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Pediatria21 novembro 2025

PERINATO 2025 - Diagnóstico da sepse neonatal

A sepse representa uma das grandes causas de mortalidade global e foi declarada como uma prioridade pela OMS. A maior incidência está em recém-nascidos.

A sepse neonatal (SN) foi bastante discutida no 27° Congresso Brasileiro de Perinatologia (PERINATO 2025), realizado no Rio de Janeiro, de 19 a 22 de novembro. A Dra. Rosana Maria Rangel dos Santos (RJ), infectologista pediátrica, ministrou a palestra “Abordagem da Sepse Neonatal”, cujas mensagens principais encontram-se sintetizadas a seguir. 

Impacto global 

A sepse representa uma das grandes causas de mortalidade global e foi declarada como uma prioridade pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A maior incidência entre todos os grupos etários ocorre em recém-nascidos (RN), com uma estimativa de três milhões de bebês afetados em todo o mundo (22/1.000 nascidos-vivos), com uma mortalidade de 11–19% e culminando em deficiências neurológicas permanentes. Além disso, é inversamente proporcional ao peso de nascimento e à idade gestacional (IG) do RN. Entretanto, é difícil padronizar dados internacionais na ausência de critérios unificados para a SN. 

Veja também: Sepse neonatal precoce: papel do sangue do cordão umbilical

Definição 

A definição do consenso moveu-se do conceito de síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SRIS), que fez parte da definição de sepse nos últimos 20 anos. É importante destacar que os critérios para definir infecção e sepse são essenciais na população neonatal para limitar o diagnóstico excessivo, mas eles não são parte das definições do Sepsis-3 para adultos. Aliás, o Sepsis-3 é baseado somente em desfechos de curto prazo, mas, no RN, a integração de preditores de deficiências em longo prazo é essencial. Os critérios para disfunção orgânica, de acordo com a IG e o período pós-natal, precisam ser definidos por meio de revisões sistemáticas e estudos retrospectivos e validados em estudos prospectivos. 

O termo SN é utilizado para caracterizar uma condição sistêmica de origem bacteriana, viral ou fúngica associada a alterações hemodinâmicas e outras manifestações clínicas, resultando em morbidade e mortalidade significativas. Apesar de anos de experiência clínica no cuidado de RN com sepse suspeita ou confirmada, ainda há muitos desafios, incluindo a ausência de uma definição consensual de SN. A definição de sepse, tradicionalmente, inclui o isolamento de um patógeno em um fluido corporal normalmente estéril, como sangue ou líquido cefalorraquidiano (LCR). Todavia, como as características clínicas da sepse podem ser induzidas por citocinas pró-inflamatórias potentes, o termo SIRS também tem sido usado para descrever a SN. 

Classificação 

Infecções relacionadas à assistência à saúde em neonatologia: 

  • Transplacentária (infecção congênita); 
  • Infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) em neonatologia: 
    • IRAS precoce ≤ 48h; 
    • IRAS tardia > 48h. 

Fatores de risco para sepse neonatal precoce 

  • Trabalho de parto antes de 37 semanas de IG; 
  • Ruptura de membranas por tempo igual ou maior a 18 horas; 
  • Colonização por estreptococo do grupo B em gestante sem antibioticoterapia profilática intraparto, quando indicada (rastreamento entre 36 e 38 semanas de IG); 
  • Infecção intra-amniótica;
  • Febre materna nas 48 horas que antecedem o parto; 
  • Cerclagem na gestante; 
  • Procedimentos de medicina fetal nas últimas 72 horas antes do parto ou nascimento; 
  • Infecção materna do trato urinário sem tratamento ou em tratamento há menos de 72 horas. 

Diagnóstico clínico 

  • Instabilidade térmica: a temperatura do RN pode estar normal, elevada ou diminuída. A hipotermia é mais frequente nos RN prematuros (RNPT) e a hipertermia, nos RN a termo (RNT); 
  • Dificuldade respiratória: manifestação mais frequente, presente em 90% dos casos (desde taquipneia até insuficiência respiratória aguda grave); 
  • Apneia: difere da apneia da prematuridade por ser acompanhada de outros sinais clínicos; 
  • Manifestações do sistema nervoso central (SNC): convulsões, hipoatividade, hipotonia, irritabilidade e letargia. 
  • Manifestações gastrointestinais: ocorrem em 35% a 40% dos casos: diarreia, distensão abdominal, hepatomegalia, recusa alimentar, resíduos gástricos, vômitos; 
  • Instabilidade hemodinâmica: além de taquicardia e hipotensão, o choque pode se manifestar com extremidades frias, letargia, má perfusão periférica, palidez cutânea e redução do débito urinário. Ocorre principalmente na sepse por estreptococo do grupo B. 

