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Infectologia17 setembro 2024

Revisão de ectoparasitas: sarna, percevejos e piolhos 

O diagnóstico preciso de infestação por ectoparasitas requer um histórico, incluindo fatores sociais de saúde e exame físico.

Os ectoparasitas são um grupo de parasitas que infestam o lado externo do corpo dos hospedeiros, seja na pele, roupas ou ambiente. Entre os ectoparasitas, os agentes causadores de sarna, os percevejos e os piolhos corporais estão entre os mais comumente diagnosticados. 

Revisão de ectoparasitas: sarna, percevejos e piolhos 

Sarna 

A sarna é causada pela infestação de ácaros da espécie Sarcoptes scabiei var hominis. Esses parasitas têm um ciclo de vida de 14 dias e vivem inteiramente na epiderme humana. 

As fêmeas depositam seus ovos nas camadas mais superficiais da pele, os quais eclodem em 3 a 4 dias. Em 1 a 2 semanas, os ácaros tornam-se adultos. As reações de hipersensibilidade na pele ocorrem 4 a 6 semanas depois, resultando nas manifestações cutâneas típicas da sarna. 

A transmissão dos ácaros ocorre prioritariamente por meio de contato pele a pele, por no mínimo de 15 a 20 minutos. Transmissão entre hospedeiros por meio de fômites, incluindo roupas, é incomum, mas pode acontecer em situações de infestação maciça. 

As lesões de sarna variam de pápulas e placas eczematosas a manifestações crônicas de prurido, como escoriações, prurigo nodular e linequificação. Um achado patognomônico é o de uma lesão com aspecto de corda curvilínea e que termina em uma erosão ou vesícula onde o ácaro está localizado. As lesões são mais frequentes no espaço entre os dedos das mãos e pés, área volar dos pulsos, tornozelos, axilas, glúteos, genitália masculina e aréolas mamárias. 

Variantes atípicas podem incluir sarna nodular (pápulas firmes que variam de rosa a hiperpigmentadas e nódulos, observados na genitália masculina e em crianças), envolvimento de couro cabeludo (crianças, jovens adultos e indivíduos imunossuprimidos) e sarna bolhosa (bolhas e vesículas tensas). 

O prurido associado começa aproximadamente 4 a 6 semanas após o início da infestação, devido à sensibilização tardia a antígenos dos ácaros. Nos casos de reinfestação, o prurido pode começas nas primeiras 24h de infestação. Geralmente é grave, difuso e pior à noite, mas em crianças, jovens adultos e indivíduos em uso de tratamentos anti-inflamatórios ou imunossupressores pode ser mínimo ou estar ausente. 

Superinfecção bacteriana por Staphylococcus aureus ou Streptococcus do grupo A pode se desenvolver como complicação devido à coceira persistente, podendo se manifestar como impetigo, abscessos, celulites e infecções profundas de pele e partes moles. 

A sarna crostosa, também conhecida como sarna norueguesa, manifesta-se com placas psoriásicas e hiperceratóticas difusas, frequentemente envolvendo couro cabeludo, face, dedos, unhas, região periumbilical e genitália. Condições associadas incluem imunossupressão, condições neurológicas como doença de Alzheimer, infecção pelo HIV e por HLTV-1. Nesses pacientes, o prurido também pode estar ausente. 

O diagnóstico pode ser difícil, especialmente quando o prurido é leve, quando há uso de corticoides tópicos (que podem modificar a aparência de lesões) ou quando há manifestações atípicas. O consenso de 2020 da Aliança Internacional para o Controle de Sarna estabelece critérios diagnósticos baseados em achados clínicos, epidemiológicos e microscópicos. Esse consenso classifica os casos em confirmados, clínicos ou suspeitos. 

  • Caso confirmado: visualização de ácaros, ovos ou fezes em microscopia ou visualização de ácaros em dermatoscopia. 
  • Caso clinicamente diagnosticado: presença de lesões típicas na genitália masculina ou de lesões típicas em distribuição típica e duas características epidemiológicas (prurido, história de contato). 
  • Caso suspeito: presença de lesões típicas em distribuição típica com uma característica epidemiológica ou presença de lesões de características ou distribuição atípicas com duas características epidemiológicas. 

O tratamento pode ser feito com permetrina tópica ou, em casos em que a terapia tópica não é possível ou pode exacerbar condições de pele subjacentes, com opções orais, como ivermectina. Para os casos de sarna crostosa, as terapias tópica e oral devem ser associadas. Embora o prurido relacionado à sarna não seja mediado por histamina, a sedação associada ao uso de anti-histamínicos de primeira geração pode fornecer alívio sintomático. 

