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Cardiologia8 setembro 2025

Agonistas de GLP-1 e redução de risco cardiovascular 

Estudo avaliou o impacto clínico dos medicamentos agonistas do receptor de GLP-1 para redução de risco cardiovascular 
Por Juliana Avelar

Ensaios clínicos cardiovasculares de grande relevância, como o LEADER e o SELECT, demonstraram os benefícios cardiometabólicos dos agonistas do receptor de GLP-1 (GLP-1RA) na redução de MACE (major adverse cardiovascular events) tanto em populações com diabetes mellitus tipo 2 (DM2), quanto em populações com sobrepeso ou obesidade na ausência de DM2. 

O estudo recentemente publicado na Cardiovascular Diabetology se propôs, então, a responder qual o número necessário para tratar (NNT), o perfil de eficácia e de segurança do GLP-1RA na redução do risco de infarto do miocárdio (IM) e de componentes individuais da DCVA (doença cardiovascular aterosclerótica).  

Métodos 

Trata-se de uma revisão sistemática e meta-análise. No total, 26 artigos, derivados de 25 ensaios clínicos únicos, publicados entre 2013 e 2025 e envolvendo 109.846 pacientes, foram selecionados para inclusão neste estudo.  Todos os ensaios foram randomizados e conduzidos em pacientes adultos (≥ 18 anos). A maioria foi realizada em cenário multinacional, exceto dois estudos conduzidos exclusivamente no Japão. A maioria também foi conduzida em pacientes com DM2, exceto um estudo realizado em uma coorte com obesidade na ausência de DM2. Além disso, o estudo Evaluate Renal Function with Semaglutide Once Weekly (FLOW)  recrutou participantes com doença renal crônica. 

A proporção de homens variou de 24% a 76%, e a idade média foi de 62,6 ± 9,2 anos 

A maioria dos estudos comparou GLP-1RA com placebo, enquanto outros usaram regimes de insulina e outras medicações antidiabéticas como comparadores.  

Número necessário para tratar 

Quando comparado ao placebo, o NNT no conjunto global de estudos foi calculado com base em seguimento médio de 3,48 anos. 

Os resultados mostram que o número necessário para beneficiar (NNTB) foi: 

  • 207 para infarto do miocárdio total 
  • 67 para MACE 
  • 170 para mortalidade cardiovascular 
  • 93 para revascularização coronariana 

As diretrizes clínicas atuais  recomendam o uso de GLP-1RA em pacientes com DM2 e alto risco de ASCVD. Nessa revisão, foram observados diversos achados principais na análise abrangente de 25 ensaios com mais de 109.846 participantes. O efeito terapêutico do GLP-1RA resultou em redução de 14% no risco de IAM total, embora tal efeito deva ser interpretado à luz de um NNT de 207 para prevenir um evento de IAM ao longo de 3,48 ± 1,51 anos. Essa redução foi ligeiramente atenuada na população com DM2 e na coorte de prevenção secundária com ASCVD prévia.
A meta-regressão revelou maior eficácia na redução de IAM em indivíduos com IMC elevado e com início precoce do GLP-1RA. Também se observou redução significativa de angina instável e revascularização não planejada na coorte de prevenção secundária, o que pode ter relevância clínica para pacientes com eventos prévios de ASCVD.
Os benefícios na redução de risco de ASCVD com GLP-1RA incluem redução de 14% na mortalidade cardiovascular, 13% em MACE e 12% em AVC, com um perfil de segurança favorável, apesar do aumento de 6% nos eventos adversos gerais. Essa redução parece ser em grande parte atribuída à diminuição de 13% no MACE de três pontos (morte cardiovascular, IAM não fatal e AVC não fatal).
Entretanto, pouco se sabe sobre o peso relativo de cada componente individual nessa redução global.  

Evidências prévias sugeriam que, embora os GLP-1RA melhorem o MACE, a redução do IAM não seria o principal determinante dessa melhora global, havendo tendência não significativa de redução de IAM fatal e não fatal e angina instável. Essa revisão desafia essa percepção, demonstrando redução significativa do risco de IAM com o uso de GLP-1RA.
Vários mecanismos têm sido propostos para explicar esses efeitos clínicos, incluindo ação dos GLP-1RA sobre vias inflamatórias, estresse oxidativo e angiogênese no processo aterosclerótico. 

Os agonistas do receptor de GLP-1 mostraram eficácia comparável na redução do risco de infarto do miocárdio (IAM) em relação às terapias médicas guiadas pelas diretrizes atuais para prevenção de doença cardiovascular aterosclerótica (ASCVD). O número necessário para tratar para redução do risco de IAM ao longo de cinco anos foi relatado em 361 para aspirina, 104 para estatinas e 100 para medicamentos anti-hipertensivos, em comparação ao NNT de 207 para GLP-1RA. 

