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Pediatria6 agosto 2025

Malformações pulmonares congênitas

Estudo analisou neonatos com malformações pulmonares congênitas, com foco em diagnóstico precoce, cirurgia neonatal e risco de malignidade
Por Vanessa Nascimento

As malformações pulmonares congênitas (MPC) representam um espectro raro de alterações no desenvolvimento normal dos pulmões no período fetal, incluindo malformações do parênquima pulmonar, vias aéreas e vasculares. 

O espectro de malformações inclui: malformação pulmonar congênita das vias aéreas (anteriormente denominada malformação adenomatóide/cística congênita das vias aéreas), sequestro broncopulmonar intra e extra lobar, hiperinsuflação lobar congênita (anteriormente denominado enfisema lobar congênito), cisto broncogênico, atresia brônquica congênita e lesões híbridas. 

O prognóstico dos pacientes com malformações pulmonares ainda permanece incerto em grande parte dos casos devido ao amplo espectro de patologias, que causam diferentes graus de sintomatologia, com ou sem necessidade de intervenção cirúrgica, e a duração variável do seguimento nos centros de referência. 

O diagnóstico das MPC apresentou um aumento significativo nas últimas décadas devido a maior disponibilidade dos exames de imagem pré-natais, principalmente a ultrassonografia fetal, exame de escolha durante a gestação. 

O avanço do diagnóstico pré-natal possibilita o melhor acompanhamento durante o período fetal e a avaliação da necessidade de intervenção intraútero, assim como o planejamento multidisciplinar perinatal e pós-natal. 

Apesar da melhoria do diagnóstico e seguimento pré-natal desses pacientes, ainda há, até hoje, controvérsias em relação a abordagem dos pacientes no período pós-natal, principalmente os assintomáticos. 

Nos casos assintomáticos, há controvérsia em relação a uma abordagem cirúrgica preventiva e uma conduta mais conservadora, com observação rigorosa. A associação da malformação pulmonar com malignidade é o principal argumento utilizado por quem defende a abordagem cirúrgica nesses casos. 

Já a abordagem dos pacientes sintomáticos apresenta um consenso maior entre os especialistas, no entanto, o manejo neonatal imediato e o momento ideal para a abordagem cirúrgica ainda apresentam divergências. 

Um estudo publicado em fevereiro de 2025 por um centro de referência britânico, que é uma unidade de referência quaternária para suspeita de malformações pulmonares congênitas, representa uma das maiores coortes de neonatos com este diagnóstico operados nas primeiras 4 semanas de vida. 

Malformações pulmonares congênitas

Métodos 

Foi realizado um estudo retrospectivo, contemplando o período de 1995-2023, com 228 neonatos (< 30 dias de vida) nascidos com malformação pulmonar congênita. Desses 228 casos, 49 pacientes (21,5%) foram submetidos a cirurgia no período neonatal. 

Foram coletados e analisados dados demográficos, clínicos, radiológicos, intervenções pré-natais, técnica cirúrgica, tempo operatório, complicações pós-operatórias, laudo histopatológico das lesões, seguimento dos pacientes e o índice de oxigenação. A coleta dos dados em um único centro com padronização e protocolo cirúrgico definido, assim como a brevidade entre diagnóstico e cirurgia tornou a análise homogênea, sendo este um fator positivo neste estudo. 

Veja também: Malformação Adenomatoide Cística (MAC)

Resultados 

Os principais achados pré-natais do estudo foram: 91,8% dos casos foram diagnosticados no período pré-natal, sendo necessária intervenção fetal em 36,7% dos pacientes (mais comum em lesões que apresentavam desvio mediastinal, sendo 89% dos casos submetidos a intervenção). A indicação para intervenção pré-natal foi baseada em diversos fatores além do desvio mediastinal, tais como risco de hipoplasia pulmonar/hidropsia, lesão com presença de componente cístico grande e de crescimento progressivo e lesão com um grande vaso nutridor. 

