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Cirurgia17 novembro 2023

Manejo do paciente queimado

A sepse é um dos principais fatores que eleva a mortalidade do paciente queimado, por isso o diagnóstico, manejo e prevenção são essenciais.

A pele é o maior órgão do corpo humano, desempenhando papel essencial na proteção, percepção tátil, termorregulação e metabolismo. A quebra de sua integridade que ocorre nas queimaduras afeta não apenas o ambiente lesado, alterando também a homeostase do organismo, o que desencadeia efeitos como hipermetabolismo, desregulação de fluidos e minerais, ativação de cascatas inflamatórias e distúrbios endócrinos.   

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O manejo desses efeitos permanece sendo desafiador, por isso revisaremos a seguir as principais medidas terapêuticas no manejo do paciente queimado, segundo evidências mais recentes da literatura:  

paciente queimado

Resfriamento de queimaduras 

Afastar fonte de calor e prosseguir com resfriamento da área queimada tem se mostrado como medida benéfica. A temperatura apropriada para resfriamento é entre 10-20°C, devendo-se evitar resfriamento intenso da área, o que poderia causar hipotermia, vasoconstrição local ou lesões por frio.  

Ressuscitação volêmica

Intervenção terapêutica crucial na abordagem do grande queimado (SCQ > 20% em adultos ou 15% em crianças), pois reduz significativamente o risco de choque hipovolêmico e disfunção orgânica. Desde sua formulação, em 1968, a fórmula de Parkland (4 ml x peso x %SCQ) permanece sendo a mais utilizada para cálculo do volume a ser infundido nas primeiras 24 horas, devendo metade do volume calculado ser administrado nas primeiras 8 horas.  

O volume infundido também deve ser avaliado conforme parâmetros fisiológicos, como o débito urinário, visando evitar ressuscitação volêmica excessiva. Em relação à escolha da solução, utiliza-se preferencialmente cristaloides isotônicas aquecidas.  

Via aérea do paciente queimado

Garantir segurança da via aérea superior deve ser prioridade no atendimento inicial, devendo-se avaliar sinais que indiquem possível lesão (tosse, rouquidão, estridor, queimadura oral) que, associados a achados de insuficiência respiratória ou rebaixamento do nível de consciência, indicam via aérea definitiva. Em casos de lesão térmica pulmonar o diagnóstico é clínico e endoscópico e o manejo consiste em suporte ventilatório com estratégia de ventilação mecânica protetora. Outras estratégias como corticoterapia e irrigação brônquica não são consenso.  

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Tratamento cirúrgico do paciente queimado

Em queimaduras profundas, que apresentam baixa capacidade de cicatrização em até três semanas e que podem potencialmente evoluir com resultados estéticos e funcionais indesejáveis, há indicação de abordagem cirúrgica com excisão e fechamento precoce. Essa estratégia tem mostrado melhores desfechos como redução da taxa metabólica basal em até 40%, redução de espoliação proteica, infecção, risco de sepse e dor local.  

Pode ser realizada excisão simples, fascial ou tangencial, seguida de cobertura normalmente com enxerto de pele autólogo, priorizando áreas funcionais e estéticas como face, mãos, pés e articulações.  

A delimitação da profundidade da lesão é um dos principais desafios nesse processo, visto que esse limite normalmente não é claro nos primeiros dias após a injúria, por isso a utilização de parâmetros como mecanismo de injúria, rubor local e preservação sensorial tecidual, além de ferramentas como laser doppler imaging e termografia são necessários para melhor delimitação dos limites da área excisada.  

Embora a cobertura seja realizada preferencialmente com enxerto autólogo, caso haja sua indisponibilidade, como em queimaduras extensas, pode-se fazer uso de substitutos de pele. Esses são subdivididos em materiais de curativo temporário e impermeável (classe I), substitutos cutâneos duráveis de camada única (classe II) e substitutos de pele compostos (classe III), sendo ferramentas benéficas na reconstrução precoce, reduzindo resposta inflamatória local e risco de formação de cicatriz.  

Sepse 

A sepse é um dos principais fatores que eleva a mortalidade do paciente queimado, por isso seu diagnóstico, manejo precoce e principalmente prevenção são essenciais. Estratégias como excisão e cobertura da área acometida, antibiótico tópico em lesões extensas e profundas e suporte nutricional adequado são relevantes nesse contexto.  

O uso profilático de antibiótico sistêmico não é recomendado rotineiramente, porém deve ser considerado em pacientes imunocomprometidos. O diagnóstico de infecção permanece sendo clínico, associado a marcadores como procalcitonina, proteína C-reativa e contagem de leucócitos. 

Regulação hormonal e aporte nutricional do paciente queimado

Estratégias farmacológicas que visem modular as alterações hormonais no paciente queimado têm sido empregadas. Considerando o hipermetabolismo e o catabolismo proteico presentes nas fases iniciais após o insulto como alvos terapêuticos, tem-se utilizado agentes anabólicos e anti-catabólicos como GH (hormônio do crescimento), insulina, IGF-1, oxandrolona, testosterona e propranolol. 

Em relação ao aporte nutricional, tem-se buscado associar dieta enteral complementar, visto que essa possibilita incremento no aporte calórico, o que é demandado pelo hipermetabolismo do paciente queimado. Na impossibilidade de dieta enteral, como no íleo paralítico prolongado ou intolerância ao uso de sonda, e aporte nutricional insuficiente por via oral, deve-se considerar via parenteral.  

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Mensagem final  

O tratamento do paciente queimado é complexo e multifatorial. O principal objetivo deve ser reduzir os efeitos deletérios do hipermetabolismo e prevenir potenciais complicações como distúrbios hidroeletrolíticos, infecção, desnutrição e cicatrizes funcionalmente limitantes. Intervenções precoces têm se mostrado efetivas não apenas na melhora da morbimortalidade inicial, como também no ganho de qualidade de vida a longo prazo.  

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Referências bibliográficas

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