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Terapia Intensiva25 agosto 2024

Cuidados de fim de vida na Neuro-UTI 

A neuro-UTI possui trajetórias únicas de doenças, prognósticos incertos e muitos desafios reais para avaliação e tratamento dos sintomas.
Por Julia Vargas

As taxas de mortalidade nas unidades de terapia intensiva (UTI) dos EUA se aproximam de 20%, e as taxas nas unidades de terapia neurointensiva (neuro-UTI) variam de 9 a 24%, tornando os cuidados de fim de vida na UTI uma ocorrência comum. Pacientes neste cenário têm alto risco de sequelas físicas e cognitivas graves, complicações e muitos sintomas. Uma lesão cerebral aguda frequentemente impede que os pacientes participem das decisões de tratamento, o que pode afetar negativamente a qualidade do atendimento de fim de vida. 

A trajetória imprevisível da doença desses pacientes e o nível alterado de consciência podem ser desafiadores para os tomadores de decisão substitutos (familiares) e podem apresentar barreiras para as equipes de UTI que buscam avaliação e gerenciamento ​​dos sintomas. 

Cuidados de fim de vida na NeuroUTI 

Imagem de freepik

Objetivos das Conversas de Cuidados de Fim de Vida 

Ter um ente querido na UTI é frequentemente traumatizante. Membros da família de pacientes admitidos na UTI apresentam sintomas de estresse pós-traumático, ansiedade e depressão. Essa angústia pode ser intensificada nos cuidados de fim de vida, devido aos prognósticos variáveis, pressões de tempo, dificuldade de tomada de decisão e culpa sobre a tomada de decisão, desejos não identificados do paciente e má comunicação por parte da equipe. 

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Essa comunicação precisa incluir uma explicação do que as famílias podem esperar à medida que o paciente se aproxima do fim da vida. 

A equipe interdisciplinar deve discutir a trajetória dos sintomas, incluindo os sinais esperados do processo de morte (por exemplo, respirações agônicas e sons das vias aéreas superiores ou “estertor da morte”) versus sinais de desconforto ou sofrimento respiratório (obstrução das vias aéreas, uso de músculos respiratórios acessórios, batimento de asa nasal); fornecer educação sobre estratégias de manejo farmacológico e não farmacológico; e explicar o que acontece após a morte. 

Barreiras para avaliação e manejo de sintomas  

Pacientes neurologicamente críticos podem apresentar alterações na capacidade de comunicação, diminuição do nível de consciência, comprometimento motor e declínio cognitivo, o que pode resultar em subnotificação de sintomas, gerenciamento inadequado dos sintomas e necessidades não atendidas. 

Sinais alternativos e frequentemente sutis de desconforto (por exemplo, taquipneia, taquicardia, padrões respiratórios agonísticos, inquietação, caretas, diaforese e uso de músculos acessórios) devem ser sempre buscados ativamente. 

Além dos sintomas comumente considerados, os sintomas de fim de vida que requerem tratamento também podem incluir hemiparesia, disartria, boca seca, depressão, fadiga, incontinência e espasticidade. 

Para ajudar a identificar as necessidades de cuidados neuropaliativos dos pacientes da UTI neurológica, listas de verificação como a SuPPOrTT oferecem uma avaliação oportuna das necessidades de cuidados paliativos. Outras escalas são: Respiratory Distress Observation Scale (RODS), Critical Care Pain Observation Tool (CPOT), Behavioral Pain Scale (BPS), Generalized Anxi- ety Disorder-7 (GAD-7), Confusion Assessment Method for the ICU (CAM_ICU), Richmond Agitation Sedation Scale (RASS) e Edmonton Symptom Assessment Scale (ESAS).Vale ressaltar que o GAD-7 e o ESAS exigem cooperação do paciente e podem não ser apropriados para todos os pacientes de UTI neurológica.  

O uso de ferramentas de triagem, listas de verificação, questionários e escalas pode promover a triagem e o gerenciamento sistemáticos dos sintomas neuropaliativos e permitir encaminhamentos a especialistas em cuidados paliativos para sintomas refratários complexos, se necessário.  

Suspensão dos suportes de vida  

Dependendo da situação clínica, o uso paliativo de sedação no fim da vida útil pode ser um processo complexo de tomada de decisão; no entanto, diretrizes recentes delineando sua indicação para uso em suspensão dos suportes artificiais podem fornecer um bom resultado. 

