A diarreia aguda infantil permanece como um problema significativo de saúde pública global, sendo uma das principais causas de morbimortalidade em crianças menores de cinco anos, especialmente em países em desenvolvimento, como o Brasil, apesar dos avanços nas condições de saneamento básico, hidratação oral e no manejo nutricional.1
O impacto se estende além da fase aguda, com episódios repetidos podendo levar à desnutrição e comprometimento do desenvolvimento infantil.2 Nesse cenário, a busca por estratégias terapêuticas complementares que possam reduzir a duração e a gravidade da diarreia, acelerando a recuperação e minimizando as complicações, é de suma importância.2
Os simbióticos, que combinam microrganismos vivos (probióticos) e substratos que os alimentam (prebióticos), surgem como uma abordagem promissora na modulação da microbiota intestinal, oferecendo um novo olhar para o suporte à recuperação da diarreia aguda infantil.3
O objetivo deste artigo é revisar as evidências clínicas atuais sobre o uso de simbióticos no manejo da diarreia aguda infantil, com foco em novas abordagens terapêuticas e suas implicações para a prática pediátrica.

Evidências até o momento
A diarreia aguda é frequentemente caracterizada por um desequilíbrio da microbiota intestinal, ou disbiose, que contribui para a alteração da função de barreira intestinal e prolonga o quadro diarreico.4
Os simbióticos são definidos como uma mistura de microrganismos vivos (probióticos) e substratos que são seletivamente utilizados por microrganismos hospedeiros (prebióticos), conferindo um benefício à saúde do hospedeiro.3 Seu mecanismo de ação envolve a restauração do equilíbrio microbiano, a produção de ácidos graxos de cadeia curta que nutrem os enterócitos, o fortalecimento da barreira intestinal, a modulação da resposta imune e a competição com patógenos.5,6
As diretrizes atuais de manejo da diarreia aguda infantil enfatizam a terapia de reidratação oral (TRO) e a realimentação precoce como pilares do tratamento.7,8 No entanto, novas terapias adjuvantes vêm sendo amplamente estudadas e publicadas pela Sociedade Europeia de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (ESPGHAN), especialmente no que se refere às recomendações sobre o uso de probióticos e simbióticos. Diversos estudos estão em andamento com o objetivo de avaliar o impacto dessas substâncias — incluindo probióticos, prebióticos e simbióticos — na redução da duração dos episódios de diarreia.9,10,11
Novas terapêuticas
Apesar das ressalvas das diretrizes sobre a especificidade das cepas e a necessidade de mais estudos para simbióticos, a pesquisa continua a explorar combinações específicas que demonstram potencial terapêutico.
A influência da disbiose da microbiota no início da vida é cada vez mais reconhecida como um fator de risco para o desenvolvimento de diversas doenças crônicas na vida adulta. Proteger o desenvolvimento normal do microbioma durante essa janela crítica pode representar uma estratégia valiosa de saúde pública.12
Nesse contexto, as Bifidobactérias probióticas são candidatas promissoras para recém-nascidos e lactentes, dada a dominância natural desse gênero na microbiota inicial e a observação de que a redução dos níveis de Bifidobactérias está associada a doenças como diarreia.12 A Bifidobacterium lactis tem sido identificada como uma das espécies mais abundantes de Bifidobacterium no cólon humano, com sua capacidade de produzir altos níveis de acetato in vitro, que pode mediar alguns de seus efeitos competitivos e benéficos, contribuindo para a proteção da integridade morfológica e função do revestimento intestinal, modulação das respostas imunológicas e competição com patógenos bacterianos.5,6,12 A inulina, um prebiótico do tipo frutanos, tem seu potencial prebiótico bem estabelecido e pode atuar sinergicamente com probióticos.13 Uma associação específica de Bifidobacterium lactis B94 com inulina tem sido explorada em ensaios clínicos para a diarreia aguda infantil.
Estudos pré-clínicos sugerem que a B. lactis B94 exerce seus efeitos benéficos protegendo a integridade morfológica e a função do revestimento intestinal, modulando as respostas imunológicas e potencialmente competindo com patógenos bacterianos.12 Em um estudo com crianças diagnosticadas com gastroenterite induzida por rotavírus (5 meses a 5 anos de idade), a administração do simbiótico B94 + inulina como adjuvante aos tratamentos padrão resultou em uma resolução significativamente mais rápida da diarreia, com uma média de três dias no grupo simbiótico em comparação com sete dias no grupo controle.14 Outro estudo avaliou o efeito de B94 (5 × 10¹⁰ UFC) mais inulina (900 mg), administrados diariamente por cinco dias, em crianças de 2 meses a 5 anos com diarreia infecciosa aguda. O simbiótico reduziu a duração da diarreia em 31 horas em comparação ao placebo (3,9 ± 1,2 dias versus 5,2 ± 1,3 dias; p < 0,001). A redução foi ainda mais pronunciada no subgrupo diagnosticado com rotavírus e quando o simbiótico foi iniciado nas primeiras 24 horas do início da diarreia.15
Embora a ESPGHAN ainda não tenha formulado uma recomendação específica para essa combinação, as evidências iniciais indicam um papel promissor para essa nova opção terapêutica.
Considerando a importância da modulação da microbiota intestinal no manejo da diarreia aguda infantil, a associação de Bifidobacterium lactis B94 e inulina surge como um suplemento alimentar simbiótico de interesse. Sua formulação combina um probiótico (Bifidobacterium lactis B94) com um prebiótico (inulina), visando otimizar a saúde intestinal e apoiar a recuperação de quadros diarreicos. Os estudos clínicos iniciais demonstraram a capacidade dessa combinação em reduzir a duração e a severidade da diarreia, em particular na gastroenterite por rotavírus e quando administrada precocemente.14,15 Um suplemento alimentar contendo Bifidobacterium lactis B94 e inulina pode ser disponibilizado em sachês, oferecendo flexibilidade para a prescrição pediátrica.
Mensagem prática para o pediatra
A diarreia aguda infantil, embora muitas vezes autolimitada, requer atenção para evitar complicações. Enquanto a hidratação e o zinco permanecem como pilares fundamentais do tratamento, a integração de simbióticos pode oferecer um benefício adicional.
A evidência para a associação de Bifidobacterium lactis B94 e inulina sugere sua eficácia na redução da duração da diarreia em crianças, particularmente em casos de gastroenterite por rotavírus e quando a intervenção é precoce. Ao considerar o uso de suplementos alimentares simbióticos, é crucial que o pediatra opte por produtos com evidências científicas robustas que comprovem a eficácia da combinação e das cepas específicas.
A atenção às diretrizes e a consideração de novas evidências podem otimizar o manejo da diarreia aguda infantil, contribuindo para uma recuperação mais rápida e um melhor desfecho para o paciente.
Autoria

Larissa Pires Marquite da Silva
Graduada em Medicina pela UNIGRANRIO ⦁ Residência Médica em Pediatria pelo Hospital Geral de Nova Iguaçu ⦁ Título de Especialista em Neonatologia pela Sociedade Brasileira de Pediatria ⦁ Pós-Graduação em Medicina Intensiva Pediátrica e Neonatal pela Faculdade Redentor ⦁ Atualmente é Coordenadora do Serviço de Pediatria da Santa Casa de Barra Mansa ⦁ Tem experiência em Terapia Intensiva Neonatal e Pediátrica e Pediatria.
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