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Clínica Médica17 agosto 2020

Covid-19: características e poder de evidência dos estudos

Em revisão publicada no JAMA – Internal Medicine, foram abordadas as principais características e poder do estudo na Covid-19.

Por Rodolfo Lopes

Esta carta de revisão publicada no jornal JAMA – Internal Medicine, no último mês, visa abordar a perspectiva do maciço incremento de pesquisa clínica em relação à Covid-19, levando em conta as principais características do estudo e poder de impacto esperado. Para isso, foram levados em consideração apenas estudos registrados no principal banco governamental de pesquisa clínica dos EUA (ClinicalTrials.gov).

A intenção é evidenciar a possível fraqueza metodológica desses estudos, uma vez que não está bem caracterizada, e quais as implicações da qualidade de evidência que produzem.

Tubos de sangue para pesquisa clínica na Covid-19

Métodos da análise

Para esta análise transversal, foi pesquisado no site ClinicalTrials.gov, em 19 de maio de 2020, os termos: “Covid-19”, “SARS-CoV-2”, “2019-nCov”, “2019 novo coronavírus e síndrome respiratória aguda grave”, “coronavírus 2”.

Excluíram estudos retirados, suspensos, encerrados precocemente. Em seguida, categorizaram e graduaram os estudos usando a estrutura de nível de evidência do Oxford Center for Evidence-Based Medicine, de 2011 (O’CEBM). Um único revisor verificou os estudos para inclusão e removeu duplicatas, e dois revisores avaliaram os resultados.

Nova edição da Revista PEBMED traz as principais evidências sobre a Covid-19

Resultados

Período avaliado: março – 2011 a maio 2020 = 1551 estudos:

  • Intervencionista (ensaio clínico randomizado) = 664 ;
  • Observacional = 640;
  • Unicêntrico = 1180;
  • OCEBM nível de evidência >2 =451.

Relatados desfechos primários e secundários, incluindo:

  • Mortalidade = 526 (33,9%);
  • Ventilação mecânica = 413 (26,6%);
  • Complicações de tratamento = 359 (23,1%).

Estudos com critério de inclusão: 911 (58,7%).

Desfechos primários dos estudos intervencionistas (n=664):

  • Curso clínico = 323 (48,6%);
  • Mortalidade = 51 (7,7%);
  • Desfecho composto incluindo mortalidade = 42 (6,3%);
  • Cegamento = 364
    – Intervenção-controle = 195 (29,3%);
    – > 100 pacientes = 238 (35,8%);
    – Multicêntrico = 113 (17%);
  • Cegamento + intervenção-controle + multicêntrico = 75 (11,3%).

Drogas avaliadas:

  • Hidroxicloroquina = 486 (73,2%);
  • Cloroquina = 155 (23,3%);
  • Remdesivir = 7 (1,1%);
  • Tocilizumab = 21 (3,2%);
  • Corticosteroide = 20 (3,0).

Características dos estudos observacionais (n=640):

  • Unicêntrico = 517 (80,8%);
  • Multicêntrico = 123 (19,2%);
  • Prospectivo = 87 (13,6%).

Discussão

Embora alguns grandes estudos multicêntricos possam gerar evidências de alta qualidade, a grande proporção de estudos com baixo nível de evidência é preocupante. A rápida disseminação de estudos desse porte pode influenciar opinião pública, ações governamentais e a prática clínica de maneiras potencialmente prejudiciais, especialmente com uma maré crescente de disseminação do estudo sobre Covid-19 via pré-impressão ou outras estratégias antes de revisão sistematizada de colegas.

Uma série de medidas podem minimizar esses problemas. Por exemplo, se os resultados da pré-impressão pudessem ser acompanhados através de compartilhamento transparente de dados antes da revisão por pares. Também deveriam ser criados sistemas de implantação rápida de registros e testes multicêntricos, mas com ênfase na qualidade.

Esses sistemas poderiam ser ativados para crises globais de saúde, levando a operações simplificadas para coordenação internacional de estudos, compartilhamento de dados e conselhos institucionais de revisão. Esses sistemas também podem combinar e harmonizar estudos observacionais semelhantes em grandes estudos multicêntricos ou incorporar randomização ou características pragmáticas quando possível.

Essa revisão contém limitações importantes, por exemplo: os estudos exigem envolver apenas medicamentos, dispositivos ou estudos biológicos para se registrar no ClinicalTrials.gov. Estima-se que metade dos estudos fora dos EUA não estejam registrados nesse banco de dados.

Porém, esse estudo transversal descobriu que, apesar do aumento acentuado nos estudos sobre Covid-19, apenas 29,1% daqueles registrados no ClinicalTrials.gov têm potencial para resultar em nível de evidência adequada (no caso, OCEBM nível 2). Dos ensaios clínicos randomizados, apenas 29,3% são estudos cegados. E, na medida que houver declínio global em novos casos, também pode acarretar atraso no recrutamento.

Mesmo antes de os resultados serem conhecidos, a maioria dos estudos provavelmente não produzirá evidências científicas significativas em um momento que a rápida geração de conhecimento de alta qualidade é essencial.

Referência bibliográfica:

  • Pundi K, Perino AC, Harrington RA, et al. JAMA Intern Med. Published online July 27, 2020.

Autoria

Foto de Rodolfo Lopes

Rodolfo Lopes

Residente de Cardiologia no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - SP (IDPC) ⦁ Clínica Médica pelo Hospital do Servidor Público Estadual de SP (IAMSPE/HSPE) ⦁ Médico pela Universidade de Mogi das Cruzes (FMUMC)

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