A hialuronidase é uma enzima amplamente utilizada com sucesso, há mais de 80 anos, como adjuvante em técnicas de anestesia regional oftálmica, especialmente nos bloqueios retrobulbar e peribulbar. Sua principal função é facilitar a difusão dos anestésicos locais nos tecidos orbitais, pela quebra do ácido hialurônico dos tecidos, promovendo uma instalação mais rápida e homogênea da anestesia.
Mecanismo de ação
O ácido hialurônico é comumente conhecido como um lubrificante responsável pelas propriedades viscoelásticas dos fluidos teciduais e responsável também por estabilizar e hidratar os elementos dos tecidos conjuntivos.
A hialuronidase atua quebrando o ácido hialurônico da matriz extracelular, diminuindo a viscosidade do tecido conjuntivo e facilitando a permeabilidade do anestésico local. Essa ação permite uma dispersão mais eficiente da solução anestésica dentro da órbita, contribuindo para uma melhor qualidade anestésica, com instalação mais rápida do bloqueio motor e sensitivo e uma redução de necessidade do uso de grandes volumes anestésicos que podem ser prejudiciais ao globo ocular.
Indicação na anestesia oftálmica
A adição da hialuronidase é particularmente útil em procedimentos oftalmológicos que requerem imobilização adequada do globo ocular e analgesia eficaz, como em cirurgias de catarata, vitrectomia e outras intervenções intraoculares.
Em blefaroplastias tem sido utilizada melhorando a qualidade tecidual das pálpebras e facilitando a realização do procedimento.
Posologia
A concentração mais comumente utilizada varia entre 7,5 e 15 UI/mL diluída em 10 mL de solução anestésica, podendo chegar a 30 UI/mL em alguns protocolos. A dose total deve ser ajustada com base no volume e tipo de anestésico utilizado, bem como nas características clínicas de cada paciente.
Benefícios
- Aumenta a segurança do bloqueio anestésico;
- Diminui o tempo de latência do bloqueio anestésico;
- Facilita a acinesia dos músculos oculares;
- Melhora a difusão do anestésica orbitária por promove menor resistência tecidual à injeção;
- Reduz o volume anestésico total, diminuindo o risco de efeitos adversos relacionados a grandes volumes anestésicos por aumento da pressão intraocular e intraorbital;
- Reduz a incidência de complicações mecânicas devido à necessidade de menor pressão durante a injeção;
- Reduz a incidência de dor no pós-operatório.
Em estudos realizados anteriormente, evidenciou-se um papel bem relevante nos bloqueios oculares com o uso da enzima. Swathi et all, em 2018 avaliou pacientes submetidos a cirurgia de catarata com bloqueio peribulbar. Nesse estudo, o grupo onde foi administrado hialuronidase como adjuvante ao anestésico local apresentou maior acinesia orbitária e maior analgesia do que o grupo controle.
Outro estudo realizado por Remy et all, avaliou 40 pacientes submetidos também a cirurgia de catarata com o uso de bloqueio ocular e 75 UI de hialuronidase. A inclusão da enzima com o anestésico local para anestesia retrobulbar melhorou a segurança do procedimento, proporcionando paralisia muscular completa e menor latência anestésica.
Efeitos adversos e contraindicações
Apesar de ser geralmente bem tolerada, a hialuronidase pode causar reações alérgicas, principalmente em pacientes com hipersensibilidade a proteínas de origem animal, uma vez que a enzima é tradicionalmente extraída de testículos bovinos ou ovinos.
Reações alérgicas podem se manifestar com edema orbitário, eritema e prurido local.
Atualmente, já existem formulações recombinantes humanas, feitas por engenharia genética com menor índice de impureza e toxicidade diminuindo os riscos de reações alérgicas.
A hialuronidase é contraindicada principalmente em pacientes com histórico de alergia conhecida à enzima, e deve ser usada com cautela em procedimentos em que a difusão tecidual precisa ser limitada. Além disso também é contraindicada em pacientes com alto índice de trombose, pacientes que fazem uso de salicilatos, corticoides, anti-histamínicos e hormônios a base de estrogênio.
Conclusão
A enzima hialuronidase é um adjuvante eficaz na anestesia peribulbar e retrobulbar para cirurgias oftalmológicas, permitindo um início de ação rápido com analgesia pós-operatória mais eficaz e possibilitando o uso de volumes mais baixos de anestésicos locais, reduzindo assim os efeitos colaterais e chances de complicações.
Embora a variabilidade na eficácia do uso da enzima esteja documentada, ela se deve principalmente as concentrações variáveis do medicamento utilizado.
A hialuronidase recombinante pode nos ajudar a superar as preocupações com reações alérgicas associadas a uso da enzima de origem animal.
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