A obesidade infantil representa um dos maiores desafios de saúde pública. Sendo assim, diante da crescente prevalência global, compreender as estratégias eficazes de tratamento torna-se urgente, especialmente na população pediátrica. Esse tópico foi discutido durante o Congresso Europeu de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátrica (ESPGHAN 2025), que está acontecendo na Finlândia.
Avanços em farmacoterapia: GLP-1 e novas opções
Nos últimos anos, medicamentos que atuam em vias centrais e gastrointestinais têm sido testados em faixas etárias pediátricas, com resultados promissores, veja os principais tópicos e evidências discutidas durante a sessão de obesidade no ESPGHAN 2025:
Liraglutida (GLP-1 diário)
- Estudo publicado no New England Journal of Medicine (2020) avaliou adolescentes de 12 a 17 anos com obesidade.
- Após 56 semanas, os participantes que utilizaram liraglutida apresentaram redução média do IMC de 4,6%, contra aumento de 0,6% no grupo placebo.
- 43% dos adolescentes tratados perderam ≥5% do IMC, comparado a 19% no grupo controle.
- Descontinuação do tratamento levou à recuperação do peso, evidenciando o papel crônico da terapia.
Semaglutida (GLP-1 semanal)
- Estudo STEP TEENS (2022), randomizado, com adolescentes entre 12 e 18 anos.
- Dose de 2,4 mg/semana resultou em redução média de 16,1% do IMC após 68 semanas, em comparação a 0,6% de redução com placebo.
- 73% dos adolescentes tratados perderam ≥5% do IMC, e 45% perderam ≥20%.
Houve melhora significativa em parâmetros metabólicos, incluindo:
-
- Redução da HbA1c,
- Redução de ALT,
- Melhorias no perfil lipídico (redução de LDL, VLDL, triglicérides e aumento de HDL).
Os principais efeitos adversos foram gastrointestinais (náusea, diarreia, constipação), geralmente leves a moderados.
Veja também: Obesidade infantil e agonistas do receptor GLP-1: um marco na terapia?
Tratamentos para obesidade monogênica
Para casos de obesidade grave de origem genética (ex.: mutações em LEPR, POMC ou MC4R), novas terapias direcionadas estão sendo usadas com sucesso:
- Setmelanotida (agonista do receptor de melanocortina 4 – MC4R):
- Estudos de fase 3 mostraram redução significativa do peso e do apetite em pacientes com POMC e deficiência do receptor de leptina.
- Melhor controle de comorbidades metabólicas.
- Tratamento aprovado em algumas agências regulatórias para obesidade monogênica.
Cirurgia bariátrica em adolescentes: Quando e como? Ainda existe espaço?
Embora rara, a cirurgia bariátrica tem sido utilizada em casos de obesidade grave e refratária, especialmente entre adolescentes:
- Estudos suecos com seguimento de 15 anos demonstram que a cirurgia pode:
- Reduzir o IMC de forma sustentada,
- Melhorar ou resolver comorbidades como diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia, esteatose hepática e apneia do sono.
- A cirurgia mais comum é o sleeve gástrico, embora possa causar refluxo severo e hipoglicemia reativa.
- Acompanhamento multidisciplinar de longo prazo é essencial, incluindo:
- Avaliação nutricional,
- Monitoramento ósseo e muscular,
- Apoio psicológico.
Conclusão e mensagem prática
Apesar dos desafios, os avanços científicos transformaram o panorama do tratamento da obesidade infantil. Intervenções familiares com foco em mudança do estilo de vida, novas farmacoterapias especialmente com agonistas de GLP-1 e, em casos selecionados, cirurgia metabólica, oferecem resultados clínicos relevantes e sustentáveis.
Ainda assim, o sucesso depende de uma abordagem individualizada e compassiva, com foco nos quatro pilares fundamentais:
- Alimentação saudável, com educação nutricional;
- Atividade física regular, adaptada à realidade da criança;
- Qualidade do sono, essencial para regulação hormonal;
- Saúde emocional e apoio psicológico, fundamentais para adesão e autoestima.
Obesidade não é uma falha de caráter, mas uma condição médica crônica e complexa. Tratar crianças e adolescentes com obesidade é investir na saúde do futuro com ciência, humanidade e compromisso. No Brasil, ainda existe uma grande barreira de custo para os tratamentos medicamentosos, além dos grandes desafios para o manejo multidisciplinar dos pacientes pediátricos com obesidade.
Confira os principais destaques do ESPGHAN 2025!
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