IACAPAP 2024: Abordagem geral da farmacoterapia em psiquiatria infantil
No segundo dia do congresso anual da International Association for Child and Adolescent Psychiatry and Allied Professions (IACAPAP), no Rio de Janeiro, o simpósio “Construindo juntos: a importância dos pais como aliados na resiliência mental dos filhos” trouxe à tona a relevância da participação dos pais no tratamento não farmacológico e farmacológica da criança com diagnóstico psiquiátrico. Uma das palestras foi ministrada pelo Dr. Thiago Gatti Pianca, de Porto Alegre/RS, que mostrou sua prática clínica e seus estudos com relação à abordagem geral da farmacoterapia em psiquiatria infantil.
De acordo com o palestrante, “as primeiras coisas devem vir primeiro”. Como assim?
- Uma avaliação psiquiátrica completa deve ser realizada – testes neuropsicológicos devem ser incluídos, se indicados;
- Hipóteses diagnósticas devem ser aventadas;
- Um exame físico completo deve ser realizado e exames complementares laboratoriais básicos devem ser solicitados;
- O paciente deve participar conforme seu nível de desenvolvimento;
- Os cuidadores e a escola devem ser ouvidos.
Um fluxograma mostrado pelo Dr. Thiago e preconizado pela IACAPAP inclui os seguintes pontos:
- A abordagem, inicialmente, deve sempre ser conduzida com uma avaliação diagnóstica compreensiva, com destaque para uma anamnese bastante detalhada;
- Se a criança apresenta uma condição psiquiátrica, como transtorno psicótico ou mania, por exemplo, e que exige tratamento medicamentoso, esta estratégia deve ser instituída prontamente. Caso contrário, devemos analisar se há alguma intervenção psicossocial que tem se mostrado efetiva nesta condição.
- Se sim: A intervenção psicossocial deve ser considerada e o paciente não necessita de farmacoterapia;
- Se não: Existe algum fármaco que tem se mostrado efetivo no manejo desta condição psiquiátrica?
- Se sim: O fármaco deve ser considerado, associado ou não à psicoterapia se apropriada;
- Se não: Outras alternativas devem ser exploradas.
O palestrante destacou que, quando um medicamento é indicado, devemos sempre estar cientes de que ele não deve ser considerado como último recurso. Alguns guidelines, como o NICE, por exemplo, sugerem um período de três meses de psicoterapia antes de serem prescritos antidepressivos, mas esta sugestão deve ser individualizada. Se um fármaco for iniciado tarde demais, as famílias podem desistir completamente do tratamento. Portanto, os médicos devem sempre considerar:
- Segurança e eficácia;
- Fatores preditivos de eficácia, se presentes;
- Necessidade de ação rápida;
- Preferências da família;
- Custos do tratamento.
Pontos que devem ser lembrados pelo profissional prescritor:
- Nós tratamos pessoas, não sintomas;
- Às vezes, tratar um sintoma alvo pode ter um grande custo. Por exemplo; tratar a síndrome de Tourette com antipsicóticos;
- Sempre mostrar para a família quais são as intervenções mais apropriadas, mesmo que não se tenha habilidade para isso (e encaminhar para quem tem).
O papel da família
O Dr. Thiago enfatizou muito o papel da família nos cuidados da criança com diagnóstico psiquiátrico. Segundo ele, espera-se que os pais e cuidadores tenham um papel ativo no planejamento terapêutico.
Na abordagem direta dos pais e cuidadores, benefícios esperados e efeitos adversos dos medicamentos (em curto e em longo prazo) devem ser sempre revistos com eles. É importante que o profissional use sempre uma linguagem apropriada de acordo com o nível de instrução da família para se certificar do entendimento da família com relação ao tratamento proposto para a criança. Avaliar as atitudes e a confiabilidade dos cuidadores é essencial.
Os pais devem ter postura positiva (ou pelo menos neutra) em relação ao uso de medicamentos. O prescritor deve construir uma aliança terapêutica com os pais, pois a eficácia real do tratamento é difícil de ser avaliada sem esta união.
IACAPAP 2024: Depressão na infância e na adolescência
Impressões das famílias com relação ao uso de medicamentos psiquiátricos por crianças
O palestrante citou o estudo de Lazaratou e colaboradores (2007) que analisou as atitudes de pais de crianças com transtornos psiquiátricos com relação aos psicotrópicos. Os resultados confirmam a necessidade de informar melhor os pais sobre a eficácia e a segurança destes fármacos, com o objetivo de melhorar a adesão ao tratamento psiquiátrico infantil:
- Um total de 140 pais respondeu um questionário de 20 itens no primeiro contato com um serviço ambulatorial de psiquiatria infantil;
- 71,2% responderam que geralmente são contra estes medicamentos;
- 60% acreditam que o uso prolongado de psicotrópicos pode causar danos à criança;
- 75% acreditam que, se as crianças começarem a usar psicotrópicos desde cedo, elas terão problemas maiores no futuro;
- 64,5% acham que, tomando medicamentos psicotrópicos desde cedo, as crianças teriam maior probabilidade de desenvolver dependência de drogas mais tarde.
O que o Dr. Thiago mostrou que os pais precisam entender (e os psiquiatras também)?
- Mesmo que os medicamentos ajudem com alguns sintomas determinados biologicamente, os problemas psicológicos e as perturbações nas relações familiares e sociais persistem. Portanto, controlar ou melhorar os sintomas biológicos geralmente não corrige imediatamente os problemas psicológicos ou interpessoais internalizados de longa data e os padrões ou comportamentos desadaptativos de longa data.
Mensagens finais do palestrante
- Os pais e cuidadores chegam ao tratamento com muitos preconceitos em relação à medicação, e é nossa função abordar todos eles de forma adequada;
- O tratamento com drogas psicoativas deve sempre fazer parte de um regime de tratamento mais abrangente e raramente é apropriado como única modalidade de tratamento para uma criança ou adolescente.
- Outros profissionais que trabalham com o paciente ou família devem ser recrutados para ajudar na aceitação e adesão à medicação.
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