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Cardiologia27 outubro 2025

Níveis de potássio influenciam no desfecho de pacientes com ICFEP? 

Distúrbios do potássio estão associados a piores resultados em pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP)

Alterações do potássio são frequentes nos pacientes com insuficiência cardíaca (IC), tanto em decorrência das comorbidades quanto em decorrência do uso de medicações. Essas alterações podem levar a mudanças nos potenciais de ação e repolarização celular que resultam em alterações, como no intervalo QT, o que aumenta o risco de arritmias e morte. 

Pacientes com IC com fração de ejeção preservada (ICFEP) costumam ser mais idosos e ter mais doença renal crônica (DRC) e outras comorbidades, o que aumenta a chance de alterações do potássio.  

As alterações podem ser tanto hiper quanto hipocalemia e existe uma associação em forma de U nos pacientes com IC. Porém, a maioria dos estudos utilizou apenas uma medida de potássio e alguns estudos mais recentes sugerem que sua dinâmica tem relação com a ocorrência de eventos, sendo que o tempo na faixa alvo (TFA) pode ser uma das formas de avaliar seu controle. 

Recentemente foi publicada uma análise, utilizando dados do estudo TOPCAT, com objetivo de utilizar o TFA para monitorizar os níveis de potássio no longo prazo e determinar sua associação com o risco de desfechos cardiovasculares em pacientes com ICFEP. 

Métodos do estudo e população envolvida 

O TOPCAT foi estudo internacional, randomizado, duplo cego, placebo controlado, realizado em 233 centros de 6 países entre 2006 e 2012. Foram incluídos 3445 pacientes com 50 anos ou mais que tinham IC sintomática e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≥ 45%. Os pacientes tinham pressão arterial sistólica < 140mmHg, potássio < 5mmol/L e internação por IC nos últimos 12 meses ou peptídeos natriuréticos elevados.   

O TOPCAT realizou medidas seriadas de potássio, o que possibilitou a análise do TFA e o estudo atual foi uma análise post-hoc deste. O desfecho primário era composto por mortalidade cardiovascular, parada cardíaca abortada e internação por IC e o desfecho secundário era mortalidade por todas as causas.  

Resultados 

Nesta análise foram incluídos 3141 pacientes com idade média de 69 anos e 50,9% mulheres. Os pacientes foram divididos em três tercis de acordo com o TFA, considerado como valores de potássio entre 4,3 e 4,9 mmol/L. O tercil 1 tinha TFA entre 0 e 34%, o tercil 2 entre 34,1 e 67% e o tercil 3 entre 67,1 e 100%.  

Comparado ao tercil 1, os pacientes do tercil 3 eram com mais frequência brancos (94% x 85,95), originários da Rússia ou Georgia (62% x 39,4%), com maior taxa de filtração glomerular (67,36 x 64,88 mL/min/1,73m2), menos classe funcional da NYHA 3-4 (28,6% x 32,4%), maiores níveis de potássio e maior frequência de uso de IECA/BRA e espironolactona (85,8% x 82,2% e 56% x 39,5%). 

Os níveis médios de potássio no geral eram de 4,5mmol/L e a variabilidade de 0,3 mmol/L. O TFA geral foi de 52% e os pacientes do tercil 3, com maiores TFA, tiveram maiores níveis médios de potássio (4,6 x 4,1mmol/L) e menor variabilidade que os do tercil 1.  

Níveis maiores de potássio foram associados a menor risco do desfecho primário. Ao se comparar os tercis 1 e 3, a incidência cumulativa de desfechos cardiovasculares e mortalidade por todas as causas foi menor nos pacientes do tercil 3. Após ajustes, maiores TFA foram associados a menor risco de desfecho primário (HR 0,712; IC95% 0,571-0,889, p=0,001), assim como de desfecho secundário. 

Ao se analisar o TFA de forma contínua, houve associação positiva e cada aumento de um desvio padrão no TFA foi associado a redução significativa dos desfechos primário e secundário. Essa associação se manteve significativa após ajustes para os valores médios de potássio e sua variabilidade. Na análise de subgrupos, pacientes em uso de espironolactona tiveram maior TFA que os pacientes que não usavam a medicação.  

Níveis de potássio influenciam no desfecho de pacientes com ICFEP? 

Comentários e conclusão: níveis de potássio e ICFEP 

Este estudo é o primeiro a utilizar o TFA do potássio para monitorizar sua homeostase no longo prazo e utilizou pacientes com ICFEP que haviam participado do estudo TOPCAT. No seguimento de 3,9 anos, foi visto que maior tempo de potássio no alvo teve relação com menor risco de eventos cardiovasculares e mortalidade por todas as causas.  

Esta associação ocorreu independente dos fatores de risco cardiovasculares tradicionais, níveis de potássio médios e variabilidade do potássio. Ou seja, esse estudo sugere que manter níveis de potássio normais e maior TFA em pacientes com ICFEP ajuda na melhora dos desfechos cardiovasculares. Ainda, a espironolactona pode auxiliar na manutenção de níveis adequados de potássio por mais tempo. 

Existem alguns pontos do estudo a se considerar. O nível ótimo de potássio ainda precisa ser determinado e alguns estudos sugerem uma faixa mais estreita que os níveis atualmente considerados normais. Neste estudo, os benefícios estiveram associados a níveis entre 4,3 e 4,9, mas níveis um pouco menores (entre 4 e 4,3) ou um pouco maiores (entre 4,9 e 5,2) não tiveram efeitos negativos.  

Além disso, essa foi uma análise post-hoc, incluiu apenas pacientes dos Estados Unidos, Russa e Georgia, com maioria branca, existe possibilidade de viés de seleção e possibilidade de presença de confundidores não avaliados, como uso de outras medicações e variações na FEVE e na função renal ao longo do tempo. 

Apesar dessas limitações, o estudo sugere que manter níveis mais estáveis e um pouco mais altos de potássio pode ter benefício em redução de desfechos cardiovasculares nos pacientes com ICFEP.

Autoria

Foto de Isabela Abud Manta

Isabela Abud Manta

Editora médica de Cardiologia da Afya ⦁ Residência em Clínica Médica pela UNIFESP ⦁ Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) ⦁ Graduação em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) ⦁ Atua nas áreas de terapia intensiva, cardiologia ambulatorial, enfermaria e em ensino médico.

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