Aspectos essenciais no manejo do tromboembolismo venoso
As diretrizes de terapia antitrombótica da CHEST (American College of Chest Physicians) têm sido as principais orientadoras no manejo do tromboembolismo venoso (TEV).
O tema é ubíquo nas várias especialidades médicas, sendo uma das pautas obrigatórias para qualquer médico!
Abordaremos alguns aspectos práticos dessa condição multifacetada, guiando a leitura por meio de perguntas-chave.
Quais são as fases da terapia antitrombótica destinada?
Os primeiros 21 dias que sucedem o diagnóstico do evento tromboembólico venoso contemplam a fase inicial, em que o risco de progressão do trombo e deterioração clínica é maior.
Entre 21 dias e 3 meses, temos a fase de tratamento padrão, sendo considerado o período mínimo de terapia antitrombótica recomendado para a maioria das condições clínicas.
Por fim, define-se a fase estendida ou ampliada, mais bem compreendida como uma profilaxia secundária de recorrência de TEV, sendo indicada em situações específicas por meio da extensão do tratamento para além de três meses, sem data prevista para a interrupção da anticoagulação.
Com base nos fatores precipitantes, como o tromboembolismo venoso (TEV) pode ser classificado?
O TEV pode ser dividido em não provocado, quando instalado na ausência de fatores predisponentes, ou provocado, em situações em que é possível identificar um evento precipitante, a exemplo de cirurgias maiores sob anestesia geral.
Os eventos provocados, por sua vez, podem ser decorrentes de fatores de risco persistentes (malignidades ou coagulopatias) ou transitórios (imobilidade, pós-operatório, exposição a contraceptivos orais), sendo que os últimos são subdivididos em maiores e menores, com a obrigatoriedade de estarem presentes nos últimos três e dois meses, respectivamente.
Podemos dispensar a terapia antitrombótica na trombose venosa profunda (TVP) distal isolada das pernas?
Na ausência de sintomas graves ou fatores de risco para a extensão do trombo, recomenda-se seguimento radiológico semanal por duas semanas (D0, D7 e D14) na TVP distal à veia poplítea. Nos pacientes oncológicos, entretanto, a recomendação é pela anticoagulação.
No seguimento ultrassonográfico, a progressão do trombo limitada ao leito distal é uma sugestão para o início da anticoagulação, enquanto a extensão ao leito proximal é uma orientação de tratamento.
O tromboembolismo pulmonar (TEP) subsegmentar também dispensa a terapia antitrombótica?
Na ausência de TVP proximal concomitante e diante de baixo risco de recorrência, a vigilância clínica é preferível à anticoagulação, em decorrência do significado clínico incerto dessa apresentação.
Cabe ressaltar que há exceções, como idade maior ou igual a 65 anos e presença de múltiplas falhas de enchimento, quando a evidência favorece a anticoagulação terapêutica.
O que fazer diante da suspeita de tromboembolismo venoso (TEV), mas na ausência de pronta disponibilidade do exame diagnóstico?
Nem sempre conseguimos realizar de imediato os exames de imagem necessários para a confirmação do TEV em suas múltiplas apresentações. Ciente dessa realidade, alguns intervalos temporais respaldam a tomada de decisão.
A predição da probabilidade pré-teste deve ser realizada rotineiramente com o emprego de escores validados (Wells-TVP, Wells-TEP e Geneva modificado, por exemplo).
Nas condições de alta suspeição para TEV, a anticoagulação parenteral deve ser iniciada imediatamente, enquanto se aguarda os testes confirmatórios, levando-se em conta a relação risco vs. benefício relativa ao sangramento, o tempo esperado para que o teste possa ser realizado e a condição clínica do paciente.
No cenário de probabilidade intermediária, podemos aguardar o exame confirmatório por quatro horas. Já na baixa probabilidade de TEV, podemos aguardar 24 horas pelos exames confirmatórios, antes de introduzir a anticoagulação preemptiva.
Em que condição eu preciso considerar o tratamento intervencionista na TVP?
A maioria dos casos de TVP será manejada com anticoagulação de forma isolada, muitas vezes dispensando a internação hospitalar. Entretanto, em casos suspeitos de phlegmasia cerulea dolens, dado o risco de progressão para isquemia ameaçadora ao membro, deve-se considerar a terapia intervencionistas (trombolítica, mecânica ou farmacomecânica) junto à radiologia intervencionista e/ou angiologia.
E no TEP, quando eu devo considerar a terapia intervencionista?
A trombólise deve ser considerada entre os indivíduos com TEP que evoluem com hipotensão sistólica persistente (PAS < 90 mmHg ou queda superior a 40 mmHg em relação à basal), insuficiência respiratória ou sinais de choque, desde que não apresentam um alto risco para sangramento.
Outra consideração para a trombólise é naqueles pacientes que evoluem mal, com deterioração clínica a despeito de adequada terapia antitrombótica.
