A cirurgia bariátrica é o tratamento mais eficaz para obesidade grave até o momento. Apesar do surgimento e evolução do tratamento medicamentoso para obesidade, a cirurgia continua como uma terapia já reconhecida por seus resultados ao longo dos anos, sobretudo em indivíduos que cumprem os critérios de indicação, como aqueles com IMC acima de 40 kg/m² ou acima de 35 kg/m² com comorbidades.
Sua indicação na adolescência, contudo, é tema de amplo debate. Evidências de estudos com adultos mostram que os benefícios podem ser maiores para aqueles indivíduos com poucas comorbidades ou pouco tempo de duração das mesmas. Um exemplo é o diabetes – quanto menor o tempo, menos complicações presentes e menor a HbA1c melhores são os resultados. Paradoxalmente, costumamos privilegiar indivíduos já com múltiplas comorbidades e muito tempo de diagnóstico como os maiores candidatos, considerando a cirurgia como “último caso”, erroneamente. Discute-se o mesmo raciocínio na adolescência, já que o tratamento da obesidade grave pode impactar em prevenção do surgimento de comorbidades e resolução precoce das que já estejam instaladas, ainda que se trate de um procedimento invasivo, com necessidade de reeducação e uso de vitaminas e suplementos ad-eternum.
Nesse contexto, o Teen Longitudinal Assessment of Bariatric Surgery (Teen-LABS) foi um estudo multicêntrico prospectivo que analisou os desfechos metabólicos e de peso em adolescentes com obesidade grave submetidos à cirurgia bariátrica.
A pesquisa começou em 2007, acompanhando 242 participantes desde então com o objetivo de analisar a eficácia da cirurgia bariátrica em adolescentes tanto em redução de peso como na remissão de condições metabólicas e segurança. Anteriormente foram apresentados dados de 3 anos da coorte, publicada em 2016 no New England Journal of Medicine (NEJM). Recentemente os autores trouxeram os dados de 10 anos de follow up dos pacientes. Como a cirurgia bariátrica é uma excelente opção de tratamento para obesidade, sobretudo em casos de IMC mais elevados e/ou presença de comorbidades, trazemos esta análise de 10 anos também publicada no NEJM para discussão.
Leia mais: Estudo compara resultados a longo prazo de diferentes técnicas de cirurgia bariátrica
Estudo anterior
O objetivo do estudo foi avaliar os efeitos de longo prazo da cirurgia bariátrica em adolescentes com obesidade grave (IMC ≥40 kg/m²), incluindo impacto no peso, remissão de doenças metabólicas e complicações associadas. Para isso, foi selecionada uma população composta por 242 adolescentes entre 13 e 19 anos, com idade média de 17 anos no momento da cirurgia. Destes, 75% eram mulheres; 72% brancos, sendo que os principais procedimentos realizados foram 67% bypass gástrico (67%) e gastrectomia vertical (28%).
Os adolescentes foram acompanhados em múltiplos intervalos (6 meses, 1, 2, 3 e 10 anos), com avaliações de peso, condições metabólicas (diabetes tipo 2, hipertensão, dislipidemia) e complicações nutricionais.
Resultados de três Anos (2016)
No primeiro estudo, publicado em 2016, os principais resultados foram os seguintes:
a) Perda de Peso: Redução média de IMC: 27% (bypass gástrico: 28%; gastrectomia vertical: 26%)
b) Remissão de Condições Metabólicas:
- Diabetes tipo 2: Remissão em 95%;
- Hipertensão: Normotensão em 74%;
- Dislipidemia: Normalização em 66%
c) Complicações Nutricionais e Cirúrgicas:
- Deficiência de ferro em 57%.
- Procedimentos abdominais adicionais em 13%, com maior incidência nos primeiros dois anos.
Esses achados posicionaram a cirurgia como uma estratégia eficaz para adolescentes com obesidade grave, mas destacaram a necessidade de suplementação nutricional rigorosa.
Estudo atual
O estudo atual traça um paralelo, trazendo os resultados de dez anos (2024) de seguimento, com resultados interessantes:
a) Redução Sustentada de Peso: De forma geral, a redução de peso foi sustentada ao longo do período, um dado muito importante, visto que a grande maioria dos demais tratamentos esbarra justamente na dificuldade em se manter o peso a longo prazo.
– Média geral: Redução de 20% no IMC (IC 95%: −22,9 a −17,1).
As trajetórias de peso variaram:
- Redução mínima: −7,1% (11% dos participantes).
- Redução máxima: −43,7% (18% dos participantes).
- Pacientes com maior perda inicial de peso (nos primeiros 6 meses) apresentaram melhores resultados sustentados ao longo da década (OR: 1,16; IC 95%: 1,11–1,21)
b) Desfechos Metabólicos:
- Diabetes tipo 2: Remissão em 55%
- Hipertensão arterial: Remissão em 57%.
- Dislipidemia: Normalização em 54%.
Ainda que não tenha sido um estudo controlado por um grupo com adultos, a taxa de remissão de diabetes nos estudos com a população adulta as taxas de remissão de diabetes costumam ser entre 12–18%, mostrando que a cirurgia parece ser altamente eficaz (se não mais eficaz) nesse quesito em adolescentes.
c) Complicações Nutricionais:
- Deficiências de ferro (65%), vitamina B12 (10%) e vitamina A (16%).
- Necessidade de suplementação contínua e monitoramento nutricional a longo prazo.
Quanto à necessidade de reoperações, houve uma taxa de 13% de procedimentos adicionais.
A CIRURGIA BARIÁTRICA PARECE SER EFICAZ AO LONGO DO TEMPO EM ADOLESCENTES
Os dados de 10 anos do Teen-LABS mostram que a cirurgia bariátrica em adolescentes demonstrou superioridade na remissão metabólica. Apesar de não ter sido realizada uma comparação direta, é provável que tenha sido inclusive superior em relação a adultos submetidos ao mesmo procedimento. A menor duração da obesidade grave e maior plasticidade metabólica em adolescentes pode explicar esses benefícios, na opinião dos autores do estudo.
Contudo, a alta prevalência de deficiências micronutricionais reforça a importância do acompanhamento contínuo por nutricionistas e clínicos para prevenir sequelas a longo prazo, o que pode ser também particularmente desafiador para adolescentes.
Conclusão e mensagem prática
Os resultados de 10 anos do Teen-LABS consolidam a cirurgia bariátrica como uma intervenção segura e eficaz para adolescentes com obesidade grave, proporcionando perda de peso sustentada e melhorias metabólicas significativas. No entanto, o manejo a longo prazo requer vigilância nutricional e suplementação rigorosa. Contudo, vale destacar o progresso recente na terapia farmacológica, se expandindo também para a faixa etária adolescente, como no caso da semaglutida (no estudo STEP teens).
As perspectivas futuras devem incluir uma análise comparativa entre as novas terapias medicamentosas (lembrando que a tirzepatida ainda não apresentou seus dados em adolescentes, mas deve o realizar em breve no estudo SURMOUNT-Adolescents, ainda em andamento), visto que a cirurgia também não é isenta de riscos e requer aderência a suplementações e outros cuidados.
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