet]. Disponível em: http://www.sbpc.org.br/wp-content/uploads/2017/12/PosicionamentoOficial_SBPCML_SBEM.pdf. (Acesso em: 05/07/2020).
- Posicionamento Oficial da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) – Intervalos de Referência da Vitamina D – 25(OH)D – Atualização 2018 [Internet]. Disponível em: http://bibliotecasbpc.org.br/arcs/pdf/PosicionamentoOficial_SBPCML_SBEM_2018.pdf. (Acesso em: 05/07/2020).
- Posicionamento de intervalos de referência de Vitamina D. Disponível em: http://www.sbpc.org.br/noticias-e-comunicacao/novos-intervalos-de-referencia-de-vitamina-d/
- Moreira, CA, et al. Reference values of 25-hydroxyvitamin D revisited: a position statement from the Brazilian Society of Endocrinology and Metabolism (SBEM) and the Brazilian Society of Clinical Pathology/Laboratory Medicine (SBPC). Arch. Endocrinol. Metab. [Internet]. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2359-39972020005003202&lng=en. https://doi.org/10.20945/2359-3997000000258. (Acesso em 05/07/2020).
- SBPC/ML e SBEM sugerem novo modelo de laudo laboratorial para 25-hidroxivitamina D. Disponível em: http://www.sbpc.org.br/noticias-e-comunicacao/sbpcml-e-sbem-sugerem-novo-modelo-de-laudo-laboratorial-para-25-hidroxivitamina-d/
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