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Infectologia16 março 2017

Sepse: entenda a importância do balanço hídrico negativo

Dois médicos elaboraram uma revisão sobre a lógica fisiopatológica, a importância e o benefício do balanço hídrico negativo no paciente com sepse.

Por Hassan Rahhal

Tempo de leitura: [rt_reading_time] minutos.

Dois médicos e pesquisadores brasileiros elaboraram uma revisão publicada no periódico Shock, no início de 2017, sobre a lógica fisiopatológica, a importância e o benefício do balanço hídrico negativo no paciente com sepse, tudo isso, a partir das evidências presentes na literatura. Eles utilizaram dados e conclusões dos principais estudos a respeito do tema para fundamentar o trabalho. Abaixo, foram destacados os principais pontos a respeito da publicação.

Expansão volêmica inicial do paciente

Como muitos dos leitores devem saber, a mais famosa diretriz internacional para tratamento da sepse é desenvolvida pelo grupo Surviving Sepsis, e coloca como um dos passos iniciais (e um dos mais importantes) a expansão volêmica adequada do paciente. O pressuposto fisiopatológico é que o paciente infectado comumente se apresenta com algum grau de desidratação associada, apresenta vasodilatação pela inflamação (aumento do continente sem aumento do conteúdo), e associa algum grau de disfunção sistólica miocárdica a partir de algum momento da doença. Além disso, a partir de um trabalho (muito controverso) desenvolvido por Rivers et cols, surgiu a evidência inicial embasando um protocolo de metas hemodinâmicas que tem a expansão volêmica como o primeiro passo.

Contudo, vários outros trabalhos falharam ao tentar demonstrar a eficácia do protocolo instituído por Rivers, e surgiram evidências mais consistentes demonstrando alguns malefícios do uso das soluções comumente utilizadas para expansão volêmica.

Apesar de os trabalhos subsequentes da Rivers falharem na obtenção de resultados positivos a partir de um protocolo de metas hemodinâmicas, a maior parte dos pacientes envolvidos recebeu uma expansão volêmica inicial em torno de 30 mL/Kg (alguns trabalhos com até 60 mL/Kg), e essa conduta inicial encontra um embasamento fisiológico consistente e seria difícil de ser testada. Portanto, o maior debate é a respeito das expansões volêmicas que são feitas após essa etapa inicial, pois ainda é comum que o paciente que novamente se apresenta hipotenso receba novas alíquotas de soro.

Mais do autor: ‘Estratégias para lidar com a miopatia por estatinas’

Expansões volêmicas subsequentes – o provável malefício

Trabalhos avaliando balanço hídrico positivo associaram piores desfechos nos pacientes pós-operatórios, oncológicos, com insuficiência renal e com ventilação mecânica invasiva ou não. Além disso, trabalhos especificamente desenvolvidos com pacientes sépticos vêm somando evidências desfavoráveis a essa conduta.

A lógica fisiopatológica para que se obtenham resultados piores envolve alguns pontos ainda em compreensão. Com maiores infusões de soro, existe a tendência de aumento dos valores da pressão venosa central (PVC). Esse aumento da PVC gera, inicialmente, um aumento do retorno venoso e faz com que os miócitos trabalhem num ponto mais adequado da curva de Frank-Starling, aumentando assim o débito cardíaco. O problema é que a partir de determinado momento o aumento da PVC não gera mais esse efeito. Por outro lado, a perfusão tecidual depende de uma gradiente de pressão entre arteríola e vênula pós-capilar, mas o aumento da PVC reduz esse gradiente e começa a gerar dois efeitos: congestão tecidual e piora da perfusão tecidual. Contribui para esse processo a lesão do glicocálice endotelial provocada pela sepse, a qual provoca o aumento da permeabilidade vascular.

Especula-se que isso provoque as disfunções renal, hepática, pulmonar e microcirculatória. Por fim, a disfunção renal irá contribuir ainda mais para balanços hídricos positivos.

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Quando e como promover o balanço hídrico negativo

A partir dos avanços na compressão da fisiologia humana e da fisiopatologia do paciente com choque (séptico ou não), foi possível a criação de um modelo conceitual que facilite a explicação do manejo do paciente com choque (imagem 1).

Numa fase inicial, o paciente tem a indicação de receber uma expansão volêmica e o balanço positivo se faz necessário. Contudo, numa próxima etapa, a manutenção do balanço hídrico positivo é prejudicial. Com isso, devemos entender que o benefício de alíquotas de soluções salinas é menor conforme o tempo desde a admissão do paciente cresce, inclusive podendo gerar malefícios. Após uma adequada expansão volêmica, o paciente séptico deve então ser manejado com drogas vasopressoras e/ou inotrópicas, sem novas alíquotas de expansão com solução salina por episódios de hipotensão.

Imagem 1: retirada na íntegra de Besen BA et Taniguchi LU.

De forma geral, a expansão volêmica tem benefício dentro das primeiras 24 horas da admissão do paciente com choque, e a falta de uma resposta adequada deve indicar o uso de vasopressores e/ou inotrópicos. A partir do terceiro dia, já devemos pensar em promover um balanço hídrico negativo, que deve ser alcançado através da utilização de diuréticos (como a furosemida) ou mesmo da diálise com ultrafiltração.

Referência:

  • Besen BA, Taniguchi LU. Negative fluid balance in sepsis: when and how? Shock. 2017 Jan;47(1S Suppl 1):35-40
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