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Os eventos cardiovasculares são uma das complicações mais comuns no pós-operatório de cirurgias não cardíacas, e conferem ao paciente um pior prognóstico. Por isso, diversas estratégias visam identificar os pacientes de maior risco e implementar estratégias para reduzir a chance de eventos cardiovasculares. Mesmo assim, estes pacientes se beneficiam de uma estratégia de vigilância ativa no pós-operatório imediato (48-72h), com monitorização do eletrocardiograma e realização da dosagem seriada de troponina.
Quando ocorre a elevação da troponina no pós-op imediato, o primeiro passo é excluir causas não-isquêmicas, como sepse, embolia pulmonar e ICC descompensada. Em nossa reportagem prévia explicamos como fazer isso. A próxima etapa é que traz polêmica: a definição de IAM envolve uma enzima positiva associada a uma evidência de isquemia, que pode ser dor, alteração no ECG ou em outro método de imagem. O problema é que no pós-op os pacientes estão em uso de analgesia e podem ser falso-assintomáticos. Por outro lado, a elevação isolada de troponina é questionada por alguns autores se é suficiente para afirmarmos que trata-se de um IAM. É bom lembrar que no pós-op, o IAM tipo 2, por aumento de consumo, é mais comum que o IAM tipo 1 por aterosclerose!
O que fazer na prática?
No estudo Vision, a elevação da troponina, excluídas causas sistêmicas, nos primeiros 30 dias após cirurgia não cardíaca, foi considerada definição de IAM pós operatório (MINS – myocardial injury after noncardiac surgery). Quando dosada nos primeiros 3 dias após a cirurgia, esteve associada com maior risco de morte nos primeiros 30 dias de pós-op! Por isso, entende-se que estes pacientes – com troponina positiva nas primeiras 72h de pós-op – se beneficiam de uma estratégia de redução do risco.
O estudo MANAGE foi desenhado para avaliar a dabigatrana na dose de 110 mg 12/12h em pacientes com > 45 anos de idade e MINS no pós-operatório de cirurgia não cardíaca. Foram excluídos pacientes com contraindicações para anticoagulação. A população tinha idade média de 70 anos, metade do sexo masculino, 67% de hipertensos e 27% de diabéticos. A maioria das cirurgias foi ortopédica e/ou cirurgia geral.
O que o estudo mostrou? A dabigatrana reduziu em 28% o risco de um desfecho combinado de morte por doença vascular, IAM, AVC, doença arterial periférica e TVP (HR 0,72; IC95% 0,55-,93). E não houve aumento no risco de sangramento!
Quais as críticas e limitações? 80% dos pacientes incluídos tinham apenas a troponina positiva. Será isso o suficiente para selecionar pessoas de alto risco? Os autores dizem que sim, e usam os resultados do Vision como respaldo. Além disso, o subgrupo de 20% dos pacientes com IAM pela definição oficial se beneficiou da dabigatrana na análise post hoc.
Ainda sobre limitações, poucos pacientes estavam sob antiagregação plaquetária, o que na vida real pode aumentar o risco de sangramento. Outro aspecto que chama a atenção é que de 5963 pacientes elegíveis, 2109 não concordaram em participar e em 409 o cirurgião não permitiu recrutamento, o que pode prejudicar extrapolarmos estes resultados para o mundo real.
Conclusão: há uma luz para os pacientes com IAM no pós-op imediato, mas novos estudos são necessários para confirmar estes resultados e validar se a dabigatrana, ou outros NOACs, serão a droga de escolha no MINS.
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Referências:
- Dabigatran in patients with myocardial injury after non-cardiac surgery (MANAGE): an international, randomised, placebo-controlled trial. DOI: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)30832-8
- Association of Postoperative High-Sensitivity Troponin Levels With Myocardial Injury and 30-Day Mortality Among Patients Undergoing Noncardiac Surgery. JAMA. 2017 Apr 25;317(16):1642-1651. doi: 10.1001/jama.2017.4360.
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