No Brasil, estima-se que 30% da população seja hipertensa. Nesse contexto, estratégias efetivas de prevenção, diagnóstico precoce e controle da HA são essenciais para mitigar seu impacto, especialmente em populações vulneráveis.
Em relação aos betabloqueadores (BB), nos anos 2000, estudos sugeriram uma menor eficácia desses fármacos quando comparados a outras classes anti-hipertensivas, especialmente na proteção cerebrovascular, relegando os BB a uma posição secundária no tratamento da hipertensão arterial (HA). O questionamento atual é que esses trabalhos partiam da premissa de que os efeitos clínicos dos diferentes BB na HA seriam equivalentes e, na época, essas revisões não levavam em consideração a qualidade dos estudos para a elaboração de suas conclusões.
Recomendação
Com o objetivo de esclarecer essa questão, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) desenvolveu uma recomendação clínica sobre o uso do atenolol (o medicamento mais utilizado e disponível da classe dos BB) na população com HA baseado em uma revisão sistemática. O desfecho primário utilizado foi a combinação de eventos cardiovasculares maiores, incluindo morte por qualquer causa, AVC e IAM. Os desfechos secundários escolhidos foram os eventos individualizados do desfecho primário, além de eventos adversos possivelmente coletados nos estudos originais.
Foram incluídos 7 ensaios clínicos randomizados. Os estudos analisaram populações de pacientes com HA e diferentes perfis clínicos, com número de participantes variando de 884 a 22.576 e idades médias entre 56 e 79 anos. As populações eram compostas por indivíduos com hipertrofia ventricular esquerda, diabetes melito tipo 2 e fatores de risco cardiovascular adicionais, além de HA.
Quanto aos efeitos cardiovasculares maiores, a combinação amilorida + hidroclorotiazida, em comparação com atenolol, apresentou o melhor perfil protetor com menos eventos e com efeito clinicamente relevante. Anlodipino e losartana também mostraram menor número de eventos em comparação ao atenolol, porém seus intervalos de confiança tocaram o limiar de DMI (diferença mínima importante), reduzindo a certeza quanto à relevância clínica desses achados.
Quanto aos eventos adversos, apenas três estudos os reportaram. A única diferença relevante foi observada na comparação com anlodipino, em que o atenolol apresentou maior frequência de bradicardia, achado compatível com o perfil farmacológico dos betabloqueadores.
Vale destacar que algumas recomendações de sociedades médicas contrárias ao uso do atenolol são baseadas em fatores como potência, dose, frequência de uso e interações farmacocinéticas. Além disso, doses de 100 a 200 mg por dia mostraram-se mais eficazes do que doses de 25 e 50 mg por dia em pacientes com angina, o que pode também se aplicar ao tratamento da HA.
Um fato que parece não deixar dúvidas é a intensidade da redução da PA nas combinações que utilizaram o atenolol como medicamento inicial, em comparação às combinações administradas no braço comparador. Em todos os estudos originais incluídos, a redução da PA foi bastante semelhante entre o atenolol e os medicamentos comparados, sugerindo um efeito na redução da PA similar ao das demais classes de anti-hipertensivos.
Limitações
O documento apresenta limitações importantes. A principal é o número reduzido de estudos com comparações diretas entre atenolol e outras classes anti-hipertensivas. A limitação é ainda mais acentuada para outros betabloqueadores usados na hipertensão (metoprolol, bisoprolol, carvedilol, nebivolol), devido à escassez significativa de estudos, impossibilitando análises confiáveis.
Apesar da proposta de realizar uma metanálise em rede, não foi possível executar comparações indiretas por falta de dados adequados.
Outro ponto crítico é que nenhum estudo avaliou betabloqueadores em monoterapia, situação que reflete a prática clínica, mas dificulta a interpretação do efeito isolado do atenolol ou dos medicamentos comparadores, já que todos foram usados em associação com outras drogas anti-hipertensivas.

Conclusão: atenolol no tratamento anti-hipertensivo
Apesar das evidências limitadas, o atenolol demonstrou eficácia comparável na redução da PA, com pequenas diferenças nos desfechos cardiovasculares a favor de outras classes de anti-hipertensivos, com baixo nível de evidência. A recomendação deste painel de especialistas foi, então, a de que o atenolol pode ser considerado entre as opções para associação medicamentosa no tratamento da HA primária em Como em qualquer recomendação clínica, sugere-se que a prescrição seja individualizada, considerando as comorbidades, características clínicas e preferências de cada paciente, além do julgamento clínico do profissional prescritor.
Autoria

Juliana Avelar
Médica formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Cardiologista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
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