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Terapia Intensiva17 novembro 2025

Infarto do miocárdio por oclusão e seus padrões eletrocardiográficos

Entenda os padrões eletrocardiográficos que indicam infarto por oclusão e saiba como reconhecer sinais de alto risco na prática clínica.
Por Hiago Bastos

O artigo Padrões eletrocardiográficos do infarto do miocárdio por oclusão: uma revisão narrativa” apresenta uma análise crítica e abrangente da evolução conceitual e diagnóstica do infarto agudo do miocárdio (IAM), propondo a substituição do tradicional paradigma STEMI/NSTEMI (infarto com ou sem elevação do segmento ST) por uma abordagem fisiopatológica mais precisa, baseada na distinção entre infarto por oclusão coronariana (OMI) e infarto sem oclusão coronariana (NOMI). Essa reestruturação conceitual visa aprimorar a acurácia diagnóstica e o manejo terapêutico, destacando a limitação dos critérios clássicos de elevação do segmento ST para identificar todos os casos de oclusão coronária aguda, já que uma proporção significativa de pacientes com NSTEMI também apresenta artérias totalmente ocluídas e, portanto, deveriam receber reperfusão imediata. 

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O artigo inicia abordando a fundamentação histórica dos critérios de STEMI, estabelecidos originalmente para distinguir infartos de indivíduos sem necrose miocárdica, e não para detectar oclusão coronariana em tempo real. Evidências recentes, contudo, demonstram que até 30% dos casos de NSTEMI correspondem a oclusões totais, com consequências clínicas graves pela falta de diagnóstico precoce. A revisão propõe, assim, uma mudança de paradigma: a ênfase deve se deslocar da leitura quantitativa do ECG para uma interpretação qualitativa e dinâmica, centrada na fisiopatologia da isquemia miocárdica. 

Em seguida, o estudo explora os padrões eletrocardiográficos de alto risco que caracterizam o OMI, mesmo na ausência de elevação típica do ST. Dentre eles, destacam-se: a Síndrome de Wellens, indicativa de reperfusão espontânea de artéria descendente anterior esquerda; as ondas T hiperagudas, que representam um dos sinais mais precoces de oclusão; o padrão de De Winter, um equivalente de STEMI associado à oclusão proximal da descendente anterior; o padrão de Aslanger, relacionado a infarto inferior com elevação isolada de ST em DIII; e o sinal da bandeira da África do Sul, que reflete infarto lateral alto. O artigo também detalha os critérios modificados de Sgarbossa-Smith, aplicáveis a pacientes com bloqueio de ramo esquerdo ou ritmo ventricular estimulado, ressaltando sua superioridade diagnóstica na detecção de oclusões. 

Outrossim, o reconhecimento de fatores demográficos que interferem na interpretação do ECG. O texto discute como idade, sexo e etnia influenciam a amplitude basal do segmento ST, podendo resultar em diagnósticos falso-positivos ou falso-negativos. Essa variação fisiológica exige ajustes nos critérios diagnósticos, especialmente para mulheres e populações não europeias, que tendem a apresentar elevações menores do ST em condições de isquemia real. Tal adaptação pode reduzir atrasos terapêuticos e melhorar a sensibilidade diagnóstica do ECG em diferentes grupos populacionais. 

No tocante à prática clínica, o artigo defende a implementação de um protocolo baseado no conceito de OMI, que privilegie a integração contínua de dados clínicos, laboratoriais e eletrocardiográficos. A leitura seriada de ECGs e a correlação com sintomas em evolução são estratégias fundamentais para identificar casos de oclusão dinâmica, nos quais a reperfusão precoce pode evitar necrose miocárdica extensa. O texto também destaca o papel emergente da inteligência artificial na análise automatizada de ECGs, com potencial para padronizar interpretações e reduzir variabilidade interobservador. 

Portanto, os autores reconhecem as limitações atuais do modelo de OMI, particularmente a escassez de ensaios clínicos randomizados que validem sua superioridade em desfechos prognósticos sobre o paradigma STEMI/NSTEMI. Ainda assim, argumentam que a consistência das evidências observacionais e o racional fisiopatológico robusto sustentam a necessidade de transição para um modelo mais abrangente, centrado na identificação precoce da oclusão coronariana independente da morfologia do segmento ST. Essa mudança, afirmam, tem o potencial de redefinir a triagem de síndromes coronarianas agudas, otimizando o tempo porta-balão, reduzindo mortalidade e ampliando a capacidade de preservação do miocárdio viável. 

Assim, o artigo de Ricci et al. contribui significativamente para o refinamento do diagnóstico eletrocardiográfico no contexto da cardiologia de emergência, propondo uma reformulação paradigmática que desloca o foco do marcador elétrico estático para a dinâmica fisiopatológica da oclusão arterial. Essa abordagem representa um avanço conceitual e clínico rumo a um cuidado mais preciso, personalizado e fisiologicamente fundamentado no tratamento do infarto agudo do miocárdio. 

Autoria

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Hiago Bastos

Graduação em Medicina pela Universidade Ceuma (2016), como bolsista integral do PROUNI ⦁  Especialista em Terapia Intensiva no Programa de Especialização em Medicina Intensiva (PEMI/AMIB 2020) no Hospital São Domingos ⦁  Fellowship in Intensive Care at the Erasme Hospital (Bruxelles, Belgium) ⦁  Especialista em ECMO pela ELSO ⦁ Médico plantonista na UTI II do Hospital Municipal Djalma Marques desde 2016, na UTI do Hospital São Domingos desde 2018 e Coordenador da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes do Hospital Municipal Djalma Marques desde 2017 ⦁  Fundador e ex-presidente da Liga Acadêmica de Medicina de Urgência e Emergências do Maranhão (LAMURGEM-MA) ⦁  Experiência na área de Emergências e Terapia intensiva.

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