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Pediatria28 abril 2025

Impactação fecal em crianças: revisão sistemática e análise das definições

Estudo teve por objetivo identificar como a impactação fecal é definida nos estudos clínicos randomizados envolvendo crianças de 0 a 18 anos com constipação funcional
Por Jôbert Neves

A impactação fecal é uma complicação comum da constipação funcional em pediatria, condição esta que afeta a qualidade de vida das crianças e suas famílias, além de gerar altos custos ao sistema de saúde. Apesar de sua relevância clínica e prognóstica, a literatura carece de uma definição universalmente aceita e clara para a impactação fecal em crianças. A ausência dessa uniformidade dificulta a comparação de estudos, o manejo do cuidado e o avanço das diretrizes clínicas. Nesse contexto, por essa lacuna, um grupo de estudiosos realizou uma revisão sistemática e metanarrativa para identificar como a impactação fecal é definida nos estudos clínicos randomizados envolvendo crianças de 0 a 18 anos com constipação funcional, com o objetivo de traçar um norte para melhor compreensão das definições.  

A revisão seguiu protocolos registrados no PROSPERO e utilizou bases como CENTRAL, MEDLINE, Embase, WHO ICTR e ClinicalTrials.gov até junho de 2024. Foram incluídos estudos randomizados que investigassem crianças com constipação funcional, excluindo artigos focados apenas em adultos, revisões, opiniões e editoriais. Dos 6211 estudos inicialmente identificados, 76 foram incluídos na análise final. A extração de dados focou em identificar definições explícitas e implícitas de impactação fecal, métodos de avaliação clínica utilizados e outros critérios diagnósticos. Dentre os resultados encontrados, os seguintes ganham destaque, veja:  

Definições:

  • Apenas 7 estudos apresentaram uma definição explícita de impactação fecal; destes, 3 referenciaram o consenso PACCT de 2005; 
  • 45 estudos apresentaram definições implícitas, derivadas de critérios de inclusão/exclusão em estudos de constipação; 
  • 24 estudos não apresentaram definição.

Métodos de avaliação:

  • A avaliação clínica foi o método mais comum:
  • 5 estudos utilizaram apenas exame abdominal; 
  • 15 estudos utilizaram apenas exame retal digital; 
  • 24 estudos utilizaram ambos; 
  • 7 estudos mencionaram o uso de radiografia abdominal, isoladamente ou combinada a exame físico.

Aspectos críticos observados:

  • Quase nenhum estudo mencionou a duração dos sintomas como critério; 
  • A terminologia variava entre “impactação fecal”, “retenção fecal”, “fecaloma” e “massa fecal”, muitas vezes sem definição clara; 
  • O uso do exame retal foi frequente, embora controverso, especialmente em crianças maiores, onde diretrizes atuais recomendam cautela; 
  • O uso de radiografias não foi sistemático, refletindo a falta de consenso sobre sua necessidade.

Discussão 

A análise revelou uma alarmante falta de consenso nas definições de impactação fecal em crianças, apesar de sua importância clínica. A ausência de uma definição padrão dificulta a interpretação dos resultados de ensaios clínicos, o manejo adequado dos pacientes e o desenvolvimento de diretrizes baseadas em evidências. O estudo também destaca a necessidade urgente de uma definição clara, que aborde elementos essenciais como: 

  • Duração dos sintomas; 
  • Presença de fezes endurecidas; 
  • Métodos de avaliação clínica adequados (considerando os riscos do exame retal); 
  • Evitar o uso indiscriminado de radiografias.  

Os autores sugerem que a impactação fecal pode não ser reconhecida como uma entidade clínica isolada, mas sim como parte do espectro da constipação funcional, especialmente em casos resistentes ao tratamento. Ao final, propuseram uma definição inicial baseada em: 

“Período prolongado sem evacuação associado a fezes endurecidas (escala de Bristol 1 ou 2) e evidência clínica de fezes palpáveis, como massa abdominal.” 

Apesar disso, reconheceram que ainda são necessários estudos formais para alcançar um consenso internacional e multissetorial. 

Conclusão 

Com base nesta publicação, reforça-se a urgente necessidade de estabelecer uma definição padronizada de impactação fecal em crianças. Atualmente, há grande heterogeneidade nas definições utilizadas, o que compromete a comparação entre estudos, o diagnóstico preciso e a abordagem terapêutica adequada nessa população. A definição futura deve considerar o tempo de evolução, a consistência das fezes, e métodos de avaliação menos invasivos, respeitando as práticas pediátricas modernas. A presença de um consenso internacional é fundamental para avançar na padronização do cuidado, na pesquisa clínica e no desenvolvimento de protocolos terapêuticos mais eficazes para a constipação funcional pediátrica. 

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Referências bibliográficas

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