Diagnóstico laboratorial 

Os exames mais frequentemente usados na triagem infecciosa do RN são hemograma completo e Proteína-C-Reativa (PCR). 

  • Hemograma completo: diversos fatores clínicos podem afetar a contagem total e diferencial dos leucócitos, incluindo IG ao nascer, sexo e tipo de parto. A depressão da medula óssea atribuída à pré-eclâmpsia ou à insuficiência placentária, assim como a resposta inflamatória associada à ruptura prematura de membranas, comumente resultam em valores anormais na ausência de infecção e podem permanecer alterados nas primeiras 72 horas de vida. As evidências disponíveis não apresentam correlação entre contagem total e diferencial de leucócitos e sepse precoce confirmada por cultura; 
  • PCR: auxilia, especialmente, na exclusão do diagnóstico de infecção bacteriana pelo elevado valor preditivo negativo (98%). Seu aumento ocorre entre 24 h após o início da infecção, atingindo o pico em 2 a 3 dias, e se mantém elevada até o controle da infecção e retorno ao valor normal com 5 a 10 dias de tratamento adequado 

Os antibióticos devem ser suspensos em 24/36/48 horas quando o diagnóstico de infecção for descartado, seguindo critérios de evolução clínica e de exames realizados para a triagem infecciosa (hemocultura, cultura de líquor, hemograma, PCR). Além disso, a continuidade do tratamento de SN precoce baseada em critérios clínicos associados a alterações de hemograma e PCR seriada, apesar de ainda muito utilizada nas unidades neonatais brasileiras, deve se tornar, paulatinamente, uma condição de exceção dentro do contexto das boas práticas do cuidado neonatal e uso racional de antibióticos. Para isso, a Dra. Rosana destacou que “é necessária uma boa integração e comunicação entre equipes, visando a liberação de resultados parciais em tempo oportuno para essa tomada de decisão”. 

Com relação ao LCR, a Dra. Rosana mostrou o seguinte fluxograma (https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/sepse-neonatal-precoce-e-a-abordagem-do-recem-nascido-de-risco-o-que-ha-de-novo/): 

  • Suspeita clínica de infecção: 
    • Realizar triagem infecciosa. 
    • Iniciar tratamento com antibióticos. 
    • Reavaliar em 36 a 48 horas. 
  • Culturas negativas + RN bem + Triagem negativa: 
    • Suspender antibioticoterapia em 36 a 48 horas. 
  • Culturas negativas + Quadro clínico sugestivo + Triagem alterada (Sepse clínica): 
    • Completar tratamento. 
    • Adequar antibiótico, se necessário. 
  • Culturas positivas: 
    • Completar tratamento.
    • Adequar antibiótico, se necessário. 

Para ilustrar o manejo do risco de infecção em RN com IG ≤ 34 semanas, a palestrante exibiu o fluxograma da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que pode ser encontrado neste link: https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/sepse-neonatal-precoce-e-a-abordagem-do-recem-nascido-de-risco-o-que-ha-de-novo/  

Conclusão

A Dra. Rosana mostrou que a SN continua sendo um problema complexo e multifatorial, cuja abordagem depende de definições claras, critérios diagnósticos bem estruturados e compreensão das particularidades fisiológicas do RN. O tema é muito desafiador, mesmo nos dias de hoje, considerando a heterogeneidade dos dados internacionais, a ausência de critérios unificados e a sobreposição entre sinais clínicos de sepse e manifestações próprias do período neonatal. Por isso, é essencial a utilização de fluxos consistentes de triagem, precisão na interpretação dos exames laboratoriais e integração efetiva entre equipes para melhorar a identificação precoce dos casos, minimizar as incertezas diagnósticas e fortalecer a vigilância epidemiológica na neonatologia. 

Confira os destaques do PERINATO 2025!

Autoria

Foto de Roberta Esteves Vieira de Castro

Roberta Esteves Vieira de Castro

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra

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