Ainda sobre o primeiro dia do 18º Congresso Brasileiro de Medicina de Família e Comunidade (CBMFC 2025), realizado em Manaus, o minicurso “Praticando a abordagem centrada na comunidade: uma proposta de sistematização” chamou a atenção pela sua proposta concreta e aplicável. Com foco em transformar o conceito de orientação comunitária em ações reais nos territórios, os médicos de família Lorena Mega Itaborahy e Rodrigo Santos Custodio Oliveira compartilharam um conjunto robusto de ferramentas que podem ser incorporadas ao dia a dia das equipes de Atenção Primária.
A seguir, apresentamos resumidamente o repertório de ferramentas discutidas no curso, com breves explicações e destaque para aquelas consideradas estruturantes no processo de intervenção comunitária.
Conhecendo o território
Territorialização: Processo de análise sistemática do território e sua população, com o objetivo de conhecer os determinantes de saúde e planejar ações mais eficazes. Permite a organização de microáreas e a definição de prioridades locais.
Mapa Vivo: Ferramenta participativa que representa, com apoio da comunidade, a realidade local em termos sociais, econômicos, ambientais e de saúde. É útil tanto para diagnóstico quanto para planejamento e monitoramento. É “vivo” justamente por ser modificável ao longo do tempo e do contexto.
Georreferenciamento: Utiliza dados espaciais para mapear a distribuição de condições de saúde e serviços, identificando barreiras geográficas e populações vulneráveis. Auxilia na alocação de recursos e na visualização de padrões de adoecimento.
Ecomapa comunitário: Ecomapa aplicado à comunidade, em vez de a nível individual. Representação gráfica das conexões entre famílias, instituições e redes de apoio social no território. Permite identificar pontos de vulnerabilidade e oportunidades de fortalecimento comunitário.
Observação participante: Envolve a presença ativa do profissional no cotidiano do território, promovendo uma escuta qualificada e a compreensão do contexto local a partir da convivência direta com a população.
Coleta de dados secundários: Levantamento de informações já existentes (como dados do IBGE, prontuários eletrônicos, boletins epidemiológicos) para embasar o diagnóstico situacional e complementar a observação de campo.
Abordagem comunitária de diagnóstico
Estimativa Rápida Participativa (ERP): Metodologia de coleta de dados realizada com a participação da comunidade, voltada à identificação das necessidades sentidas pela população. É composta por três etapas: organização da pesquisa, sistematização da área e trabalho de campo.
Diagnóstico situacional comunitário: Integra dados primários e secundários para construir um panorama abrangente do território, identificando determinantes sociais, problemas prioritários e recursos existentes.
Diagnóstico de demanda e acesso: Avaliação da procura e de atendimentos pelo serviço de saúde para compreender o que leva (ou impede) a população a procurar as equipes de saúde, possibilitando um maior ajuste da oferta de acordo com as reais necessidades do território.
Veja também: CBMFC 2025: Abordagem comunitária na prática do médico de família
Planejamento e intervenção
Árvore de problemas: Método de análise causal que ajuda a identificar as raízes e consequências de um problema de saúde comunitário, facilitando a definição de prioridades de intervenção.
Diagrama de Ishikawa (espinha de peixe): Ferramenta de visualização que organiza as causas de um problema específico em categorias, favorecendo a análise de fatores estruturais, organizacionais e contextuais.
Planejamento estratégico situacional (PES): Abordagem que considera o contexto político, social e institucional do território para elaborar estratégias realistas, participativas e orientadas por resultados.
Planilha de intervenção comunitária: Modelo estruturado para registrar objetivos, responsáveis, prazos e indicadores de ações comunitárias, facilitando a organização e o acompanhamento do plano de ação.
Grupos operativos: Espaços coletivos voltados à educação em saúde, escuta ativa e construção de soluções conjuntas. Podem ter caráter educativo, terapêutico ou mobilizador, de acordo com os objetivos definidos.
Consultórios territorializados: Comumente chamado de “consultório avançado”, se refere à organização de atendimentos regulares no território, fora da unidade, utilizando referências comunitárias, reforçando o vínculo entre equipe e população e integrando clínica e território.
Articulação intersetorial: Construção de parcerias com setores como educação, assistência social, cultura e segurança para enfrentar determinantes sociais de forma conjunta e integrada.
Monitoramento e avaliação
Vigilância em saúde: Abordagem integrada que utiliza dados clínicos e epidemiológicos para monitorar agravos e vulnerabilidades, permitindo respostas mais ágeis e focadas.
Governança clínica: Processo de gestão participativa da prática assistencial, que busca qualidade, segurança e efetividade no cuidado em saúde, envolvendo profissionais, gestores e comunidade.
Ciclo PDCA: Ferramenta de gestão que propõe um ciclo contínuo de planejamento (Plan), execução (Do), checagem (Check) e ajuste (Act) das ações comunitárias, favorecendo a melhoria constante.
Planilha de monitorização em saúde: Instrumento para acompanhar indicadores definidos previamente, garantindo a avaliação contínua do progresso das intervenções.
Conclusões práticas: ferramentas de abordagem comunitária
- A abordagem comunitária exige planejamento, sistematização e envolvimento contínuo com o território.
- As ferramentas apresentadas no minicurso facilitam a incorporação do cuidado coletivo à rotina das equipes de MFC.
- Algumas ferramentas (como ERP, mapa vivo e grupos operacionais) têm maior potencial de impacto quando associadas a metodologias participativas.
- A integração entre clínica individual, vigilância e planejamento territorial fortalece a resolutividade e o vínculo com a comunidade.
Confira a cobertura do CBMFC 2025 aqui no Portal Afya!
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