Logotipo Afya
Anúncio
Carreira11 setembro 2025

Intervenções digitais de estilo de vida contra depressão e ansiedade

Como incorporar mudanças de estilo de vida de forma prática, acessível e eficaz para melhorar a saúde mental dos pacientes?
Por Ester Ribeiro

É um fato que as doenças mentais não estão mais restritas apenas ao consultório de psiquiatria. São tantas demandas de um mundo moderno, que a crescente sobrecarga de trabalho e as demandas emocionais do cotidiano trazem pacientes cansados, sobrecarregados, com depressão e sem nenhum ânimo para seguir o tratamento clínico. Então, surge a pergunta: Como incorporar mudanças de estilo de vida de forma prática, acessível e eficaz para melhorar a saúde mental dos pacientes?

A era digital também oferece um universo de possibilidades, desde aplicativos de exercícios até plataformas de orientação alimentar e de sono, tudo ao alcance de um clique. Você, médico, já parou para analisar e estudar se essas ferramentas podem, de fato, transformar sintomas de depressão e ansiedade?

Métodos

Para responder a essa questão, Brinsley et al. conduziram uma revisão sistemática com meta-análise abrangendo bancos de dados como MEDLINE, Embase e PsycINFO, buscando estudos publicados entre janeiro de 2013 e janeiro de 2023.

Foram incluídos apenas ensaios clínicos randomizados que avaliavam intervenções de estilo de vida — atividade física, sono e dieta — entregues por meios digitais (apps, websites, mensagens) e que mensurassem mudanças em sintomas de depressão, ansiedade, estresse ou bem-estar em adultos.

Do total de 14 356 estudos identificados, apenas 61 (0,42%) atenderam aos critérios de inclusão, passando por extração de dados independente e avaliação pelo Centro de Medicina Baseada em Evidências de Oxford.

 

Resultados

A análise de grupos revelou efeitos estatisticamente significativos para:

  • Depressão: redução de sintomas com SMD = −0,37 (P < .001), indicando efeito pequeno a moderado favorável.
  • Ansiedade: redução de sintomas com SMD = −0,29 (P < .001), efeito pequeno, porém consistente.
  • Estresse: pequena mas significativa redução com SMD = −0,17 (P = .04).
  • Bem-estar: não houve efeito estatisticamente relevante (SMD = 0,14; P = .15), sugerindo necessidade de aprofundamento em medidas positivas de saúde mental.

As análises de subgrupos mostraram que os resultados foram semelhantes, independentemente da plataforma digital, duração da intervenção, ou perfil populacional avaliado, reforçando a versatilidade dessas abordagens.

Conclusões e implicações clínicas do estudo

Pelo estudo, as intervenções de estilo de vida digital podem ser integradas aos cuidados médicos para reduzir sintomas de depressão, ansiedade e estresse, ampliando o portfólio terapêutico disponível ao paciente para além das abordagens convencionais.

No entanto, como os efeitos sobre o bem-estar geral permanecem inconclusivos, é fundamental que novas pesquisas explorem métricas de saúde positiva e estratégias para promoção de adesão e equidade no acesso digital.

E na minha prática? Como usar e o que fazer?

Como médicos, somos convocados a experimentar e recomendar — com critério e acompanhamento — programas digitais de atividade física, sono ou dieta aos pacientes com sintomas leves a moderados e avalie, em sua prática clínica, se a integração dessas ferramentas potencializa os resultados terapêuticos.

É possível fazer o monitoramento remoto das métricas geradas pelo app (por exemplo, horas de sono, passos diários, adesão às metas alimentares) e ajustar o plano terapêutico em tempo real, favorecendo a aderência e engajamento do paciente ao tratamento.

Para maximizar benefícios, temos que pensar em:

  1. Selecione apps com dados científicos e boas avaliações de usabilidade;
  2. Defina metas claras (por ex., 30 min de caminhada 3×/semana);
  3. Use dashboards clínicos (quando disponíveis) para monitorar adesão;
  4. Agendar retornos breves para discutir métricas e ajustar o plano;
  5. Atente-se à real acessibilidade: ofereça alternativas offline quando o acesso digital seja limitado.

Vamos exemplificar com usos práticos?

  1. Insônia e ansiedade pré-operatória
    Dra. Camila, cirurgiã plástica com agenda intensa de procedimentos estéticos, percebeu em vários pacientes episódios de insônia e ansiedade na noite anterior às cirurgias. Para ajudá-los, recomendou um app de higiene do sono na semana anterior ao procedimento que monitora hábitos noturnos, oferece meditações guiadas e estímulos à regularização do ciclo circadiano. Seus pacientes relataram diminuição das queixas de insônia e sensação de maior calma na véspera dos procedimentos.
  2. Controle da ansiedade em pacientes com hipertensão
    O Dr. Ricardo, clínico geral, atendia uma paciente hipertensa que apresentava picos de pressão arterial associados ao estresse no trabalho. Indicou um programa digital de atividade física leve (caminhada guiada por app) combinado a breves sessões de respiração diafragmática. Em três meses, houve melhora na aderência ao tratamento anti-hipertensivo e relato de maior sensação de autocontrole frente a situações estressantes.
  3. Depressão leve e baixa motivação para mudanças de hábitos
    Dra. Fernanda, psiquiatra, acompanhava um paciente com quadro de depressão leve e pouca motivação para sessões presenciais de nutrição e exercício. Ao introduzir um aplicativo gamificado de dieta e treinos moderados — com notificações personalizadas e feedback positivo — observou melhora gradual do humor e maior engajamento às consultas de seguimento.
  4. Gerenciamento de burnout em residentes
    O Dr. Thiago, residente de neurologia, sofria com sintomas de burnout: exaustão crônica, irritabilidade e dificuldade de concentração. Recebeu indicação de um app de mindfulness com exercícios de atenção plena diários e registros de humor. Em dois meses, relatou redução da sensação de esgotamento e retomada do foco acadêmico e clínico.
  5. Apoio na adesão ao tratamento de diabetes tipo 2
    Dra. Juliana, endocrinologista, acompanhava pacientes diabéticos tipo 2 com dificuldade em manter dieta e atividade física regulares. Sugeriu um app de coaching nutricional que oferece planos de refeição personalizados, lembretes de medicação e registro automático de glicemias. Seus pacientes relataram maior confiança no autocuidado e melhores diálogos em consultas de retorno.

Embora os efeitos sobre o bem-estar geral ainda precisem de mais investigação, a integração criteriosa dessas ferramentas na prática diária pode otimizar resultados e engajar pacientes de forma inovadora. Vale a pena pesquisar e testar!

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Relacionamento Médico-Paciente