Recomendam-se medidas de descontaminação para evitar a transmissão por fômites. Roupas e peças de lavanderia devem ser expostas a temperaturas de pelo menos 50 °C por no mínimo 10 minutos com água quente ou secagem a altas temperaturas. Se não for possível, devem ser colocadas em um saco plástico por no mínimo 72 horas, mas períodos mais prolongados podem ser necessários em locais com maior umidade relativa. 

Os contatos próximos de indivíduos com sarna — definidos como contatos domiciliares ou indivíduos com contato pele a pele conhecido — devem ser tratados empiricamente de forma tópica ou oral, mesmo se assintomáticos. O prurido pode persistir por semanas a meses após tratamento adequado. Corticoides tópicos, anti-histamínicos orais e gabapentinoides podem ser usados para alívio sintomático. 

Percevejos 

Os percevejos são insetos que infestam habitações humanas e que se alimentam de sangue humano, o que pode levar a reações cutâneas. As espécies mais frequentes são o percevejo comum (Cimex lectularius) e o percevejo tropical (C. hemipterus). Os percevejos crescem em ambientes escuros e quentes e comumente vivem em colchões, móveis, paredes e pisos. São insetos de hábitos noturnos e que são atraídos pela temperatura corporal e exalação de dióxido de carbono. 

O diagnóstico de infestação por percevejos é baseado em história, achados cutâneos e inspeção do ambiente. Relatos de viagem recente e hospedagem em locais com alta rotatividade de pessoas, como hotéis, albergues e abrigos, de novas lesões ao acordar, e de sintomas semelhantes em coabitantes devem aumentar a suspeita do diagnóstico. 

Os achados típicos incluem pápulas eritematosas múltiplas em áreas expostas como cabeça, pescoço e extremidades. As pápulas podem ter um ponto hemorrágico e podem estar agrupados ou em uma distribuição linear. As mordidas podem também causar reações bolhosas localizadas e urticária papular difusa, resultantes de resposta contra proteínas salivares do inseto. 

A maioria das reações cutâneas são autolimitadas e se resolvem após 1 semana, sem tratamento. Controle sintomático pode ser obtido com corticoides tópicos de média potência, mas anti-histamínicos e gabapentinoides podem ser usados, se necessários. Antibióticos tópicos ou sistêmicos podem ser necessários se houver infecção bacteriana secundária associada. 

A erradicação do ambiente é alcançada com maior frequência com a integração de múltiplas estratégias, o que pode ser difícil e necessitar de equipe profissional. Medidas preventivas incluem inspeção cuidadosa do ambiente e isolamento e inspeção de móveis usados antes do uso. 

Piolhos corporais 

A infestação por piolhos corporais é causada por insetos da espécie Pediculus humanus humanus e ocorre em indivíduos com dificuldade em manter higiene pessoal adequada. Indivíduos sob risco incluem aqueles em situação de rua, que não possuem acesso frequente a locais de banho e os com doença mental, disfunção cognitiva ou deficiência física. 

As manifestações cutâneas são inespecíficas e mais frequentemente incluem máculas eritematosas e comumente escoriadas, pápulas ou placas, hiperpigmentação e liquenificação. Urticária e bolhas também podem estar presentes. As lesões estão tipicamente localizadas na parte lateral da cintura, áreas mediais e laterais das pernas e região posterior dos ombros e parte superior do dorso. A inspeção visual deve estar concentrada nas roupas, que frequentemente contêm mais insetos do que a pele.  

A infestação por piolhos corporais pode levar a complicações sistêmicas, estando associada a anemia, por exemplo. Infecções bacterianas secundárias podem estar presentes e os piolhos podem agir como vetores para Bartonella quintana, Borrelia recurrentis e Rickettsia prowazkii. 

A primeira linha de tratamento e prevenção é banho e lavagem de vestuário e roupas de cama ao menos uma vez na semana com água quente (mínimo de 54 °C) e secagem em alto ciclo de temperatura. Se essa lavagem não for possível, as peças de vestuário e lavanderia podem ser isoladas e selados em um saco plástico por 2 semanas. Corticoides tópicos de média potência podem ser usados para tratamento de prurido. Ivermectina oral e permetrina tópica são opções, mas só são capazes de reduzir a carga de insetos por um curto período de tempo. 

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