Clínica Médica1 março 2024
Leaky Gut Syndrome: o que sabemos sobre ela
As manifestações da leaky gut syndrome estão diretamente relacionadas com a composição da microbiota de cada indivíduo.
A microbiota intestinal refere-se à comunidade complexa de microrganismos que habitam o intestino, incluindo bactérias, fungos, vírus e parasitas. Quatro filos principais representam mais de 90% de todo o bioma bacteriano, sendo eles: Firmicutes, Bacteroidetes, Actinobacteria e Proteobacteria. A composição da microbiota intestinal varia de local para local e é extremamente dinâmica, dependendo de uma grande variedade de fatores, como idade, dieta, hábitos, uso de medicamentos, entre outros. Além disso, ela desempenha um papel fundamental na saúde e nas doenças humanas.
De acordo com Poto et al. (2023), uma microbiota saudável ajuda a promover e a manter a saúde intestinal, garantindo, por exemplo, a integridade da barreira intestinal, além de evitar a adesão de bactérias patogênicas. Essa barreira pode sofrer alterações em sua composição e estrutura, genericamente definidas como disbiose, levando a doenças que comprometem o adequado funcionamento do intestino e da homeostase sistêmica, como é o caso do “Leaky Gut”.
Veja também: O papel dos biomarcadores no manejo da doença de Crohn
O que é Leaky Gut Syndrome?
O termo Leaky Gut significa “intestino permeável” e engloba um conjunto de alterações caracterizadas pelo enfraquecimento ou interrupção da barreira intestinal. Assim, substâncias que normalmente ficam restritas à cavidade intestinal atravessam o epitélio do intestino e atingem a corrente sanguínea. A interrupção da barreira intestinal e o aumento na concentração sanguínea de toxinas têm consequências locais e sistêmicas para o indivíduo.
Causas
Diversos fatores podem levar ao aumento da permeabilidade intestinal, incluindo a dieta, consumo de álcool, doenças inflamatórias intestinais, cirrose, entre outros, por meio de diferentes mecanismos fisiopatológicos. Nesse contexto, alterações específicas na dieta poderiam modificar a permeabilidade intestinal. Um exemplo é a redução da presença do receptor de vitamina D, que provoca a regulação negativa da claudina-2, uma proteína envolvida na formação de GAP junctions, aumentando a permeabilidade intestinal. Além disso, segundo Sadagopan et al. (2023), a deficiência em fibras dietéticas permite que a microbiota se “alimente” das glicoproteínas do muco do hospedeiro, perturbando a barreira mucoepitelial e aumentando a permeabilidade intestinal. Dietas ricas em gorduras saturadas também diminuem a abundância de Lactobacilos, enquanto aumentam o número de Oscillospiraceae. Esses microrganismos estão negativamente relacionados com a expressão de mRNA de Zonulina-1 (ZO-1), uma proteína de junção formadora de barreira. [caption id="attachment_110209" align="aligncenter" width="653"] A figura compara o intestino saudável (esquerda), com a fisiopatologia envolvida na leaky gut syndrome (a direita). Abreviações: LPS (lipopolissacarídeos). Adaptado de: Sadagopan et al. (2023).[/caption]Influência da microbiota e dieta
As manifestações da leaky gut syndrome estão diretamente relacionadas com a composição da microbiota de cada indivíduo. Considerando que o mecanismo para origem dos sintomas envolve o desequilíbrio da microbiota intestinal (disbiose), a intervenção terapêutica deve agir na origem do desequilíbrio. Estudos indicam que diferentes dietas provocam alterações significativas na composição bacteriana. As fibras alimentares, incluindo celulose, amido resistente e oligossacarídeos, associam-se a benefícios como controle de peso, resistência à insulina e níveis ótimos de colesterol e glicose. Mudanças nas espécies bacterianas e na produção de ácidos graxos de cadeia curta são observadas com variações dietéticas. Nesse sentido, é importante ressaltar que, a interação entre microbiota, dieta e estilo de vida influencia os níveis de glicose em casos de pré-diabetes e diabetes tipo 2. Assim, dietas ricas em fibras tendem a ser anti-inflamatórias, enquanto as ricas em gorduras animais têm ação contrária. A dieta mediterrânea, rica em alimentos vegetais, com baixo teor de carboidratos, por exemplo, demonstra benefícios na composição bacteriana. Apesar do uso disseminado de pré e probióticos para regulação da microbiota intestinal, essas terapias ainda carecem de comprovação científica. Esse tipo de intervenção não é indicada de forma isolada e deve ser sempre associada a mudanças de hábitos de vida. Em casos refratários o transplante fecal já foi aventado, mas também não há consenso científico. Alguns estudos sugerem que a glutamina atue nas junções epiteliais do epitélio intestinal, contribuindo para a reparação do intestino. A glutamina apresentou efeitos positivos nesta entidade patológica, ao ser administrada por meio da Fórmula de Alívio Gastrointestinal da Nutrição. Essa forma integra uma variedade de ervas e nutrientes, incluindo curcumina, Aloe vera, ulmeiro, goma guar, pectina, óleo de hortelã-pimenta e glutamina 3. No entanto, estudos mais consistentes cientificamente ainda são necessários.Quais as consequências da leaky gut syndrome a longo prazo?
O aumento da permeabilidade intestinal e a presença elevada de toxinas na corrente sanguínea podem contribuir para a ocorrência de reações inflamatórias crônicas que poderiam desencadear doenças autoimunes, como Artrite Reumatoide e Lúpus. Além disso, a permeabilidade intestinal elevada está implicada a distúrbios gastrointestinais, como síndrome do intestino irritável e doenças inflamatórias intestinais. Saiba mais: Síndrome de Behçet: atenção a essa condição inflamatória de alta morbimortalidadeConsiderações finais
Na leaky gut syndrome ocorre aumento da permeabilidade intestinal. Diferentes dietas desempenham um papel significativo na composição bacteriana e, por conseguinte, na manifestação da doença. Existe uma interação complexa entre microbiota, dieta e estilo de vida. Assim, as escolhas alimentares e o aconselhamento profissional são importantes para a manutenção e restauração da barreira intestinal.Anúncio
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