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Pediatria24 abril 2025

Análise retrospectiva avalia o uso de quetiapina no manejo de delirium em crianças

Estudo avaliou a eficácia da quetiapina no tratamento do delirium em pacientes pediátricos gravemente enfermos e descreveu seu perfil de segurança

O delirium é uma complicação frequente em crianças em Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP), com uma prevalência estimada de 25% no contexto dos cuidados intensivos. Atualmente, as opções de medicamentos para sua abordagem farmacológica do delirium são restritas ao uso off-label de antipsicóticos típicos e atípicos. Entretanto, o benefício desses fármacos ainda é questionável. A quetiapina tem sido bastante prescrita na prática para o manejo do delirium refratário ou grave devido ao seu potencial para alívio da agitação, anormalidades do ciclo sono-vigília, e distúrbios comportamentais e perceptivos. Avaliar a eficácia da quetiapina no tratamento do delirium em pacientes pediátricos gravemente enfermos e descrever o seu perfil de segurança foram os objetivos de um estudo conduzido no Hassenfeld Children’s Hospital at NYU Langone, em Nova Iorque.  

criança na uti

Metodologia 

Os pesquisadores realizaram uma análise retrospectiva de prontuários médicos de pacientes internados no Hassenfeld Children’s Hospital at NYU Langone entre janeiro de 2019 e novembro de 2021. Foram incluídos pacientes com idade igual ou inferior a 18 anos que apresentaram resultado positivo para delirium através da escala Cornell Assessment of Pediatric Delirium (CAPD ≥ 9), receberam quetiapina por ≥ 48 horas e que estavam em pelo menos uma infusão contínua de benzodiazepínicos ou opioides no momento do início da antipsicótico.  

Os critérios de exclusão foram: uso de quetiapina para uma indicação diferente de delirium, pacientes que receberam qualquer antipsicótico concomitante ou apresentaram alguma condição que impedisse a avaliação do delirium (por exemplo, uso de bloqueadores neuromusculares em infusão contínua). É importante destacar que, durante a realização do estudo, não havia um protocolo institucional orientando o tratamento farmacológico do delirium. Dessa forma, a dosagem e o monitoramento da quetiapina ficaram a critério do médico prescritor. 

O estudo também avaliou a relação entre as doses de quetiapina e de medicamentos “deliriumgênicos”. 

Resultados 

A análise incluiu 37 pacientes que receberam quetiapina para o tratamento de delirium no período do estudo. Destes, 65% tinham atraso no desenvolvimento e 89% estavam em ventilação mecânica (VM) no início do estudo. Após 48 horas do início da dose mais alta de quetiapina, 57% dos pacientes ainda estavam em VM. 

Houve uma tendência decrescente na necessidade de sedação antes do início da quetiapina para 48 horas após a dose mais alta. O tempo médio para a dose mais alta de quetiapina foi de um dia, consistente com a literatura (em geral, os estudos falam de 24 a 72 horas após o início). A dose máxima mediana foi de 1 mg/kg/dia, e os pacientes não receberam doses noturnas mais elevadas para auxiliar na restauração do ciclo sono-vigília. 

Um total de 43% dos pacientes teve redução na necessidade de benzodiazepínicos e 68% apresentaram redução na necessidade de opioides. A mediana da pontuação CAPD no início do estudo foi de 17 e a mediana da pontuação CAPD 48 horas após a dose mais alta de quetiapina foi de 16.  

Embora nenhum paciente tenha desenvolvido arritmia, três apresentaram prolongamento do intervalo QTc (QTc ≥ 500). 

Veja também: RCT: Quetiapina x Haloperidol no delirium hiperativo

Conclusão 

Os resultados demonstraram uma redução significativa na dosagem de benzodiazepínicos e opioides após o início da quetiapina para o manejo farmacológico do delirium na UTIP do estudo. Os pesquisadores também destacaram que uma possível redução no escalonamento da dose de sedativos pode ter sido alcançada, impactando minimamente no intervalo QTc. Ao comparar com pesquisas prévias, Caballero e colaboradores ressaltam que doses mais altas de quetiapina podem ser necessárias para atingir uma redução clinicamente significativa de delirium demonstrada por meio dos escores de CAPD. No entanto, são necessários mais estudos para encontrar uma dose eficaz que possa ser prescrita de rotina.  

Comentários 

Acho o estudo muito interessante e inovador ao avaliar o antipsicótico atípico quetiapina para o tratamento farmacológico do delirium em crianças. No entanto, tenho algumas ponderações a fazer. De fato, o uso de antipsicóticos ainda é off-label. A fisiopatologia do delirium é extremamente complexa e há inúmeras teorias, mas nada ainda confirmado, e é justamente por isso que não temos um medicamento específico para o tratamento do delirium em si. O que sabemos é que há inúmeros fatores de risco e eles precisam ser abordados, isso faz parte do tratamento. Além disso, o que se recomenda atualmente é utilizar o antipsicótico como último recurso naquele paciente em que a identificação de fatores de risco e as medidas não farmacológicas já foram empregadas, sem sucesso, e o paciente se encontra em delirium hiperativo, agitado. O antipsicótico é um sintomático para a agitação do delirium, ele não trata o delirium. No delirium hipoativo, o uso de antipsicótico pode deprimir ainda mais o sensório. Dessa forma, observo como grande limitação ao estudo o fato de não terem sido diferenciados os subtipos motores.  

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Referências bibliográficas

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