A evidência atual aponta para a trombólise sistêmica como primeira linha de tratamento, por meio de infusão em veia periférica, em detrimento da trombólise guiada por cateter in situ, embora essa seja uma área com avanços recentes e que podem implicar em mudanças nessa recomendação.
Já para os pacientes com as indicações supracitadas, mas risco de sangramento aumentado, bem como falha à trombólise sistêmica ou choque obstrutivo progressivo com risco iminente de morte, sugere-se a remoção mecânica do trombo guiada por cateter.
Os tratamentos alternativos nesses cenários, na dependência da disponibilidade e expertise, incluem a ECMO e a trombectomia cirúrgica.
Filtro de veia cava inferior – ainda é indicado?
O filtro de veia cava inferior (FVCI) é recomendado para os pacientes com TVP proximal ou TEP agudo (primeiro mês de diagnóstico) na presença de contraindicações à anticoagulação. Nos casos em que a contraindicação é resolvida, deve-se iniciar a anticoagulação e, uma vez tolerada, seguir com a retirada do dispositivo.
Um dado que trouxe preocupação relativa ao FVCI foi proveniente do estudo de Chow e colaboradores, publicado em 2015 no Annals of Vascular Surgery, unicêntrico, observacional e retrospectivo, que demonstrou que, apesar da eficácia na prevenção de TEP, a permanência do dispositivo se associou ao aumento da mortalidade.
As drogas anticoagulantes de ação direta (DOACs) dispensam um curso prévio de anticoagulação parenteral?
Uma das vantagens apontadas dos DOACs em relação aos antagonistas da vitamina K (VKAs) é a possibilidade de viabilizar a alta hospitalar mais precoce, por não demandar ajustes do RNI.
A conduta de alta imediata nos casos de baixo risco para desfechos desfavoráveis, entretanto, é restrita ao uso da apixabana e rivaroxabana. Já a introdução da dabigatrana e edoxabana deve ser precedida em ao menos 5 dias pelo uso da heparina de baixo peso molecular parenteral (HBPM).
Os VKAs ainda encontram o seu espaço em situações pontuais, como na síndrome antifosfolípides (SAF) e na hipertensão pulmonar tromboembólica crônica. Nesses casos, a anticoagulação parenteral precedente é obrigatória, podendo ser suspensa quando o RNI alcançar o alvo terapêutico: entre 2 e 3 para a maioria das condições, e próximo a 2,5 na SAF.
A varfarina deve ser introduzida no mesmo dia do início da anticoagulação parenteral, que será interrompida somente após um período mínimo de cinco dias, desde que o RNI esteja em faixa terapêutica por pelo menos 24 horas.
A anticoagulação parenteral deve ser realizada preferencialmente com HBPM ou fondaparinux, em detrimento da heparina não fracionada.
Por quanto tempo devo anticoagular um paciente com tromboembolismo venoso (TEV)?
O período mínimo de anticoagulação é de três meses, com preferência dos DOACs sobre os VKAs.
A recomendação para a terapia estendida recaí sobre os quadros de TEV não provocados ou provocados por um fator de risco persistente, incluindo os casos de malignidades ativas, desde que a relação risco vs. benefício seja favorável.
Uma vez recomendada a terapia ampliada, sugere-se as doses reduzidas de apixabana (2,5 mg 12/12 horas) ou rivaroxabana (10 mg 24/24 horas).
Nos casos de TEV não provocado em que se tenha decidido pela interrupção do DOAC, sugere-se tratamento sequencial com AAS, com dose entre 81 e 100 mg/dia, em detrimento da ausência de qualquer terapia antitrombótica.
Como proceder na trombose venosa superficial?
Na trombose venosa superficial (TVS) dos membros inferiores, quando há risco aumentado para progressão do trombo ou TEP, sugere-se anticoagulação por 45 dias. A orientação é mais consistente para os trombos da veia safena magna com extensão superior a 5 cm. Lembramos que os trombos da veia safena magna distando menos de 3 cm da junção safenofemoral são entendidos e tratados como TVP.
Conclusão e mensagens práticas
- As diretrizes de CHEST sobre a terapia antitrombótica direcionada ao tromboembolismo venoso (TEV) têm reforçado a indicação prioritária dos DOACs em detrimento dos antagonistas da vitamina K na maioria dos casos.
- Todos os pacientes devem ser avaliados pela ampliação da terapia para além de 3 meses, sendo a mesma indicada diante de tromboembolismo venoso (TEV) não provocado ou provocado por fatores de risco persistentes, sempre ponderando a relação risco vs. benefício.
- Os filtros de veia cava são condutas de exceção diante de contraindicações à anticoagulação. Entretanto, uma vez resolvida a contraindicação, deve-se reconsiderar o início da anticoagulação que, uma vez bem tolerada, deverá ser seguida pela retirada do dispositivo.
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