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Um dos tópicos de grande destaque no EuroElso 2019 foi a mobilização precoce de pacientes submetidos à oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO). Durante o suporte com ECMO, os pacientes podem evoluir com relevante debilidade física devido ao longo período de sedação e imobilização no leito. A mobilização precoce de pacientes graves é cada vez mais reconhecida não apenas como segura e viável, mas também como um meio potencial de otimizar os resultados na unidade de terapia intensiva (UTI).
Com a rápida expansão do uso de suporte extracorpóreo de vida (ECLS) para insuficiência cardiorrespiratória grave, há um interesse crescente na aplicação de mobilização precoce a essa população. A deambulação durante a ECMO parecer ser bastante promissora, otimizando a recuperação neuromuscular após a doença crítica.
Estudos com amostras pequenas ou relatos de caso têm mostrado benefícios nos pacientes despertos e em reabilitação durante a ECMO, incluindo redução nos dias de ventilação mecânica (VM) pós-transplante, por exemplo, além de redução no tempo de permanência, tanto na UTI quanto no hospital. Uma abordagem multidisciplinar cuidadosa é essencial para o sucesso da reabilitação física e da deambulação nestes pacientes.
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Para que o paciente possa deambular em ECMO, ele precisa estar desperto, capaz de responder a simples comandos e responder a perguntas com respostas do tipo “sim” ou “não” (verbalmente ou com as mãos). O paciente também deve apresentar força muscular adequada determinada pelo fisioterapeuta e ser capaz de manter saturação de oxigênio e estabilidade hemodinâmica nas posições em pé e sentado. A equipe multidisciplinar, incluindo médicos, enfermeiros e fisioterapeutas precisa definir as metas a serem alcançadas por cada paciente. Essas metas incluem o número de dias caminhados e/ou o número de passos dados por dia. O pacientes e/ou seus familiares devem ser informados sobre a possibilidade de riscos durante a deambulação.
Cada programa de ECMO deve decidir sobre a via aérea mais segura para seus pacientes. As vantagens da traqueostomia em relação à intubação endotraqueal incluem a melhora do conforto do paciente com redução da sedação e redução do risco de deslocamento acidental da cânula durante a atividade. Há relatos da realização de traqueostomia à beira-leito em pacientes em ECMO. O suporte ventilatório deve ser individualizado. Como regra, se um paciente requer fração inspirada de oxigênio (FiO2) e/ou fluxo de gás (sweep gas flow) máximos, a deambulação deve ser postergada.
As cânulas de ECMO são geralmente colocadas em veias jugulares internas ou axilares. Cânulas em veia femoral possuem maior risco de deslocamento e de menor mobilidade pelo paciente. No entanto, há centros que mobilizam ativamente seus pacientes com ECMO venovenosa (VV) com canulação femoral-jugular. Canulações centrais não impedem a deambulação.
Para a deambulação de um paciente em ECMO podem ser necessários de 4 a 6 profissionais, cada um com sua função e de acordo com o protocolo instituído em cada instituição. Por exemplo, a enfermagem pode ser responsável por monitorar os sinais vitais e os cateteres. O fisioterapeuta pode ser o responsável por checar a ventilação e a via aérea (tubo ou traqueostomia).
Os especialistas em ECMO podem ser os responsáveis pelo aparelho e pela cânula. Os familiares podem auxiliar nesse processo, encorajando o paciente e ajudando com a cadeira de rodas. Outro membro da equipe também pode ser o comunicador direto com o paciente, conversando com ele para reduzir a sua ansiedade. Toda a equipe, o paciente e seus familiares devem concordar com o tempo estipulado para deambulação e as atividades propostas.
O equipamento necessário para deambulação do paciente em ECMO sugerido pela Extracorporeal Life Support Organization (ELSO) inclui:
- Console de ECMO com a bateria carregada, com clamps e bala de oxigênio;
- Equipamentos de deambulação;
- Cadeira de rodas;
- Equipamento para suporte do monitor cardiorrespiratório, oxigênio, drenos de tórax etc. Pode ser necessário um carrinho;
- Bolsa válvula-máscara;
- Ventilador de transporte, se necessário;
- Considerar aspirador de secreções portátil;
- Telefones móveis para solicitar assistência.
Antes que a deambulação seja iniciada, o paciente deve ser avaliado quanto à presença de distúrbios hidroeletrolíticos, trombose, sangramento, necessidade de volume intravascular excessivo, e outros sinais de alterações do quadro clínico. Qualquer sangramento ao redor do tubo endotraqueal ou da traqueostomia deve ser abordado antes da deambulação.
A mobilização precoce pode ser particularmente benéfica em pacientes que aguardam transplante cardíaco ou pulmonar, pois a manutenção do condicionamento físico pode ser um componente importante da candidatura ao transplante. No entanto, ao ser considerado o papel da mobilização precoce em pacientes com insuficiência cardíaca em ECLS, é importante reconhecer as limitações dos dados existentes, que consistem, em geral, em pequenas séries de casos ou estudos de coorte sem grupos comparativos, devido à experiência limitada com tal abordagem e a complexidade desses pacientes.
Futuros estudos randomizados prospectivos podem ajudar a esclarecer o papel da mobilização precoce em pacientes que recebem ECLS. Contudo, dada a natureza especializada dessa intervenção e o maior perfil de risco potencial na população com insuficiência cardíaca, comparados àqueles com insuficiência respiratória, pode haver limitação da aplicabilidade para estar estratégia nos pacientes submetidos a ECLS por indicações cardíacas. Quando possível, a extubação endotraqueal pode facilitar ainda mais a mobilização bem-sucedida.
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Referências:
- Abrams D, Garan AR, Brodie D. Awake and fully mobile patients on cardiac extracorporeal life support. Ann Cardiothorac Surg. 2019;8(1):44–53.
- ECMO Specialist Training Manual 4th edition, 2018.
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