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Pediatria5 novembro 2020

Feriados e risco de alergia alimentar a amendoim e tree-nuts em crianças canadenses

Os vilões na anafilaxia induzida por alergia alimentar são amendoim e tree-nuts, responsáveis pela maioria dos casos na América do Norte.

Até 9% das crianças no Canadá têm, pelo menos, uma alergia alimentar. Um estudo mostrou que a incidência de anafilaxia (principalmente induzida por alimentos) no departamento de emergência de dois hospitais infantis canadenses quase dobrou de 2012 a 2016. Os principais vilões na anafilaxia induzida por alimentos são amendoim e tree-nuts, responsáveis pela maioria dos casos fatais em toda a América do Norte. Tree-nuts consideradas alérgenos prioritários incluem amêndoas, castanhas-do-pará, castanha de caju, avelãs, nozes de macadâmia, noz pecan, pinhões, pistache e nozes. O amendoim faz parte da família das leguminosas e não é considerado uma noz.

A anafilaxia, que consiste em uma reação alérgica envolvendo, no mínimo, dois sistemas orgânicos ou resultando em hipotensão, é a manifestação mais grave da alergia alimentar, com importante risco de vida. Não se sabe se o risco de anafilaxia induzida por amendoim ou tree-nuts em crianças aumenta em épocas específicas do ano. Com o objetivo foi avaliar o risco de anafilaxia induzida por esses dois tipos de alimentos durante certos feriados culturais em crianças canadenses, pesquisadores do Montreal Children’s Hospital of the McGill University Health Centre (MCH-MUHC) conduziram o estudo Risk of peanut- and tree-nut–induced anaphylaxis during Halloween, Easter and other cultural holidays in Canadian children, publicado em setembro no jornal CMAJ.

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Alergia a amendoim e tree-nuts é responsável por grande parte de internações por anafilaxia.

Metodologia

Em 2011, os pesquisadores Leung e equipe elaboraram um grande registro para recrutamento de pacientes com anafilaxia que se apresentaram a departamentos de emergência pediátrica em quatro províncias canadenses: Quebec, Ontario, Newfoundland and Labrador e British Columbia. O objetivo desse registro era coletar dados sobre as frequências, gatilhos e manejo de anafilaxia nessas diferentes províncias canadenses.

Foram incluídos dados do período de 15 de abril de 2011 a 31 de janeiro de 2020. Os pesquisadores recrutaram pacientes com menos de 18 anos de idade que apresentaram anafilaxia induzida por noz desconhecida, amendoim ou tree-nuts.

Foram avaliados o número médio de casos por dia e a razão de taxa de incidência (incidence rate ratio – IRR) de anafilaxia induzida por noz desconhecida, amendoim ou tree-nuts, que se apresentaram durante cada um dos seis feriados celebrados no Canadá (Halloween, Natal, Páscoa, Diwali, Ano Novo Chinês e Eid al-Adha) em relação ao resto do ano:

  • Halloween: 31 de outubro de cada ano;
  • Natal: 25 de dezembro de cada ano;
  • Páscoa: domingo de Páscoa ocidental;
  • Diwali: 13º dia do sétimo mês do calendário hindu;
  • Ano Novo Chinês: primeiro dia do primeiro mês do calendário chinês;
  • Eid al-Adha: 10º dia do último mês do calendário islâmico.

Cada categoria de feriado teve um período de 5 dias: o dia anterior ao feriado, o dia da celebração e os 3 dias seguintes. A expectativa era que o maior risco de exposição e reações seria durante este intervalo de tempo, uma vez que podem ocorrer reações devido ao consumo precoce e contínuo de alimentos associados aos feriados.

Os IRR e os intervalos de confiança (IC) de 95% foram estimados por meio de regressão de Poisson.

Resultados

Foram coletados dados de 1.390 casos pediátricos de anafilaxia. A mediana de idade foi de 5,4 anos, e 864 (62,2%) das crianças eram meninos.

