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Cardiologia13 junho 2024

FA no pós-operatório de CRM: Anticoagular ou não? 

A fibrilação atrial no pós-operatório (FAPO) é uma complicação frequente da cirurgia cardíaca
Por Juliana Avelar

A FAPO é definida como fibrilação atrial (FA) detectada no ECG de 12 derivações ou pelo menos 30 segundos na telemetria no pós-operatório imediato de cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM). Sua incidência é maior em pacientes submetidos à cirurgia valvar + revascularização do miocárdio do que naqueles submetidos a CRM isolada. 

A FA geralmente ocorre no período pós-operatório imediato, com pico de incidência no segundo dia. É provavelmente desencadeada por alterações induzidas pela operação, incluindo inflamação, alterações do sistema nervoso autônomo, isquemia atrial, distúrbios hemodinâmicos e derrame pericárdico. 

Como a maioria desses distúrbios são temporários, a FAPO é geralmente de curta duração e presumivelmente autolimitada. 

É comum a dúvida sobre anticoagular ou não esses pacientes. As últimas diretrizes da Sociedade Europeia de Cardiologia (2020) e da American Heart Association/American College of Cardiology (2014) sugerem apenas que a anticoagulação a longo prazo deve ser considerada com base no perfil de risco do paciente. Não existem ensaios clínicos randomizados sobre esse assunto.  

FA no pós-operatório de CRM: Anticoagular ou não? 

A revisão 

O European Heart Journal publicou, recentemente, uma revisão sobre esse assunto para avaliar os desfechos nos pacientes que desenvolvem FAPO após CRM. Vamos tratar nesse texto sobre os principais pontos. 

Foram incluídos 28 artigos. Esses estudos incluíram um total de 1.698.307 pacientes, com uma incidência média de FAPO de 23,7%. O início da anticoagulação oral em pacientes com FAPO variou entre os estudos, com uma média de 15,5% (3,6% –53,0%) dos pacientes recebendo ACO. A varfarina foi o anticoagulante mais prescrito (62% pacientes), enquanto 38% dos pacientes receberam algum anticoagulante não antagonista de vitamina K (NOAC). 

Desfechos avaliados 

Durante a internação hospitalar 

A taxa global de eventos tromboembólicos foi de 1,6% e a mortalidade foi de 1,4%. Ao comparar pacientes com FAPO e não-FAPO, as taxas foram maiores em pacientes com FAPO, com 2,6% de eventos tromboembólicos e 2,0% de mortalidade em comparação com 1,2% e 1,2% em pacientes sem FAPO, respectivamente. 

Dentro de 30 dias, a taxa total de eventos tromboembólicos foi de 1,0%, enquanto a mortalidade foi de 2,0%. Pacientes com FAPO tiveram menor taxa de eventos tromboembólicos (0,3%) em comparação com pacientes sem FAPO (0,8%), mas uma taxa de mortalidade mais elevada (1,0% vs. 0,5%). Adicionalmente, sangramento ocorreu em 1,1% dos pacientes com FAPO e em 2,7% em pacientes sem FAPO. 

Dentro de 1 ano 

A taxa geral de eventos tromboembólicos diminuiu para 0,6%, mas a taxa de mortalidade aumentou para 3,8%. Pacientes com FAPO tiveram uma taxa maior de eventos tromboembólicos (0,8%) em comparação com pacientes sem FAPO (0,5%) e uma maior taxa de mortalidade (6,4% vs. 2,7%). 

Eventos por 100 pessoas-ano 

As taxas de eventos tromboembólicos foram de 1,30 por 100 pessoas-ano. A mortalidade foi de 2,43 por 100 pessoas-ano e houve 1,72 sangramentos eventos na população geral de CRM no acompanhamento de 4,6 anos.  

Pacientes com FAPO tiveram taxas mais altas de eventos tromboembólicos (1,73 vs. 1,14 eventos), mortalidade (3,39 vs. 2,19 eventos) e sangramento (2,00 vs.1,60 eventos) por 100 pessoas-ano. 

Leia também: Nova diretriz para a doença arterial periférica de membros inferiores 

Estratificação pelo uso de ACO 

Para essa estratificação, quatro estudos puderam ser incluídos. 

A metanálise mostrou que os riscos de mortalidade e de evento tromboembólico foram semelhante nos grupos com e sem ACO. O risco de sangramento foi maior no grupo anticoagulado. 

Conclusão 

A revisão sistemática e meta-análise mostrou, então, que a FAPO após CRM ocorre com frequência (até ~37%) e em pacientes com FAPO a anticoagulação só é iniciada em um a cada seis pacientes. 

Além disso, demonstrou-se que a incidência de tromboembolismo e mortalidade foi semelhante em pacientes com e sem anticoagulação, enquanto o primeiro grupo de pacientes apresentou significativamente mais sangramento. 

Portanto, a meta-análise não mostrou efeito significativo do tratamento sobre tromboembolismo e mortalidade quando comparados àqueles que receberam anticoagulação vs os que não receberam. No entanto, os pacientes tratados com ACO apresentaram um risco significativamente maior de eventos hemorrágicos. 

A heterogeneidade entre os estudos mostra a ampla gama das práticas de iniciação de ACO e a ausência de um consenso claro no atendimento clínico. 

Saiba mais: SOCESP 2024: Risco residual na doença aterotrombótica

Mensagens práticas 

Apesar das limitações dessa revisão (estudos observacionais, heterogêneos), são fornecidas informações valiosas sobre a incidência de FAPO após CRM. 

Fica clara a necessidade de ensaios clínicos randomizados que avaliem a eficácia e segurança de início do ACO nesta população específica de pacientes, gerando assim evidências mais robustas para orientar a tomada de decisão clínica. Por ora, a anticoagulação nesse cenário específico parece trazer mais riscos do que benefícios. 

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Referências bibliográficas

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