Durante o Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva (CBMI 2025), os professores Ary Serpa, Vanessa Lanziotti, Cintia Johnston e Bruno Besen conduziram uma discussão instigante sobre como transformar a medicina baseada em evidências em decisões práticas e individualizadas à beira do leito.

Introdução
A prática da medicina intensiva exige muito mais do que conhecer resultados de ensaios clínicos. É essencial compreender a metodologia dos estudos, reconhecer a qualidade da evidência, avaliar o impacto real dos desfechos e ponderar a aplicabilidade ao paciente específico.
A integração entre evidência científica, experiência clínica e valores do paciente constitui o verdadeiro núcleo da medicina baseada em evidências. Saber quando e como aplicar o que foi publicado é tão importante quanto conhecer o artigo.
Como avaliar se a evidência se aplica a beira leito
A leitura crítica começa pela identificação do tipo de estudo e do nível de evidência. Ensaios clínicos randomizados bem conduzidos e meta-análises de alta qualidade costumam oferecer maior força de recomendação, mas nem sempre garantem aplicabilidade.
Avaliar se os pacientes do estudo se assemelham aos atendidos na prática diária é fundamental para julgar a validade externa. Observar o desfecho primário e a relevância clínica dos resultados ajuda a diferenciar impacto estatístico de benefício real. Reconhecer vieses, limitações metodológicas e conflitos de interesse também é parte essencial da análise. Por fim, integrar os achados à experiência da equipe e ao contexto institucional permite decisões mais seguras e personalizadas.
Limitações e desafios
- Resultados divergentes entre estudos sobre a mesma intervenção.
- Meta-análises baseadas em ensaios pequenos ou heterogêneos, que podem gerar conclusões frágeis.
- Dificuldade cultural e institucional em traduzir o conhecimento científico para a prática cotidiana.
- Falta de tempo e estrutura nas unidades para discussão crítica de evidências recentes.
Mensagens práticas
- Nem toda evidência deve ser aplicada automaticamente. Analise desenho, população estudada e validade externa antes de extrapolar resultados.
- Priorize desfechos clinicamente relevantes, que impactem mortalidade, tempo de ventilação mecânica ou função orgânica, e não apenas marcadores substitutos.
- Combine evidência com contexto: o melhor tratamento é aquele que é eficaz, disponível e factível para o seu paciente.
- Valorize a experiência da equipe e a comunicação multiprofissional para discutir condutas baseadas em evidência.
- Estimular uma cultura de discussão crítica, rounds de evidências e atualização constante é o caminho para levar a ciência da publicação até o leito do paciente.
*Escrito por Cintia Johnston e Yuri Albuquerque.
Autoria

Yuri Albuquerque
Doutorando em Ciências Médicas pela Universidade de São Paulo (USP) • Residência em Medicina Intensiva pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) • Residência em Clínica Médica ano complementar (R3) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) • Residência em Clínica Médica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) • Médico intensivista rotina do hospital Samaritano Paulista • Título de Especialista em ECMO pela Extracorporeal Life Support Organization (ELSO) • Título de Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB)
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.