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Carreira14 maio 2025

Posso gravar a consulta médica?

Saiba mais sobre os aspectos legais e éticos sobre a gravação de atendimentos em saúde – seja por parte dos pacientes ou dos próprios médicos
Por Redação Afya

Na era em que tudo vira áudio, print ou vídeo, o consultório médico não ficou fora do radar. Mas será que é legal registrar uma conversa com o profissional de saúde sem avisar? E se for o contrário: o médico pode gravar você? A linha entre o direito à informação e a violação de privacidade pode ser mais tênue do que parece.

Conversamos com Ana Caroline Amoedo, advogada especialista em Direito Médico, para destrinchar o que dizem as leis, os conselhos profissionais e os princípios éticos sobre um tema cada vez mais real — mas ainda pouco debatido — na prática clínica brasileira.

Legal ou nem tanto?

De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM), o paciente pode gravar a consulta, desde que o médico esteja ciente e tenha consentido previamente. O profissional, por sua vez, tem o direito de recusar o atendimento se não concordar com a gravação — exceto em casos de urgência ou emergência, conforme prevê o artigo 33 do Código de Ética Médica (CEM).

“A voz e a imagem do médico também são protegidas pela Constituição Federal. Ele não pode ser gravado sem saber, ainda que esteja em exercício profissional”, explica Ana Caroline.

E se a gravação for feita sem avisar?

Apesar do entendimento do CFM, a Justiça brasileira tem aceitado gravações feitas sem o conhecimento do médico como prova válida em processos judiciais. Isso porque, segundo os tribunais, trata-se de um registro feito por uma das partes da conversa, o que não configura ilícito.

Mas atenção: isso não dá carta branca para divulgar a gravação por aí. “Se o conteúdo for compartilhado sem autorização — seja em redes sociais, aplicativos ou com terceiros —, o paciente pode ser responsabilizado civil e criminalmente”, destaca a advogada. “Isso porque estaria violando direitos fundamentais do médico, como a intimidade, a vida privada e o direito à própria imagem”.

O mesmo vale para registros feitos em áudio. “Do ponto de vista jurídico, os dois são formas de registro protegidas por lei”, diz Ana Caroline. Inclusive, a voz é considerada parte da imagem da pessoa, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Sendo assim, caso o médico perceba a gravação e se sinta desconfortável, ele pode encerrar a consulta por quebra de confiança, desde que a situação não envolva risco imediato à saúde do paciente.

Saiba anda: O que pode (e o que não pode) ser feito por residentes na prática médica

E se for o médico quem quiser gravar?

Nesse caso, o cenário muda — e entra em cena a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Para gravar a consulta, o médico precisa informar o paciente sobre a gravação, explicar o motivo e como o conteúdo será armazenado.

“Não é necessário um documento formal assinado, mas a informação precisa ser clara e prévia. É uma questão de transparência e boa-fé, como prevê a LGPD”, pontua Ana Caroline.

Essa gravação, se realizada, deve ser incorporada ao prontuário do paciente e armazenada com segurança, respeitando os princípios da confidencialidade e integridade dos dados.

Se o paciente não concordar com a gravação, o médico pode optar por não realizá-la ou até recusar o atendimento — mas, novamente: desde que não se trate de uma emergência, é claro.

Uso das gravações

A LGPD determina que qualquer dado sensível do paciente, inclusive gravações, deve ser armazenado de forma segura, com senhas e protocolos de proteção. Além disso, qualquer compartilhamento exige autorização expressa do paciente, que deve saber o porquê da divulgação e ter acesso a um canal de dúvidas — como um encarregado de dados (DPO).

O que diz o Código de Ética Médica?

O CEM não trata diretamente da gravação de consultas. No entanto, conselhos regionais, como o Conselho Regional de Medicina do Estado de Sergipe – CREMESE e o próprio setor jurídico do CFM, entendem que a gravação deve contar com o consentimento do médico para ser considerada ética.

“Se for o médico quem divulga a gravação sem autorização do paciente, ele pode responder por quebra de sigilo, violação da LGPD e sofrer sanções civis, penais e éticas”, explica Ana Caroline.

Leia ainda: Proteção legal para médicos: tendências e desafios éticos

Redes sociais: terreno minado

Mesmo com o aval do paciente, a Resolução sobre Publicidade Médica proíbe a divulgação de consultas em tempo real nas redes, especialmente quando envolvem procedimentos ou tratamentos.

“Se o paciente publicar trechos da consulta sem o consentimento do médico, ele pode ser responsabilizado por violar a privacidade e a intimidade do profissional”, reforça a advogada.

Dicas para médicos e estudantes

Para Ana Caroline, a gravação da consulta não deve ser vista como regra, mas como exceção — e tratada com cautela. Para manter o atendimento ético e juridicamente seguro, ela recomenda:

  1. Estabelecer diálogo transparente e respeitoso com os pacientes;
  2. Humanizar a escuta e a abordagem clínica;
  3. Explicar com clareza as condutas adotadas e os limites da atuação médica;
  4. Manter o prontuário sempre completo e atualizado;
  5. Se necessário, interromper a consulta ao perceber gravações não autorizadas, quando possível.

Leia mais: Direito Médico: Cinco passos para uma relação médico-paciente mais segura e sem riscos jurídicos

O futuro e seus riscos

A tendência é que o hábito de gravar atendimentos continue crescendo. Mas Ana Caroline faz um alerta: “Apesar de poder oferecer maior segurança jurídica, essa prática só faz sentido se estiver pautada na ética e no respeito à privacidade”.

Segundo ela, o Brasil ainda carece de regulamentações específicas sobre o tema. “Enquanto isso, o melhor caminho continua sendo o da transparência, empatia e confiança mútua — valores que nenhuma tecnologia pode substituir”, finaliza a especialista.

Se você é médico ou estudante de medicina e quer se aprofundar no tema para atuar com ainda mais segurança, vale a pena seguir o perfil @anacarolineamoedo, no Instagram. É por lá que Ana Caroline compartilha dicas práticas para evitar problemas jurídicos na carreira. Fique de olho!

 

 

Autoria

Foto de Redação Afya

Redação Afya

Produção realizada por jornalistas da Afya, em colaboração com a equipe de editores médicos.

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