Embora o aleitamento materno exclusivo (AME) seja recomendado durante os primeiros seis meses de vida e a amamentação (AM) contínua, até os dois anos, as taxas permanecem abaixo do ideal no mundo todo, sendo cada vez mais moldadas por fatores culturais e socioeconômicos. Infelizmente, diversas barreiras estruturais, sociais e políticas (como estigma social, discriminação no local de trabalho e marketing agressivo de fórmulas) dificultam as práticas de AM e AME. Apesar de haver inúmeros estudos acerca da intenção de amamentar, a motivação permanece pouco explorada, embora seja conhecido o impacto crítico nos desfechos da amamentação. Resumimos, a seguir, uma revisão publicada no Midwifery, cujo objetivo foi sintetizar evidências sobre fatores motivacionais, como obstétricos, psicológicos, sociais e demográficos, nos períodos pré-natal, pós-parto e de AM sustentada. Ademais, o estudo avalia a relevância desses fatores para intervenções e políticas eficazes de apoio e promoção da AM de forma global.

Metodologia
O estudo consistiu em uma revisão sistemática abrangendo pesquisas qualitativas e quantitativas. A busca de dados foi conduzida nas bases PubMed, Scopus e Web of Science, com escopo retrospectivo abrangendo as últimas três décadas. Foram incluídos estudos qualitativos e quantitativos sobre mães saudáveis, com idades entre 18 e 48 anos, com partos eutócicos sem complicações, e seus bebês saudáveis a termo. Foram analisados: intenção, planejamento, autoeficácia, conhecimento e/ou motivação para amamentar. Além disso, foram priorizados estudos que usaram ferramentas de coleta de dados quantitativos previamente validadas. Os critérios de exclusão foram: artigos de revisão, estudos que avaliaram a associação entre motivação para amamentar e doenças específicas, e estudos sobre relactação.
Resultados
Vinte e três estudos, publicados entre 2016 e 2023, com contextos socioculturais e perspectivas distintas, foram identificados e recuperados. A média de idade das mães incluídas nos artigos selecionados foi de 25,9 anos. A taxa de início da AM foi de 88,4%, em média. Às seis semanas, 34,4% praticavam AME e 80,3% fizeram qualquer tipo de AM, enquanto às 12 semanas esses números foram de 28,8% e 68,1%, respectivamente. As taxas de AME aos seis meses variaram entre 20% e 56% em grupos de intervenção e 20% e 30% em controles. A média de duração da AM foi 2,73 meses, inferior ao período recomendado de seis meses.
A decisão de amamentar “o máximo possível” e a experiência prévia foram associadas ao atendimento das expectativas de AM. Por outro lado, a idade materna mais avançada afetou negativamente o processo de AM: mães mais jovens tendem a ter maior motivação intrínseca (MI) em relação à AM, embora o sucesso não possa ser garantido. O nível materno de escolaridade também se mostrou relacionado à MI: mães com maior nível de escolaridade apresentaram maior motivação para iniciar a AM. Outro ponto observado foi que o apoio familiar e social, juntamente com políticas laborais favoráveis, estão estreitamente relacionados à MI, facilitando o AME por até seis meses em diversos contextos socioeconômicos.
Com relação à ME, observou-se que mães mais velhas optaram pela AM em tandem ou prolongada, foram motivadas pela praticidade e pelos benefícios para a saúde dos filhos e de si mesmas. A priori, este seria um tipo de ME, mas não completamente controlada, mas com um componente auto regulado próximo à motivação intrínseca.
Conclusão
Os pesquisadores concluíram que a motivação para o AM abrange um amplo espectro de variáveis agrupadas em duas categorias principais: MI e ME. A MI é impulsionada pela satisfação pessoal e felicidade própria; já a ME, o foco consiste nas necessidades emocionais e materiais e, embora seja mais controlada externamente, é possível que, aliada à ME, contribuam para o sucesso e a duração do AM. Eles destacam também que, em países de média e alta renda, os fatores associados à MI recebem particular importância e são considerados críticos para o sucesso e a duração do AM. Em contraste, em países de baixa renda, as prioridades diferem, como abordar práticas culturais favoráveis e desfavoráveis e a influência do marketing de substitutos.
Comentário
O artigo ressalta que a motivação pessoal, social e institucional para a prática do AM é variável conforme o contexto sociocultural. Todavia, depende do entendimento das peculiaridades de cada mãe.
Veja mais: Os 10 pilares do aleitamento materno
Autoria

Roberta Esteves Vieira de Castro
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
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