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Pediatria21 novembro 2025

PERINATO 2025 - Tratamento da sepse neonatal

O tratamento da sepse neonatal (SN) foi discutido na palestra “Abordagem da Sepse Neonatal” e foi um dos grandes destaques do congresso.

A palestra “Abordagem da Sepse Neonatal”, da Dra. Rosana Maria Rangel dos Santos (RJ), foi um grande destaque do 27° Congresso Brasileiro de Perinatologia (PERINATO 2025), realizado no Rio de Janeiro. Com relação ao tratamento da sepse neonatal (SN), a palestrante, que é infectologista pediátrica, trouxe informações muito relevantes, sumarizadas abaixo. 

Antibiótico (ATB) empírico de curta duração para possível SN precoce (SNP) em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) 

Para ilustrar este tópico, a Dra. Rosana apresentou o estudo Short-course empiric antibiotic therapy  for possible early-onset sepsis in the NICU (Sanchéz et al., 2023). Trata-se de uma revisão retrospectiva de recém-nascidos (RN) avaliados para possível SNP em 6 UTIN entre dezembro de 2018 e julho de 2019. Entre 414 RN avaliados para SNP, 196 (47%) receberam um ciclo de 24 horas de ATB para descartar sepse, enquanto 218 (53%) foram tratados com um ciclo de 48 horas. O grupo com suspeita de SNP apresentou, após 24 horas, menor probabilidade de reinício da antibioticoterapia e não diferiu nos demais desfechos de segurança predefinidos. Dessa forma, o estudo concluiu que a antibioticoterapia para suspeita de SNP pode ser interrompida com segurança em 24 horas.  

Veja também: Risco de sepse neonatal precoce em bebês nascidos de parto de baixo risco

Timeout 

  • Os ATB são os medicamentos mais prescritos em UTIN;  
  • A exposição prolongada aos ATB em RN pré-termos associa-se à candidíase invasiva, comprometimento do neurodesenvolvimento, displasia broncopulmonar, enterocolite necrosante, retinopatia da prematuridade, sepse tardia e óbito, assim como ao surgimento de organismos multirresistentes; 
  • É importante ressaltar que cada dia adicional de ATB aumenta o risco de desfechos adversos em RN com ≤ 32 semanas de idade gestacional ou peso ao nascer ≤ 1500 g, após o controle da gravidade inicial da doença; 
  • Em RN termo, o uso prolongado de ATB tem sido associado ao início tardio da amamentação, obesidade, sibilância recorrente, distúrbios gastrointestinais, assim como autismo. Entre todos os RN, existe preocupação com a potencial toxicidade, como perda auditiva e disfunção renal. 

Antibioticoterapia empírica 

Sepse precoce (origem materna): ≤ 48 h 

  • Ampicilina ou Penicilina: Streptococcus do grupo B (ou agalactiae);
  • Ampicilina: Listeria monocytogenes;
  • Gentamicina: Enterobactérias gram-negativas (E. coli, etc.). 

Tempo de tratamento de infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) neonatal precoce:  

  • Sepse clínica: 5 a 7 dias;
  • Infecção primária de corrente sanguínea (IPCS) com agente isolado: 7 a 10 dias;
  • Pneumonia sem agente isolado: 5 a 7 dias;
  • Meningite por Gram-positivo: 14 dias;
  • Meningite por Gram-negativo: 21 dias;
  • Ventriculite: 4 semanas;
  • Infecção osteoarticular: 4 semanas. 

A palestrante usou uma forma bastante didática de compreender os desafios do stewardship antimicrobiano: imaginar que a UTIN funciona como o cérebro da Riley, do filme Divertida Mente, em que diferentes emoções representam atitudes clínicas que influenciam diretamente o uso de ATB (assim como no filme, equilíbrio e diálogo entre essas “emoções” são fundamentais para garantir decisões mais racionais e seguras):  

  • Raiva: surge quando há prescrição de ATB sem indicação adequada, movida pela ansiedade diante da incerteza diagnóstica; 
  • Tristeza: aparece ao perceber dispositivos invasivos mantidos sem necessidade, aumentando riscos e prolongando exposições desnecessárias; 
  • Tédio: simboliza a repetição de coletas de culturas quando já existem amostras em andamento, desperdiçando recursos e confundindo interpretações; 
  • Inveja: aparece quando se observa queda no consumo de ATB em outras unidades enquanto ainda lutamos para avançar internamente; 
  • Alegria: comemora o descalonamento responsável, guiado por resultados de cultura e critérios clínicos bem estabelecidos.  

Sepse neonatal tardia 

Quando se fala em tratamento de SN tardia, direcionado às infecções nosocomiais, o uso de antibiograma cumulativo baseado na epidemiologia prevalente e o padrão de resistência de cada hospital também deve ser utilizado. A associação oxacilina e amicacina é recomendada como primeira opção, devido à baixa indução de resistência, alta sensibilidade de gram-negativos à amicacina e baixo custo.  

O uso de cefalosporinas de terceira geração deve ser feito com cuidado, reservando essa classe de ATB principalmente para cobertura do sistema nervoso central, já que sua utilização predispõe à colonização e infecções por enterobactérias multirresistentes. 

A administração de vancomicina no esquema empírico poderá ser justificada somente em unidades onde o MRSA está entre os principais agentes de infecções da corrente sanguínea (ICS) por Staphylococcus aureus resistente à meticilina/oxacilina. 

Por fim, em ambientes com alta prevalência de ICS por Staphylococcus coagulase-negativa, mesmo que resistente à oxacilina, não é indicado o uso empírico de vancomicina, considerando que estas infecções são de baixa morbidade/mortalidade, e que permite tempo de troca com segurança quando este agente é isolado em hemoculturas e considerado como infectante. 

Conclusão

A Dra. Rosana mostrou que o tratamento da SN exige muito mais do que esquemas adequados de ATB, mas também demanda um amplo entendimento dos riscos associados ao seu uso prolongado, atenção rigorosa aos critérios diagnósticos e incorporação madura dos princípios de stewardship em UTIN. Achei muito produtiva a discussão sobre curtos ciclos empíricos, a necessidade de reavaliação estruturada e a ênfase nos impactos adversos da exposição antimicrobiana, pois essas questões chamam a atenção para a importância do equilíbrio. Além disso, foi bastante interessante a metáfora com as “emoções” do filme Divertida Mente: a palestrante reforçou, de forma lúdica, que o cuidado neonatal de qualidade nasce justamente de um “estado da arte” entre cuidado e comunicação interdisciplinar, elementos indispensáveis para enfrentar a complexidade da SN, zelando pela segurança e a singularidade de cada bebê.  

Confira os destaques do PERINATO 2025!

Autoria

Foto de Roberta Esteves Vieira de Castro

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

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