O desvio mediastinal foi evidenciado em 61% dos casos, o polidrâmnio em 22% e a hidropsia fetal em 6%. A administração de corticoide para as gestantes ocorreu em 30% dos casos. 

Em relação à lateralidade, 59% das lesões foram do lado esquerdo e não houve lesão bilateral. 

Os pacientes submetidos a abordagem cirúrgica apresentavam uma mediana de 5 dias de vida. Dos 49 pacientes, 33 eram do sexo masculino e 24 foram submetidos a cirurgia de emergência. 

As indicações cirúrgicas consistiram em desconforto respiratório, necessidade de ventilação ou lesões volumosas com desvio do mediastino. 

A mortalidade foi de 8,2%, sendo os 4 casos submetidos a cirurgia emergencial, com fatores como prematuridade e baixo peso associados. 

As complicações pós-operatórias ocorreram em 18,3% dos casos, dentre elas pneumotórax, infecção de ferida operatória e pneumonia aspirativa. 

Em relação ao tipo de malformação pulmonar, a malformação pulmonar congênita do tipo 1 foi predominante (28 casos). Outros tipos também foram encontrados, tais como malformação pulmonar congênita tipo 2, hiperinsuflação lobar congênita, cisto broncogênico e sequestro broncopulmonar. 

A presença de malignidade (adenocarcinoma mucinoso) ocorreu em 12% dos casos, sendo todos em malformação congênita pulmonar do tipo 1, com 5 pacientes apresentando mutação KRAS. Desses casos, 80% apresentavam componente sólido no exame de imagem (tomografia computadorizada). 

A mediana de seguimento dos pacientes foi de 6 anos.  Dos pacientes acompanhados, 35% desenvolveram deformidades torácicas (pectus, escoliose, assimetria), porém sem necessidade de cirurgia corretiva. Oitenta e quatro por cento dos pacientes manteve tolerância ao exercício sem restrições. 

Discussão 

A análise dos resultados deste estudo nos mostra que a taxa de malignidade nos casos de malformação congênita do tipo 1 é expressiva, que intervenções pré-natais mostraram ser eficazes nos pacientes com risco de hidropsia e que a cirurgia emergencial está associada a piores desfechos. 

Além disso, o valor da tomografia computadorizada como preditor de malignidade é limitado, pois o componente sólido é um alerta a ser considerado, porém não é definitivo, já que os casos benignos também apresentaram esse achado. 

Em relação à evolução funcional pulmonar após o procedimento cirúrgico (lobectomia), esta foi considerada excelente, reforçando a segurança da abordagem cirúrgica precoce. 

O estudo conclui que 1 em cada 5 neonatos com malformação pulmonar congênita requer cirurgia precoce. Além disso, o risco de malignidade em malformações congênitas pulmonares do tipo 1 deve ser considerado na decisão cirúrgica, inclusive em casos assintomáticos. 

A associação entre a gravidade ao nascimento e a mortalidade ratifica a importância dos centros de referência que são preparados para o manejo imediato nesses casos. 

Apesar da morbidade mais elevada, o prognóstico respiratório dos pacientes é considerado muito bom, geralmente. 

Mensagem prática 

Sendo assim, diante de um estudo que consiste em uma das maiores coortes já publicadas sobre neonatos submetidos a cirurgia no período neonatal, apesar das limitações quanto à análise retrospectiva dos dados, ele fornece informações importantes sobre o manejo dos pacientes sintomáticos e mais críticos nessa faixa etária. 

O relato do prognóstico respiratório é animador, porém é importante ressaltar que os pacientes não foram submetidos a testes formais de função pulmonar, apenas a avaliações clínicas. Esse dado deve ser levado em consideração ao avaliarmos as consequências das intervenções, visto que este é um fator muito importante para a tomada de decisão e manejo dos pacientes, visando o resultado de longo prazo. 

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Referências bibliográficas

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