Terminar o internato é uma conquista importante nas etapas de formação de um médico. Significa que estamos muito próximos de cruzar a linha de chegada que nos diferencia entre estudantes e profissionais. A sensação de felicidade é indescritível, mas com ela vem as incertezas e medos que a autonomia para assumir um plantão e atender sozinho um paciente nos trazem.
Será que realmente estou pronto? E se eu travar na frente do paciente? E se eu esquecer alguma conduta básica? Essas perguntas são feitas pela maioria dos médicos no início da carreira. Se você se dedicou, estudou, participou das atividades práticas, dos estágios e viveu todo o que a graduação de medicina oferece ao longo de seis intensos anos, a resposta mais provável é que sim, você está mais preparado do que imagina.
Claro que as dúvidas vão surgir, mas é importante que você não tenha receio de perguntar a colegas de equipe ou consultar aplicativos de decisão clínica para te dar mais segurança nesses primeiros passos. A medicina é muito mais ampla do que os livros conseguem ensinar e a curva de aprendizado prático no início dos atendimentos será exponencial.
Para te ajudar um pouco nesses momentos iniciais, selecionamos uma lista de 7 situações clínicas que você vai encontrar nos seus primeiros atendimentos, seja no pronto-socorro, na enfermaria ou no ambulatório. A ideia aqui não é transformar você em especialista, mas ajudar a relembrar algumas situações que você precisa ter um domínio quando se deparar com elas.

Dor torácica
Homem de 56 anos, com histórico de hipertensão e tabagismo, chega ao atendimento com queixa de dor em aperto no centro do peito, irradiando para o braço esquerdo. A dor começou há uma hora, enquanto ele caminhava. Está pálido e ansioso. O que fazer?
Dor torácica é sempre um alerta, o raciocínio clínico precisa ser rápido e focado na exclusão de diagnósticos mais graves. Apesar de muitas vezes estar associada a causas não tão graves, como dor muscular ou ansiedade, você deve, antes de tudo, excluir as emergências, como síndrome coronariana aguda, dissecção aguda da aorta, embolia pulmonar, pneumotórax hipertensivo, entre outros.
Comece com uma anamnese bem feita. Pergunte sobre o tipo da dor, duração, irradiação, fatores de alívio ou piora, sintomas associados e risco cardiovascular. No exame físico também é importante buscar sinais de instabilidade hemodinâmica, insuficiência cardíaca, crepitações pulmonares ou outros que possam indicar um diagnóstico diferencial de causas não cardíacas. O ECG deve ser feito em até 10 minutos.
Além disso, colete troponina, garanta acesso venoso, monitore a oximetria de pulso e ofereça analgesia, se necessário. Relembre a abordagem aqui.
Dispneia
Idosa de 70 anos, ex-tabagista, chega ao atendimento com taquipneia, sibilância e cianose de extremidades. A saturação de oxigênio é 88% em ar ambiente. Qual sua conduta?
Falta de ar pode significar desde uma crise asmática até uma insuficiência cardíaca aguda. O primeiro passo é avaliar a gravidade, observando o nível de consciência do paciente, esforço respiratório e sinais vitais. Na anamnese e no exame físico, busque sinais de doenças cardíacas, pulmonares, neuromusculares ou sistêmicas, além de fatores precipitantes, como infecções, exacerbações de DPOC, insuficiência cardíaca. Inicie o oxigênio se necessário.
A história e o exame físico vão guiar as primeiras hipóteses, mas exames como RX de tórax, gasometria e hemograma também podem ajudar bastante. Sempre que possível, o tratamento deve priorizar a correção da causa e, em situações de doenças avançadas ou refratárias, foque em oferecer alívio dos sintomas e na melhora da qualidade de vida do paciente.
Dor abdominal
Mulher de 22 anos, previamente saudável, chega com dor em fossa ilíaca direita, febre baixa e náuseas. Você pensa em apendicite, mas e se for outra coisa?
Quando pensamos em dor abdominal, apendicite, colecistite, pancreatite costumam ser as primeiras hipóteses que vem à mente. E elas não podem passar despercebidas mesmo. Por isso, uma anamnese bem detalhada é importante para direcionar a investigação. Pergunte sobre início, localização, irradiação, intensidade, características da dor, fatores de piora e melhora, sintomas associados, como náuseas, vômitos, febre, alterações do hábito intestinal.
No exame físico avalie massas palpáveis, distensão abdominal, ruídos hidroaéreos, sinais peritoneal. Em mulheres, não se esqueça de possíveis causas ginecológicas. E nunca subestime aquela dor que piora progressivamente ou que vem acompanhada de sinais sistêmicos, como febre e taquicardia.