Os pesquisadores observaram que, para a anafilaxia desencadeada por noz desconhecida durante o Halloween e a Páscoa, houve um aumento de cerca de 70% na contagem média diária em comparação com o resto do ano (IRR 1,66, IC 95% 1,13-2,43 e IRR 1,71, IC 95% 1,21 -2,42, respectivamente). A contagem média diária foi semelhante durante o Natal, Diwali, Ano Novo Chinês e Eid al-Adha em comparação com o resto do ano.

Para a anafilaxia desencadeada por amendoim, a contagem média diária de eventos aumentou 85% durante o Halloween em comparação com o resto do ano (IRR 1,86, IC 95% 1,12–3,11). Durante a Páscoa, houve um aumento de 60% em comparação com o resto do ano (IRR 1,57, IC 95% 0,94–2,63). Nenhuma variação na contagem média diária de eventos foi observada para os outros feriados1.

Para anafilaxia desencadeada por tree-nuts, nenhuma variação na contagem média diária de eventos foi observada para qualquer feriado em comparação com o resto do ano.

A anafilaxia induzida por noz desconhecida, amendoim ou tree-nuts foi mais provável em crianças com 6 anos ou mais do que em crianças menores.

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Conclusões

Os pesquisadores descreveram um risco maior de anafilaxia induzida por noz desconhecida e amendoim durante o Halloween e a Páscoa do que durante o resto do ano em crianças canadenses. Nenhum risco aumentado foi observado durante o Natal, Diwali, Ano Novo Chinês ou Eid al-Adha. Essa diferença na incidência de anafilaxia entre os feriados pode ser devido ao ambiente social em que cada feriado ocorre. No Halloween e na Páscoa, as crianças costumam receber doces e outras guloseimas de pessoas que podem não estar cientes de suas alergias. A ausência de tal associação no Natal pode ser porque o Natal é uma celebração mais íntima entre membros da família e amigos próximos, que estão mais vigilantes em relação à exposição a alérgenos. A rotulagem canadense também pode ser um fator, pois no Halloween e na Páscoa é comum a distribuição de embalagens individuais de doces e salgadinhos, que são isentos dos requisitos de listagem de ingredientes. A maioria das reações anafiláticas a tree-nuts, em contraste com reações a amendoins, ocorreu em crianças que, em princípio, não apresentavam alergia a esses alimentos, o que destaca a necessidade de vigilância em relação às primeiras exposições durante os feriados.

Os pesquisadores enfatizam que programas e estratégias educacionais que aumentem a vigilância entre famílias de crianças com alergia a amendoim ou tree-nuts e entre as pessoas que interagem com elas são necessários para tornar os feriados mais seguros para todas as crianças canadenses.

Observações:

  1. O coco e a noz-moscada não são considerados nozes para fins de rotulagem de alérgenos alimentares no Canadá e geralmente não são restritos à dieta de alguém alérgico a nozes.
  2. Em países desenvolvidos, os alimentos que mais comumente causam alergia são: amendoim, ovo, leite de vaca, soja, trigo e peixe, sendo estes responsáveis por 90% dos casos de alergia alimentar mediada por IgE. No Brasil, os dados sobre prevalência de alergia alimentar são escassos e limitados. Senna e colaboradores constataram que, em Belo Horizonte, mais de 86,6% dos casos de alergia alimentar são causados por leite de vaca e ovo e que amendoim, soja, peixe e trigo não foram causas frequentes de alergia alimentar. Esta diferença provavelmente ocorre devido aos diferentes hábitos alimentares da população brasileira. Todavia, sendo o Brasil um país de dimensões continentais e de hábitos alimentares distintos, os alimentos mais prevalentes como causadores de alergia alimentar podem ser variáveis de acordo com a região.

Referências bibliográficas:

  • Leung M, et al. Risk of peanut- and tree-nut-induced anaphylaxis during Halloween, Easter and other cultural holidays in Canadian children. CMAJ. 2020;192(38):E1084-E1092.
  • Food Allergy Canada. Tree nuts. 2020. Disponível em: https://foodallergycanada.ca/allergies/tree-nuts/ Acesso em: 30/10/2020
  • Senna SN, et al. Achados epidemiológicos de alergia alimentar em crianças brasileiras: análise de 234 testes de provocação duplo-cego placebo-controlado (TPDCPCs). Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(3):344-350.

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