Em uma matéria anterior (parte 1), sintetizamos uma publicação recente do European Journal of Pediatrics sobre o tema ultrassonografia (USG) à beira-leito (point-of-care ultrasound – POCUS) em neonatologia e pediatria. No presente texto, segue a abordagem da USG de abdome inferior (intestino, cavidade peritoneal e vasos sanguíneos abdominais) e da USG renal e vesical.
Abdome inferior (intestinos, cavidade peritoneal e vasos sanguíneos abdominais)
É dividido em 4 quadrantes: superior direito, inferior direito, superior esquerdo e inferior esquerdo. A avaliação de cada quadrante deve ser realizada com ultrassonografia 2D e Doppler colorido (CD) em cortes sagitais e axiais (preferencialmente usando varredura).
- Transdutor recomendado: idealmente devem ser usados transdutores lineares com a maior frequência possível. Os transdutores convexos proporcionam uma visão melhor ou mais ampliada. De modo geral, frequências mais altas são melhores para avaliação intestinal (recém-nascidos [RN]: 14–20 MHz; crianças: 8–10 MHz), mas depende da idade e da posição do segmento intestinal a ser avaliado;
- Posição do paciente: supina. Manobras posicionais, como alteração para decúbito lateral direito ou esquerdo, podem ser úteis;
- Preparo do paciente: opcional em emergências. O intestino é mais facilmente avaliado após alimentação e quando há menos ar:
- RN: o melhor momento para avaliação é após o nascimento (intestino cheio de líquido e mecônio, menos ar);
- Íleo meconial: Enema salino auxilia a visualização do cólon e pode ser usado como tratamento.
- Indicações:
- Abdome agudo (exemplo: trauma);
- Diarreia sanguinolenta;
- Doenças inflamatórias intestinais;
- Intussuscepção ou volvo;
- Lactentes graves ou com suspeita de isquemia intestinal;
- Sangramento nas fezes ou retal;
- Suspeita de obstrução intestinal com torção e comprometimento do fluxo sanguíneo.
Condições patológicas frequentes | Achados no POCUS |
Atenuação da parede intestinal |
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Ausência de perfusão intestinal |
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Ausência de peristaltismo |
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Coleções líquidas focais |
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Espessamento da parede intestinal |
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Gás intraperitoneal livre |
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Gás na veia porta |
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Hiperecogenicidade da parede intestinal |
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Intestino dilatado com conteúdo anecoico |
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Perfusão aumentada |
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Pneumatose intestinal |
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Rins e bexiga
Rins
- Transdutor recomendado: convexo. Linear em recém-nascidos e lactentes;
- Indicações: oligúria/anúria;
- Protocolo: Posicionar o transdutor nos quadrantes superiores direito e esquerdo e no plano sagital, na linha axilar posterior, com o marcador do transdutor orientado em direção ao crânio para avaliação dos rins direito e esquerdo. Devido à localização retroperitoneal dos rins, o transdutor deve ser direcionado posteriormente em comparação à avaliação do fígado e do baço. Em geral, o rim esquerdo está mais elevado e mais posterior que o direito. Deve-se ajustar o ganho para que o cálice renal apareça preto (anecoico). É importante lembrar que o rim é dividido em uma camada cortical externa com uma borda de tecido e colunas de tecido cortical (hiperecogênicas) que descem entre as pirâmides medulares (anecoicas);
- Achados no POCUS: No contexto de oligúria/anúria e dor em flanco, a dilatação do trato urinário pode ser observada na presença ou não de obstrução, auxiliando no diagnóstico de diversas condições.
Bexiga
- Transdutor recomendado: convexo. Linear em recém-nascidos e lactentes;
- Indicações: oligúria/anúria, trauma, visualização de sonda vesical;
- Protocolo: inclina-se o transdutor nos sentidos anterior-posterior e lateral. O ganho no campo distante deve ser corrigido, pois o reforço acústico posterior através da bexiga pode dificultar a visualização de líquido livre atrás dela. Ajusta-se a profundidade para centralizar a bexiga na tela;
- Cálculo do volume vesical: devem ser medidos a altura da bexiga no plano longitudinal e o comprimento e a largura no plano transversal. Fórmula muito usada na pediatria: comprimento × largura × altura × 0,53 (fator de correção para o formato da bexiga pediátrica) – muitos aparelhos de USG, no entanto, permitem a estimativa automatizada desse volume;
- Achados no POCUS: em pacientes com sonda vesical obstruída ou mal posicionada, a bexiga está distendida com líquido mesmo com o cateter no lugar. Em pacientes vítimas de trauma abdominal contuso, pode ser identificado líquido livre ao redor da bexiga.
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