Cefaleia
Homem de 35 anos chega ao atendimento com queixa de dor de cabeça súbita e intensa, rigidez de nuca e fotofobia. Nega episódio semelhante anterior. O que fazer?
Apesar das cefaleias terem evolução favorável na maioria dos casos, uma falha na hora de diferenciar uma cefaleia primária e uma secundária pode trazer consequências ruins para o paciente. Por isso, realize uma anamnese detalhada e exame físico atento, com ênfase no exame neurológico. Preste atenção nas características da dor como tipo, localização, início, intensidade, duração, irradiação, fatores desencadeantes, de exacerbação e de alívio e presença de sintomas associados (náuseas, vômitos, fotofobia, fonofobia).
A identificação de sinais de alerta ou red flags também deve ser feita para avaliar a necessidade de investigação adicional, como cefaleia de início súbito, pior cefaleia da vida, presença de sinais neurológicos focais, alteração do nível de consciência, febre, entre outros. Se necessário, solicite exame de imagem.
Crise hipertensiva
Homem de 62 anos chega ao pronto atendimento com pressão arterial de 210/120 mmHg, dor torácica e visão turva. Ele tem histórico de hipertensão e parou os medicamentos há dois meses. Como conduzir?
Ao atender um paciente com pressão arterial (PA) acima de 180/120 mmHg, a primeira coisa a fazer é definir se há lesão de órgão-alvo. Dor torácica, dispneia, rebaixamento do nível de consciência, alterações visuais ou insuficiência renal aguda indicam que você está diante de uma emergência hipertensiva. Neste caso, faça a redução gradual da PA com medicação endovenosa e internação.
Se o paciente não apresentar lesão de órgão-alvo, classificamos como urgência hipertensiva. Nesse caso, o tratamento deve ser feito de forma ambulatorial, com ajuste da medicação oral.
Quadro de desidratação, vômitos ou diarreia
Criança de 4 anos com diarreia há três dias, sem febre, mas com olhos fundos, pele seca e letargia. A mãe relata pouca aceitação de líquidos. Como agir?
Quadros de desidratação são comuns e também podem ser graves, principalmente em crianças e idosos. Ao atender o paciente, pergunte sobre duração dos sintomas, febre, presença de sangue nas fezes, consumo de alimentos suspeitos, uso de medicamentos, viagens.
Também avalie o grau de desidratação observando sinais clínicos como o tempo de enchimento capilar, turgor da pele, frequência cardíaca e diurese. Isso é importante para que você consiga definir o manejo do paciente, a necessidade de hidratação oral, venosa e reposição de eletrólitos.
Hipoglicemia e descompensação do diabetes
Paciente diabético tipo 1 é encontrado confuso, com glicemia capilar de 45 mg/dL. Você sabe como agir?
A abordagem clínica da hipoglicemia e da descompensação do diabetes envolve reconhecimento rápido da situação, tratamento imediato e também estratégias de prevenção. Ao atender um paciente com hipoglicemia (glicemia <70 mg/dL) forneça rapidamente glicose oral se o paciente estiver consciente, ou intravenosa, se houver rebaixamento. Reavalie após 15 minutos. É importante sempre investigar causas como dose errada de insulina, jejum prolongado, exercício intenso.
Já a descompensação aguda do diabetes pode se manifestar de diferentes formas, como hiperglicemia grave, cetoacidose diabética ou estado hiperglicêmico hiperosmolar. Faça uma boa avaliação clínica e laboratorial. E, se necessário, faça reposição volêmica, correção de distúrbios hidroeletrolíticos e administração de insulina com monitorização rigorosa. E não esqueça de investigar e tratar os fatores precipitantes.
Se precisar, saiba onde encontrar ajuda
Você vai perceber, no início dos seus atendimentos como médico, que em alguns momentos as decisões rápidas são muito importantes para definir o desfecho do paciente. E, apesar de você não precisar saber tudo sobre todas as áreas da medicina, precisa saber fazer as perguntas certas ao paciente, reconhecer os sinais de alerta, agir com responsabilidade e pedir ajuda, quando necessário. E isso não é motivo de vergonha.
Os aplicativos de decisão clínica também são ferramentas que podem te ajudar a ficar mais seguro na tomada de decisão em momentos críticos dos primeiros atendimentos. Um exemplo é o Whitebook, o maior aplicativo médico de decisão clínica do país. Nele você encontra protocolos atualizados, orientações de prescrição, doses medicamentosas, fluxogramas de conduta e diagnósticos diferenciais organizados por tema e especialidade.
Então, mesmo que você sinta aquela insegurança do início dos atendimentos, vá em frente. Revise os principais temas acima e outros que você considere necessários, baixe o seu aplicativo do Whitebook, coloque o estetoscópio no pescoço, vista o jaleco e tenha um bom plantão.
Autoria

Juliana Karpinski
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