O bloqueio do ramo esquerdo (BRE) pode surgir em pessoas assintomáticas e sem doença estrutural cardíaca. Nesse caso, é chamado de BRE isolado e existem dúvidas quanto ao seu real significado clínico. Um recente estudo de coorte publicado no JAMA buscou avaliar a relação entre o BRE isolado e o desenvolvimento de insuficiência cardíaca (IC), utilizando dados do Cardiovascular Health Study (CHS).
A pesquisa avaliou 4.541 indivíduos com idade igual ou superior a 65 anos, todos sem histórico de IC e presença de fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) preservada. Apenas 1% dos participantes (44 indivíduos) apresentaram BRE no início do estudo e foram acompanhados por um período médio de 14,6 anos.
Principais resultados
Aumento do risco de IC: indivíduos com BRE apresentaram um risco > 5x de desenvolvimento de IC (HR 4,98; IC 95%, 2,18-11,39; p<0,001) comparado aos sem BRE, mesmo após ajustes de variáveis. A magnitude da associação do BRE com IC foi maior do que fatores de risco clássicos como hipertensão ou diabetes.
Declínio da função sistólica: uma subanálise dos ecocardiogramas repetidos em 5 anos mostrou que o BRE foi associado a uma maior probabilidade de queda na FEVE (OR 4,73; IC 95%, 1,70-13,70; p=0,003).
Predomínio de IC com fração de ejeção reduzida (ICFER): O BRE foi mais associado ao risco de hospitalizações por ICFER (HR 5,98; IC 95%, 1,43-25,00; p=0,01); e não houve associação significativa com insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP).
Mortalidade: houve uma tendência maior de mortalidade em indivíduos com BRE (HR ajustado 1,39; p=0,05), no entanto, essa associação perdeu significância após ajustes.
Esses achados chamam a atenção de que o bloqueio do ramo esquerdo (BRE) isolado tem o potencial de piorar a função sistólica, aumentar o risco de IC, além de levantar a hipótese de uma possível relação causal, provavelmente secundária a dissincronia ventricular, indução de remodelamento e fibrose miocárdica (cardiomiopatia induzida por dissincronia).
Atualmente, as diretrizes não fazem recomendações específicas em relação ao BRE isolado, apesar de algumas evidências sugerirem a dissincronia como marcador de risco possível. Também existem lacunas quanto aos benefícios das medicações modificadoras de prognóstico nesse cenário. Na prática clínica, por essa implicação como marcador de risco, esses pacientes não devem ser encarados como uma variante benigna e deverão ser seguidos de perto com atendimentos mais frequentes e acompanhamento ecocardiográfico, principalmente com o uso de técnicas mais modernas como a ecocardiografia com strain.
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