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Cirurgia27 julho 2021

Manejo perioperatório nas lesões de medula espinhal

A incidência de casos de lesão de medula espinhal é baixa, mas elas levam a consequências desastrosas na vida pessoal e social do paciente.

Por Bruno Vilaça

A incidência de casos de lesão de medula espinhal é baixa – em torno de 16 casos/milhão de habitantes no Reino Unido e 25 casos/milhão nos EUA, a cada ano – porém leva a consequências desastrosas na vida pessoal e social do paciente. As consequências podem variar desde uma completa recuperação até o permanente estado acamado. O grau e o tipo de sequelas estão associados com a idade do paciente, comorbidades e o nível de gravidade da lesão da medula espinhal. As principais causas de lesão de medula espinhal são acidentes de trânsito e quedas.

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Manejo perioperatório nas lesões de medula espinhal

Classificação

A lesão da medula espinhal pode ser dividida em 2 estágios:

  • Lesão primária: causada pelo trauma mecânico, resultado da compressão direta da medula, hemorragia, tração ou lesão penetrante. Os mecanismos de trauma mais comumente associados incluem subluxação vertebral, hiperextensão (comum em acidentes de trânsito), carga axial e lesões por retropulsão.
  • Lesão secundária: decorre de alterações locais envolvendo aumento da permeabilidade vascular, influxo de células inflamatórias, citocinas e peptídeos vasoativos, com aumento do edema local ou interrupção do fluxo sanguíneo por trombose ou vasoespasmo, podendo piorar a lesão primária.

Lesões lombares ou torácicas baixas são frequentemente associadas a disfunção de membros inferiores, enquanto lesões cervicais e torácicas altas associam-se com disfunção adicional de membros superiores, comprometimento respiratório e autonômico.

Abaixo algumas síndromes decorrentes de lesões parciais da medula espinhal:

  • Síndrome da artéria espinhal anterior: comprometimento dos 2/3 anteriores da medula espinhal, causando perda sensitiva e motora bilateral abaixo do nível da lesão, com propriocepção preservada.
  • Síndrome de Brown-Séquard: dano lateral à medula, com perda ipsilateral da motricidade e propriocepção e perda sensitiva (dor e temperatura) contralateral, abaixo do nível da lesão.
  • Síndrome do cordão posterior: lesão do 1/3 posterior da medula espinhal, resultando em perda somente da propriocepção e toque fino.
  • Síndrome do cordão central: secundário à hemorragia, isquemia ou edema da substância cinzenta da medula. Leva a maior comprometimento motor dos membros superiores em relação aos inferiores, disfunção vesical e perda sensitiva variável abaixo do nível da lesão.

Manejo Anestésico

A avaliação neurológica é essencial antes de qualquer intervenção anestésica. Exames de imagem auxiliam muito no diagnóstico da lesão. O colar cervical deve ser mantido até avaliação clínica e radiológica pelo especialista. 

A adequada perfusão e oxigenação da medula espinhal é imperativa. Entretanto, hipoventilação é comum nesses pacientes, geralmente atribuído à fratura de costelas, lesão cerebral, dor e pneumotórax, levando 80% dos pacientes à intubação endotraqueal. O anestesista deve manter a estabilização da coluna cervical durante todo o procedimento.

O choque neurogênico, causado pela lesão de fibras autonômicas e caracterizado por hipotensão e bradicardia deve ser tratado agressivamente, já que a má perfusão da medula espinhal pode exacerbar a isquemia medular e piorar o grau da lesão. A pressão arterial média (PAM) deve ser mantida em torno de 90 mmHg nos primeiros 5 a 7 dias pós o evento. A resolução do choque neurogênico geralmente ocorre em 4 a 6 semanas com o retorno dos reflexos tendinosos profundos.

A lesão traumática da medula espinhal é conhecida por causar um estado hipermetabólico e esgotamento das reservas de nitrogênio. Suporte nutricional é vital para auxiliar na cicatrização de feridas, no desmame da ventilação mecânica e no período de reabilitação. Tanto a hiper quanto a hipoglicemia podem piorar os desfechos e devem ser tratadas.

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A disfunção autonômica associada com a imobilidade e um estado de hipercoagulabilidade tornam a profilaxia para trombose venosa profunda e úlcera de stress imprescindíveis, além da necessidade de cateterização vesical e prescrição de laxativos para evitar constipação e monitorização da temperatura corporal.

Após o manejo da fase aguda, a transferência do paciente para centros especializados para dar continuidade ao tratamento e reabilitação é necessário. A disreflexia autonômica, síndrome caracterizada por uma resposta excessiva do sistema nervoso simpático sem o controle do sistema parassimpático, com episódios de hipertensão maligna, cefaleia, flush, palidez e sudorese, ocorre geralmente em lesões acima de T6.

As principais complicações dos pacientes com lesão de medula espinhal são infecções urinárias de repetição, pneumonia, úlceras de pressão e sepse.

Considerações finais

A rápida imobilização da coluna cervical e a otimização da hemodinâmica assegurando a perfusão medular, além do acesso a unidades de saúde especializadas nesse tipo de tratamento, diminuem mortalidade, tempo de internação e melhoram prognóstico do paciente vítima de lesão de medula espinhal. O anestesista deve estar ciente da possível dificuldade de manejar a via aérea, além de todas as complicações da imobilidade e disfunção autonômica.

Referências bibliográficas:

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