Nos últimos anos, houve aumento da conscientização sobre o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA), e o crescimento de sua incidência em alguns subgrupos, como em adultos jovens e no sexo feminino.1 A maior atenção dada a essa condição permanente e potencialmente grave corrobora a necessidade de que sejam indicados tratamentos consistentes,2 de preferência ainda nos primeiros anos de vida,3 por serem fundamentais para promover o desenvolvimento desses pacientes e melhor adaptação à vida cotidiana.4 Atualmente, a Análise do Comportamento Aplicada, mais conhecida como ABA, é a terapia baseada em evidências mais amplamente aceita como tratamento para crianças com autismo.2
Afinal, o que é a Análise do Comportamento Aplicada, a famosa “ABA”?
Quando falamos sobre Análise do Comportamento Aplicada, estamos falando de um conjunto de práticas terapêuticas baseadas no paradigma de que a interação entre um sujeito e seu ambiente determina os seus comportamentos e a sua aprendizagem. Por isso, o modelo da ABA busca promover mudanças práticas e progressivas do comportamento por meio de mudanças no entorno do paciente. Em um tratamento ABA, o terapeuta:
- Identifica, em colaboração com o paciente e seus familiares, comportamentos inadaptativos e define metas viáveis para o desenvolvimento de comportamentos alternativos funcionalmente equivalentes;
- passa a modificar o ambiente para facilitar o surgimento e treinamento dos novos objetivos;
- programa prioritariamente esquemas de reforçamento positivo em direção à meta de comportamento, até que haja sua generalização, isto é, que a pessoa consiga exibi-lo em diversos ambientes e contextos.5
Por meio desses processos, as terapias ABA conseguem atuar não só na redução de comportamentos interferente, mas também na aquisição e manutenção de novas habilidades1 essenciais de aprendizagem, socialização, linguagem e independência funcional.5 Em pacientes com TEA, esse ganho é extremamente relevante para aumentar as oportunidades de aprendizado do paciente e melhorar a compreensão dos familiares sobre os comportamentos do paciente.3 O tempo necessário de tratamento varia a depender das necessidades de cada pessoa e família, podendo se estender por meses, anos ou por toda a vida.5
Por que escolher uma abordagem ABA?
As terapias baseadas em ABA são reconhecidas como uma intervenção com amplo respaldo científico para crianças com autismo e consideradas o padrão-ouro de intervenção terapêutica nesta população.1,2 Metanálises demonstraram que essa modalidade terapêutica é eficaz no desenvolvimento da linguagem receptiva, de habilidades cognitivas, do funcionamento intelectual, do comportamento adaptativo, na comunicação, vida diária e socialização.4,6 Um estudo recente, inclusive, mostrou que a efetividade dessas terapias se mantém promissora mesmo quando administradas por meio dos pais, e não diretamente por terapeutas.2 A ABA se destaca por permitir um monitoramento mais objetivo, com metas individualizadas e mensuráveis. Além disso, fomenta a exploração ampla de comportamentos-alvo aplicados a diversos contextos e necessidades.5
As diferentes abordagens ABA?
Intervenção Focal:
De acordo com as diretrizes da CASP e BACB, uma intervenção focal em ABA refere-se a um plano terapêutico dirigido a um número limitado de alvos comportamentais ou habilidades específicas — por exemplo, reduzir autolesão ou ensinar uma habilidade de comunicação particular — com intensidade moderada (tipicamente entre cerca de 10 a 25 horas por semana), e por um período mais limitado.
Intervenção Abrangente:
Em contraste, uma intervenção abrangente (comprehensive) visa um leque mais amplo de domínios de desenvolvimento — comunicação, socialização, comportamentos adaptativos, acadêmicos, bem como comportamentos-alvo problemáticos — em uma estrutura altamente intensiva (às vezes 30 a 40 horas por semana ou mais) e com duração prolongada, para promover mudanças funcionais de longo prazo.
A escolha entre focal ou abrangente deve basear-se na avaliação individualizada de necessidades, no nível de atuação da pessoa, no potencial de progresso e no contexto, reconhecendo sempre que a terapia deve ser dirigida por um analista comportamental certificado (BCBA) e ajustada com base em dados de monitoramento contínuo.5
Quando indicar uma abordagem ABA?
Uma vez feito o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista, deve-se avaliar qual o impacto das dificuldades daquela criança e comportamentos interferentes sobre a vida diária. Essa avaliação deve ser ampla e cuidadosa, e envolver não só comportamentos interferentes e aspectos de comunicação social, mas também aspectos de rotina, como alimentação, sono e autonomia. A ABA deve ser considerada quando esse prejuízo for significativo em algumas das seguintes áreas:7,8
- comunicação e linguagem;
- interação social;
- comportamentos interferentes;
- déficits adaptativos (como dificuldades com atividades do dia a dia, a exemplo de alimentação, higiene, sono, rotina escolar).
Deve-se atentar para a idade da criança – quanto mais cedo, melhor, supostamente devido à maior plasticidade neuronal, favorecendo melhores resultados.3 É importante também investigar e tratar comorbidades que possam influenciar o progresso terapêutico, como déficits sensório-motores, epilepsia, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade e transtornos do sono.3,8
Ainda, a ABA pode ser aplicada para o treinamento e capacitação de familiares e educadores, visando consistência e generalização dos aprendizados no cotidiano da criança.5
Como saber se o seu paciente está se beneficiando de uma abordagem ABA?
Alguns indicadores ajudam a mensurar o sucesso e a necessidade de continuidade da abordagem, tais como:5
- adesão familiar e frequência nas sessões: pode indicar o quão ajustado o tratamento está às necessidades e prioridades da família;
- aumento da frequência de comportamentos adaptativos e redução dos interferentes;
- ampliação da autonomia, a partir da aquisição de habilidades preconizadas como foco do tratamento, como linguagem, socialização, comportamento adaptativo, que podem ser mensuradas objetivamente por meio de instrumentos validados para cada domínio funcional;
- redução do estresse familiar;
- melhora na qualidade de vida e maior inserção na comunidade.
Tratamentos ABA efetivos levam a mudanças comportamentais significativas, duradouras e generalizáveis para os contextos fora da sessão. Além disso, essas mudanças devem gerar maior autonomia ao paciente e aumentar oportunidades de aprendizado para a criança e seus cuidadores.5
Autoria
Julia Campos
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