Nos dias 25 e 26 de abril de 2025 acontece em São Paulo o EUROBRAZIL, congresso colaborativo entre a AMIB e a ESICM.
No segundo dia de congresso, foram apresentadas as perspectivas para a atualização do score SOFA, que deve ser publicado em breve – o SOFA 2.0.
O SOFA (Sequential Organ Failure Assessment) foi criado em 1994 por consenso de especialistas e publicado em 1996.
Inicialmente foi desenvolvido para avaliar disfunção orgânica em pacientes com sepse, mas posteriormente foi aplicado também a pacientes não sépticos. Foi desenvolvido para ser um score simples e prático para medir grau de disfunção orgânica em pacientes graves independente da causa e inclui seis variáveis relacionadas a seis funções orgânicas, com pontuação de 0 a 4, onde valores maiores indicam maior disfunção.
Alterações locais e adaptações foram feitas em diferentes países, mas sem atualização oficial do score desde 1996.
Disfunção respiratória
O Dr Ricardo Goulart de São Paulo iniciou falando sobre possíveis alterações dos critérios de disfunção respiratória.
Desde 1996, a variável respiratória baseia-se na relação PaO2/FiO2 para avaliar troca gasosa e gravidade. Essa relação pode ser influenciada pela estratégia ventilatória, como ajustes na PEEP, alterando assim a classificação do paciente.
Pontuações 3 e 4 exigem ventilação mecânica obrigatoriamente, o que limita a aplicação em pacientes que usam ventilação não invasiva (VNI) ou cateter nasal de alto fluxo (CNAF).
A proposta de atualização para o SOFA 2.0 foi: inclusão da relação SO2/FiO2 como medida não invasiva para avaliação da troca gasosa, aplicável à beira-leito (essa relação é válida para SO2< 97%, pois acima desse valor a curva de dissociação da hemoglobina atinge platô, limitando a estimativa do PaO2.)
As desvantagens apontadas foram: Influência da perfusão, uso de drogas vasoativas, cor da pele, e erro de até 3% que pode causar distorções na classificação da gravidade da SARA.
- Considerar o uso do CNAF e VNI como marcadores de suporte respiratório, removendo a obrigatoriedade da ventilação mecânica para pontuações 3 e 4.
- Possível inclusão da ECMO como variável na avaliação respiratória.
EUROBRAZIL 2025: Interação coração-pulmão e os estados de choque
Sistema gastrointestinal
A seguir, a Dra Julia Wendon de Londres explanou sobre o sistema gastrointestinal e se havia possibilidade de incluir este critério na atualização do score SOFA.
A disfunção gastrointestinal é um conceito amplo e ainda não formalmente definido ou categorizado, uma vez que envolve múltiplos aspectos como íleo, diarreia, dilatação do cólon, edema intestinal e colite, mas não há consenso claro sobre critérios diagnósticos ou de gravidade.
Além disso, muitas manifestações podem ser induzidas por medicamentos, como laxantes, e nem sempre indicam falência intestinal. Há também grande variação na forma como profissionais medem e interpretam parâmetros como pressão intra-abdominal e distensão abdominal.
Biomarcadores como citrulina e proteínas intestinais foram estudados para refletir função intestinal, mas não demonstraram relação consistente com desfechos clínicos.
Portanto, a ausência de critérios claros e padronizados para definir e medir disfunção gastrointestinal limita a inclusão dessa função em escores como o SOFA.
Sistema imune
O Dr Jen de Waele da Bélgica trouxe a reflexão sobre a inclusão ou não do sistema imune no SOFA 2.0.
O sistema imune é complexo e atua como um motor de disfunção orgânica, não necessariamente como um órgão isolado. Em 1994, a falta de marcadores simples, disponíveis e validados impediu a inclusão do sistema imune no score.
Marcadores comuns como contagem de leucócitos ou relação neutrófilo-linfócito são facilmente obtidos, mas sua aplicabilidade clínica para avaliação da disfunção imune é questionável. Já marcadores mais específicos, como expressão de HLA-DR em granulócitos, são complexos e não estão disponíveis rotineiramente em todos os hospitais.
A complexidade da resposta imune, incluindo o equilíbrio entre respostas pró e anti-inflamatórias, complementos, leucócitos e coagulação, torna a criação de um score simples um desafio.
Concluiu que a inclusão do sistema imune no SOFA score requer mais pesquisas para identificar marcadores válidos, simples e disponíveis, não sendo viável atualmente.
Por fim, o Dr. Ederlon Rezende de São Paulo falou sobre a atualização necessária dos critérios cardiovasculares do SOFA.
O componente cardiovascular baseava-se na pressão arterial e na dose/tipo de vasopressor, incluindo drogas como dopamina, hoje pouco utilizadas.
Os principais pontos debatidos
- Manutenção ou ajuste do corte de pressão arterial média (PAM) de 70 mmHg para 65 mmHg, considerando a personalização para pacientes com hipertensão crônica.
- Inclusão do lactato como biomarcador para avaliação da perfusão e disfunção cardiovascular, ponderando se acrescenta poder discriminatório além da dose de vasopressor.
- Revisão dos cut-offs para doses de vasopressores, especialmente noradrenalina, para refletir melhor a gravidade do choque. Um estudo da Finlândia (Pölkki et al.,2024) propôs três níveis de dose para adrenalina (baixa, intermediária e alta) com pontos de corte em 0,2 e 0,4 mcg/kg/min, mostrando curvas de sobrevida distintas e bom poder discriminatório.
- Inclusão de novos vasopressores usados atualmente, com definição de equivalência de dose em relação à noradrenalina para facilitar a aplicação do score.
- Consideração da dobutamina e outros inotrópicos para avaliação da disfunção cardíaca, especialmente em choque cardiogênico.
- Inclusão do suporte circulatório mecânico como indicador de disfunção orgânica grave, pois reduz a necessidade de vasopressores e pode mascarar a gravidade se não considerado.
Concluiu que a atualização do SOFA tornará o score mais dinâmico, atual e com maior poder discriminatório do componente cardiovascular, recuperando a importância perdida.
EUROBRAZIL 2025: Confira todos os destaques do congresso!
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.