Em relação aos componentes individuais do MACE, o presente estudo informa aos clínicos que o impacto do GLP-1RA, baseado no NNT, é predominantemente na redução do risco de revascularização coronariana, seguido por IAM total, mortalidade cardiovascular, IAM não fatal e AVC. 

Vale destacar que a possibilidade de que diferentes GLP-1RAs possam impactar de forma distinta o risco de IAM não pode ser descartada. Quatro GLP-1RAs demonstraram grau similar de proteção contra IAM total, com albiglutida associada ao menor NNTB para IAM total, seguida por semaglutida, efpeglenatida e liraglutida. O lixisenatida foi o único subtipo de GLP-1RA que aumentou o risco de IAM,  sendo importante considerar que o ensaio ELIXA, que estudou lixisenatida em pacientes com DM2, incluiu a população de mais alto risco, pois recrutou participantes com eventos coronarianos agudos recentes nos últimos 180 dias.  

Fatores específicos do paciente podem modificar o efeito benéfico do GLP-1RA na redução do risco de IAM. A obesidade está intrinsecamente associada ao risco de doenças isquêmicas cardíacas, com relação dose-resposta. Os achados dessa revisão sugerem que maior IMC está associado a redução significativamente maior do risco de IAM com o uso de GLP-1RA. 

Além disso, o GLP-1RA não resultou em melhora significativa nos desfechos de IAM total e IAM não fatal em comparação ao placebo, na análise de sensibilidade das populações com DM2 e prevenção secundária. Isso provavelmente reflete o status multimórbido competitivo na população geralmente de maior risco com DM2, que pode atenuar os efeitos benéficos gerais do GLP-1RA. 

Enquanto outros relataram redução significativa de MACE com terapia por GLP-1RA na coorte de prevenção secundária, mas não na prevenção primária, os resultados dessa revisão ampliam essa noção, indicando que o impacto benéfico sobre os componentes individuais do MACE, particularmente a redução do risco de IAM, pode ser atenuado na população de prevenção secundária de maior risco e com DCV estabelecida, geralmente caracterizada por idade avançada e multimorbidade. 

Tomados em conjunto, isso reforça a importância do início oportuno do GLP-1RA, focando na população de prevenção primária com sobrepeso/obesidade, antes da manifestação do DM2 e do desenvolvimento de ASCVD. 

O GLP-1RA demonstrou evidências mistas em relação à redução de IAM, revascularização coronariana, insuficiência cardíaca e/ou mortalidade cardiovascular quando comparado a outros agentes hipoglicemiantes. Vários estudos relataram redução de risco maior para revascularização coronariana, em torno de 44%, quando comparado a sulfonilureias e inibidores da dipeptidil peptidase. Esse estudo sugeriu melhora nas taxas de IAM, embora não estatisticamente significativa, com o uso de GLP-1RA comparado a outros agentes hipoglicemiantes. 

Análises maiores, comparando diretamente GLP-1RA com outras classes de agentes hipoglicemiantes, são necessárias para avaliar seus efeitos na aterosclerose e regressão de placas. 

Limitações 

Primeiro, em desfechos compostos como MACE, diferenças nas definições introduzem heterogeneidade na análise. Por isso, deve-se ter cautela na interpretação do NNT derivado da análise de MACE. 

Segundo, a maioria dos estudos incluiu participantes com DM2, exceto o ensaio SELECT. Assim, generalizar o efeito de redução do IAM para populações sem DM2 deve ser feito com cautela.  

Terceiro, os estudos incluídos consistiram principalmente de pacientes com e sem ASCVD prévia misturados, impedindo comparação direta da utilidade do GLP-1RA entre coortes de prevenção primária e secundária.  

Quarto, faltam comparações com medicamentos hipoglicemiantes novos (ex SGLT2i) e com novos GLP-1RAs, como os medicamentos duais GIP e GLP-1RA (tirzepatida), quanto à eficácia na redução do risco de ASCVD.  

Quinto, as estimativas atuais do NNT mostram grande incerteza, evidenciada por amplos intervalos de confiança em alguns resultados.  

Conclusões: agonistas de GLP-1 e redução de risco cardiovascular  

Nessa metanálise, que abrangeu pacientes sem comorbidades prévias e também aqueles com ASCVD e DM2, o GLP-1RA demonstrou redução significativa de 12% no risco de IAM, com NNT de 248 para prevenir um evento de IAM. Este benefício foi mais pronunciado naqueles com maior IMC. Na coorte de prevenção secundária, o GLP-1 RA pode ser considerado pela redução significativa no risco de angina instável e revascularização coronariana. 

Associado ao seu perfil favorável de segurança, as evidências suportam o papel do GLP-1 RA como parte da terapia na redução global do risco de ASCVD, especialmente nos pacientes com IMC elevado. 

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Referências bibliográficas

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