O delirium pós-operatório (DPO) é uma complicação frequente em cirurgias pediátricas, especialmente após neurocirurgias (NC), levando a piores desfechos e fatores como doenças neurológicas, ansiedade, dor e inflamação contribuem para seu desenvolvimento. A escetamina e a dexmedetomidina reduzem, de forma independente, a ansiedade, a dor e a inflamação; o uso combinado de ambos os fármacos pode potencializar esses efeitos. Um estudo chinês publicado no Drug Design, Development and Therapy avaliou se essa combinação diminui o DPO em pacientes neurocirúrgicos pediátricos.
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Metodologia
Os pesquisadores conduziram um ensaio prospectivo randomizado controlado (ECR), incluindo pacientes pediátricos (com idades entre 2 e 16 anos) que estavam programados para NC seletiva se a duração prevista da cirurgia fosse superior a 1 hora. Foram excluídos os pacientes que:
- Recusaram-se a participar;
- Não conseguiram concluir a avaliação do delirium devido a doença neurológica;
- Apresentavam comprometimento cognitivo grave que impediu a avaliação do delirium;
- Apresentavam comprometimento visual ou auditivo que impediu a avaliação do delirium;
- Apresentaram classificação da American Society of Anesthesiologists (ASA) igual a IV ou superior.
A randomização ocorreu da seguinte forma:
- Grupo escetamina-dex: Pacientes que receberam escetamina (0,5 mg/kg) e dexmedetomidina (0,5 μg/kg);
- Grupo controle: Pacientes que receberam solução salina normal como placebo na indução da anestesia.
O desfecho primário foi a incidência de DPO dentro dos primeiros cinco dias de pós-operatório (PO), avaliado duas vezes ao dia usando a escala Cornell Assessment of Pediatric Delirium (CAPD), considerando delirium quando a pontuação era igual ou superior a 10. Os desfechos secundários incluíram a incidência de DPO ao despertar, complicações não relacionadas a delirium dentro de 30 dias de PO, duração da internação hospitalar no PO e custo médico durante a hospitalização. A mudança da inflamação sistemática foi refletida pela Razão Neutrófilo-Linfócito.
Resultados
No período de 19 de julho de 2021 a 29 de março de 2023, 270 pacientes foram rastreados e 190 pacientes foram randomizados. Em cada grupo, três pacientes foram excluídos devido ao cancelamento da cirurgia e 92 foram analisados por intenção de tratar. Além disso, um paciente do grupo escetamina-dex e três pacientes do grupo controle foram excluídos da análise por protocolo devido à administração não planejada de dexmedetomidina. Não foi observado nenhum óbito nos 30 dias de PO. A mediana de idade dos pacientes incluídos, em meses, foi semelhante entre os dois grupos (63,0 vs. 70,0, P = 0,883).
Os pacientes do grupo escetamina-dex mostraram os seguintes resultados quando comparados ao grupo controle:
- Menos pacientes receberam sevoflurano (87,0% [80/92] vs 96,7% [89/92], P = 0,028);
- Menor incidência de DPO (análise de intenção de tratar: 22,8% [21/92] vs 38,0% [35/92], risco relativo [RR] = 0,600, intervalo de confiança de 95% (IC95%) 0,380–0,948, P = 0,025; análise por protocolo: 22,0% [20/91] vs 38,2% 34/89], RR = 0,575, IC95% 0,360–0,919, P = 0,018);
- Menor incidência de DPO ao despertar (20,7% [19/92] vs. 50,0% [46/92], RR = 0,413, IC 95% 0,263–0,648, P < 0,001);
- Menos custos médicos (P < 0,001);
- Não houve significância estatística na incidência de complicações não relacionadas ao DPO dentro de 30 dias de PO e na duração da internação hospitalar PO.
Foram comparáveis entre os dois grupos:
- As relações neutrófilos-linfócitos no primeiro e terceiro dia de PO;
- Desfechos de segurança, como bradicardia e hipotensão.
Conclusão
No momento, não há dados suficientes para descrever a prevalência de delirium em pacientes pediátricos submetidos à NC. No entanto, o estudo concluiu que a combinação de escetamina e dexmedetomidina pode reduzir significativamente o risco de DPO e delirium ao despertar nesses pacientes, o que pode beneficiar não somente os desfechos clínicos do paciente, como a redução dos custos médicos.
Autoria

Roberta Esteves Vieira de Castro
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
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