A maioria das pessoas que morrem em UTI o faz após suspender o tratamento de suporte de vida. Essa suspensão na UTI neurológica pode incluir ventilação mecânica, nutrição e hidratação artificiais, suporte vasopressor, hemodiálise, oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) e, às vezes, antibióticos e outros medicamentos. 

Lesões isoladas do SNC na ausência de lesões cardiovasculares ou pulmonares limitam nossa compreensão do curso esperado quando a suspensão dos suportes ocorre.  

Dispneia e extubação paliativa 

Embora os indicadores de gravidade de doenças críticas prevejam a mortalidade de forma confiável, os fatores de risco para prever sofrimento no fim da vida na UTI não estão bem estabelecidos.  

Embora a dor seja um sintoma importante a ser identificado e tratado, um crescente conjunto de evidências sugere que a dispneia ou a dificuldade respiratória não são apenas mais comuns, mas também muito mais angustiantes e muitas vezes não são reconhecidas. 

Evidências limitadas sugerem que a extubação paliativa com a presença da família no momento da morte podem estar associadas a uma melhor satisfação familiar.  

Manejo do fim de vida  

Edema cerebral refratário e pressão intracraniana elevada são frequentemente controlados com o uso de dispositivos de monitoramento e tratamento invasivos, o que pode representar um desafio para o cuidado de fim de vida. Uma vez que o cuidado é transferido para um foco de conforto, nem sempre esses dispositivos são removidos e família do paciente deve ser envolvida sobre a decisão da remoção dos dispositivos de monitoramento intracraniano.  

A terapia hiperosmolar é geralmente descontinuada porque pode prolongar artificialmente o processo de morte e o risco de sofrimento. 

Pacientes com convulsões ou estado epiléptico refratário apresentam um desafio particular para o manejo dos sintomas no fim da vida. O eletroencefalograma (EEG) pode ser útil para diferenciar convulsões mioclônicas de mioclonia pós-anóxica sem um correlato de EEG. Uma vez que o fenótipo de convulsão tenha sido caracterizado, o monitoramento de EEG pode ser descontinuado. 

Saiba mais: AHA: cuidados paliativos em cardiologia

Nos pacientes hospitalizados para tratamento de fim de vida, os medicamentos anticonvulsivantes devem ser continuados.  

Disfagia e falta de acesso enteral podem resultar em uma miríade de sintomas agravados entre pacientes com doenças neurológicas crônicas, devido à suspensão abruta de alguns medicamentos como por exemplo os agentes dopaminérgicos entre pacientes com doença de Parkinson, o que pode resultar em síndrome neuroléptica maligna. Sendo assim, precisamos sempre pensar em como substituí-los ou amenizar os sintomas da sua suspensão.  

Cuidados de luto para familiares 

Cuidadores, familiares e amigos de pacientes que morrem na UTI correm o risco de desenvolver luto complicado, sofrimento emocional e síndrome familiar de cuidados pós-intensivos (que consiste em depressão, ansiedade, transtorno de estresse agudo, luto complicado e transtorno de estresse pós-traumático). Os fatores que podem levar a esses resultados ruins de luto na UTI incluem o seguinte: comunicação ruim, falta de envolvimento na tomada de decisões, ausência no momento da morte, percepção de gerenciamento inadequado de sintomas e cuidados de fim de vida ruins e sensação de falta de apoio.  

Cuidados de luto para profissionais de saúde 

Profissionais de saúde na UTI frequentemente lidam com desfechos ruins e morte de seus pacientes, o que os coloca em risco de sofrimento psicológico como sentimentos de luto não resolvidos, esgotamento e fadiga de compaixão. 

O cuidado do luto para profissionais pode consistir em uma combinação de estratégias de autocuidado (crenças espirituais, apoio familiar ou conexões sociais, desenvolver uma atitude positiva, nutrir conexões pessoais, reconhecer a própria singularidade, realizar autorreflexão, estabelecer limites, passar tempo com a família e amigos, fazer exercícios, dormir o suficiente e orar) e ainda realizar sessões de debriefing da equipe, que consiste em uma reflexão sobre o curso do hospital, identificação do que correu bem, discussão de preocupações ou perguntas e identificação de coisas pelas quais a equipe é grata.

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Referências bibliográficas

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