O segundo dia da Conference on Retoviruses and Opportunistic Infections (CROI) 2021 contou com palestras traçando paralelos entre as pandemias de HIV e Covid-19, com uma fala inicial em relação às disparidades no acesso à vacinação por populações em países em desenvolvimento, da mesma forma que ocorreu com o acesso aos antirretrovirais no início da pandemia de HIV/AIDS.
HIV e Covid-19
A virologista Pamela Bjorkman apresentou as mais recentes descobertas e pesquisas em relação a anticorpos neutralizantes contra HIV e contra o SARS-CoV-2 e sua implicação em projetos de desenvolvimento de vacinas.
Em relação ao HIV, o grupo da virologista demonstrou que o envelope do HIV apresenta baixa densidade de proteínas spike, o que dificultaria a ligação da porção Fab de anticorpos contra esses antígenos. Esse fato, associado à rápida mutação viral que gera a existência de várias linhagens de HIV simultaneamente em um mesmo indivíduo, poderia, pelo menos em parte, explicar a dificuldade do corpo humano em montar uma resposta imune humoral adequada contra o HIV.
A análise dos anticorpos específicos contra o HIV encontrados em pessoas infectadas demonstra que uma grande porção desses anticorpos são linhagem-específicas, enquanto uma proporção menor de indivíduos produz uma pequena quantidade de anticorpos amplamente neutralizantes, que não são linhagem-específicos. Pesquisas em relação a formas de elicitar a produção desses anticorpos amplamente neutralizantes (bNAbs) estão em andamento como base para o desenvolvimento de vacinas contra HIV.
SARS-CoV-2
A apresentação também abordou as pesquisas em estratégias de combate ao SARS-CoV-2. Pesquisas recentes sobre a ligação estrutural do vírus com as células dos hospedeiros demonstraram que, para uma ligação eficiente, o domínio de ligação ao receptor (RBD) da proteína S do vírus deve estar em uma posição específica (“up position”) ao interagir com os receptores de ECA2 das células.
Leia também: Covid-19 em imunossuprimidos — parte II: como a doença age em indivíduos com HIV?
Por meio de amostras de plasma doadas por pessoas que tiveram Covid-19, os pesquisadores do grupo puderam identificar pelo menos quatro classes de anticorpos neutralizantes, classificados de acordo com sua interação com os receptores de ECA e com a porção RBD da proteína S.
- Classe 1: bloqueiam ECA2 e ligam-se à porção RBD somente quando em “up position”;
- Classe 2: bloqueiam ECA2 e ligam-se à porção RBD tanto nas duas conformações (“up e down position”);
- Classe 3: não bloqueiam ECA2 e ligam-se à porção RBD nas duas conformações;
- Classe 4: não bloqueiam ECA2 e ligam-se à porção RBD somente quando em “up position”.
A existência dessas diferentes classes de anticorpos neutralizantes pode ter impacto tanto na resposta imune natural quanto vacinal diante do surgimento de variantes de SARS-CoV-2. A análise genética das novas variantes demonstra que as mutações afetam a porção RBD do vírus de diferentes formas, o que poderia alterar a capacidade de ligação dos anticorpos neutralizantes.
Por fim, a virologista destaca que uma linha de pesquisa que está sendo investigada é o uso de nanopartículas mosaico como antígeno base para a fabricação de vacinas. Vantagens dessa plataforma de vacina seriam maior imunogenicidade, cobertura imunológica ampliada que poderia ser pan-coronavirus, incluindo outros coronavírus de potencial pandêmico, e a possibilidade de serem liofilizadas, o que facilitaria a distribuição global de uma vacina com essa tecnologia.
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