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Clínica Médica22 agosto 2024

Retossigmoidoscopia flexível no rastreio de câncer colorretal

Uma estratégia alternativa à colonoscopia para rastreamento de câncer colorretal, de menor morbidade, é a retossigmoidoscopia flexível.
Por Leandro Lima

O câncer colorretal (CCR) é uma das cinco malignidades mais prevalentes em todo o mundo, ao lado do câncer de pele, mama, próstata e pulmão. Dessa forma, o rastreamento populacional é justificável sob a perspectiva epidemiológica, sendo ainda corroborado pela influência dramática da detecção precoce na sobrevida. 

As modalidades mais conhecidas de rastreamento do CCR são a pesquisa de sangue oculto nas fezes por imunocromatografia e a colonoscopia, exame que permite visualizar todo o intestino grosso, oportunizando a ressecção de lesões pré-malignas e a realização de biópsias de lesões suspeitas. Entretanto, os potenciais benefícios devem ser confrontados com as suas principais desvantagens: uma propedêutica onerosa e invasiva, que traz o desconforto do preparo anterógrado, a necessidade de submissão a um plano anestésico moderado e o risco, ainda que pequeno, de perfuração intestinal.    

Uma estratégia alternativa à colonoscopia, de menor morbidade, é a retossigmoidoscopia flexível (RSF), um procedimento que pode ser realizado exclusivamente por meio de preparo retrógrado, através da administração de enemas, compatível com um plano anestésico mais superficial, com tempo de realização reduzido e menor impacto orçamentário. 

Trazemos aqui a sinopse do Estudo Britânico de Rastreio com Retossigmoidoscopia Flexível (UKFSST), publicado por Kate Wooldrage e colaboradores em julho/2024 no periódico Lancet Gastroenterology and Hepatology, que se destacou por ser o maior e mais longevo sobre o tema. Uma análise prévia dos dados já havia sido publicada em duas ocasiões, quando o tempo mediano de acompanhamento era de 10 e 17 anos.   

Leia mais: Qual a melhor estratégia de rastreamento populacional do câncer colorretal?

Trata-se de um estudo controlado randomizado (RCT) multicêntrico que alocou, entre 1994 e 1999, 170.432 indivíduos na faixa etária de 55 a 64 anos e com representação equânime entre homens e mulheres (49% vs. 51%).  

Os critérios de exclusão foram o histórico pessoal de adenomas, câncer colorretal ou doença inflamatória intestinal; expectativa de vida limitada a menos de 5 anos; e realização colonoscopia ou RSF nos últimos 3 anos.  

Os participantes foram randomizados, em razão de 2:1, para o grupo controle, em que nenhum convite era realizado; e para o grupo intervenção, em que eram convidados para a realização da uma única RSF, em que pequenos pólipos, de até 1 cm, eram removidos e, então, liberava-se do seguimento. Contudo, diante de condições de alto risco (pólipos ≥ 1 cm; ≥ 3 adenomas; histologia vilosa ou túbulo-vilosa; ≥ 20 pólipos hiperplásicos localizados acima do reto distal; presença de displasia de alto grau ou doença maligna), houve encaminhamento subsequente para a colonoscopia.  

Após um acompanhamento mediano de 21 anos, foram avaliados os desfechos primários, caracterizados por incidência e mortalidade de CCR, por meio de análise por intenção de tratamento 

O cálculo amostral objetivou um poder estatístico de ao menos 79% para a detecção de uma diferença de 20% entre os grupos em termos de incidência de CCR em 10 anos e mortalidade por CCR em 15 anos, presumindo-se aceitação do convite para a retossigmoidoscopia flexível de 55%.  

 

Grupos 

Convidados para a sigmoidoscopia 

Controle 

N° de participantes 

57.099  

Aceitaram o convite: 40.624 (71%) 

112.927 

Incidência de CCR 

1.631 (3,18%) 

4.201 (4,16%) 

Mortalidade por CCR 

502 (0,97%) 

1.329 (1,33%) 

A despeito da baixa taxa de aceite para a realização de sigmoidoscopia, de aproximadamente 70%, a realização de uma única RSF trouxe impactos significativos e persistentes em um período de duas décadas. Naturalmente, os efeitos foram mais expressivos sobre o câncer de cólon esquerdo, tendo em vista a modalidade não se dedicar ao estudo do cólon direito, topografia que sediou 53% dos casos de CCR no grupo intervenção e 41% do grupo controle.  

Veja também: Câncer colorretal: Conitec dá parecer favorável para uso de ablação térmica

Impactos da retossigmoidoscopia flexível em 21 anos 

HR para incidência de CCR 

0,76 (IC 95%: 0,72 a 0,81) 

Redução do N° de casos por 100.000 habitantes-ano 

47 

HR para incidência de CCR em homens e mulheres 

0,7 (IC 95%: 0,65 a 0,76) em homens; 

0,86 (IC 95%: 0,79 a 0,93) em mulheres. 

NNR para para prevenir 1 caso de CCR 

82 

HR para mortalidade por CCR 

0,75 (IC 95% 0,67 a 0,83) 

Redução do N° de mortes por 100.000 habitantes-ano 

16 

NNR para para prevenir 1 morte por CCR 

239 

HR: hazard ratio. CCR: câncer colorretal; NNR: número necessário para rastrear.  

mulher com câncer colorretal

Conclusão e Mensagens práticas 

  • Os efeitos de redução da incidência e mortalidade por câncer colorretal (CCR) atribuíveis à retossigmoidoscopia flexível (RSF) única, indicada entre 55 e 64 anos, são expressivos e sustentados em um seguimento de duas décadas, especialmente entre os homens.   
  • Apesar da omissão do cólon direito nos exames de RSF, trata-se de uma estratégia a ser considerada sob a óptica da custo-eficácia e conveniência no cenário de prevenção do CCR. 

 

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Referências bibliográficas

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