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Medicina de Família2 setembro 2024

PCDT da Dor Crônica: quais os principais pontos em relação ao diagnóstico?

A dor crônica representa um desafio significativo para os sistemas de saúde em todo o mundo, impactando negativamente a qualidade de vida de um grande contingente populacional.
Por Renato Bergallo

No Brasil, estudos indicam que a prevalência de dor crônica em adultos pode chegar a cerca de 40%, sendo a lombalgia a dor crônica mais comum. Nesse contexto, o Ministério da Saúde publicou recentemente o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Dor Crônica (PCDT) com o objetivo de orientar profissionais da saúde no diagnóstico, tratamento e monitoramento de pacientes com essa condição. Falaremos neste texto sobre os principais pontos trazidos pelo protocolo a respeito do diagnóstico da dor crônica. 

PCDT da Dor Crônica: quais os principais pontos em relação ao diagnóstico?

Imagem de freepik

Tipos de dor crônica 

O PCDT descreve os três principais tipos de dor: nociceptiva, neuropática e nociplástica. A dor nociceptiva, geralmente profunda e em peso, surge da ativação de nociceptores em tecidos lesionados, como em casos de osteoartrite ou tendinite. Já a dor neuropática resulta de lesões no sistema nervoso central ou periférico, caracterizando-se por sensações de queimação, formigamento ou choques, como na neuropatia diabética. Por fim, a dor nociplástica, como a da fibromialgia, envolve hipersensibilidade em tecidos sem lesões aparentes, manifestando-se como pressão, peso ou tensão. 

Leia também: Irrigação com solução fria intraoperatória pode reduzir a dor pós-ATJ?

Anamnese  

Na anamnese, as seguintes dimensões da dor devem ser investigadas:  

  • Duração: o PCDT define dor crônica como aquela que persiste por mais de três meses.
  • Localização: diagramas corporais podem ser utilizados para documentar a localização e a intensidade da dor. 
  • Histórico: traumatismos e cirurgias, ergonomia das atividades diárias (trabalho, atividades esportivas e lazer), uso de substâncias químicas, tratamentos anteriores, fatores psicossociais como estresse. 
  • Intensidade: é um indicador subjetivo, mas fundamental para avaliar o impacto da dor na vida do paciente e monitorar a eficácia do tratamento. Escalas de dor, como a Escala Visual Analógica (EVA) e escalas numéricas, podem ser utilizadas. 
  • Características: dor neuropática (queimação, choque, formigamento, “alfinetadas”), dor nociceptiva (profunda, em peso, pontada, aperto, latejamento, dor nociplástica (queimação, pressão, peso e tensão). Lembrar que a dor crônica frequentemente envolve uma interação complexa de mecanismos nociceptivos, neuropáticos e nociplásticos. 
  • Padrão: diferenciação entre dor mecânica (geralmente piora ao longo do dia com a atividade física e melhora com o repouso) e dor inflamatória (tipicamente mais intensa pela manhã, acompanhada de rigidez articular, podendo piorar novamente à noite). 
  • Periodicidade: identificar padrões específicos de aparecimento ou agravamento da dor ao longo do dia ou da noite. 
  • Fatores de melhora e piora: posição corporal, movimento, repouso, calor ou frio, medicações, fatores emocionais. 
  • Antecedentes pessoais: histórico de doenças, atividade física, hábitos alimentares, padrão de sono, uso de substâncias químicas, uso de medicamentos. 
  • Antecedentes familiares: especialmente importante em casos de doenças como fibromialgia, enxaqueca e osteoartrite. 
  • Sinais de alerta: febre, perda de peso inexplicável, sudorese noturna, histórico de câncer, sintomas neurológicos progressivos ou dor que piora progressivamente. 

Exame físico 

Para o exame físico, direcionado às necessidades de cada paciente e aos achados da anamnese e seguindo a rotina propedêutica tradicional, o PCDT recomenda a realização de: 

  • Inspeção: postura, marcha, alinhamento corporal, presença de deformidades, assimetrias, edema, alterações cutâneas. 
  • Palpação: presença de espasmos musculares, pontos-gatilho miofasciais, alterações de temperatura, crepitação articular, sinais de inflamação. 
  • Avaliação da Marcha: marcha normal, nas pontas dos pés e nos calcanhares, para identificar déficits motores, encurtamentos musculares, contraturas ou instabilidade articular. 
  • Outros testes: testes específicos de avaliação de amplitude de movimento articular, flexibilidade e força muscular, presença de sinais de compressão nervosa. 

O exame musculoesquelético deve buscar por assimetrias e deformidades e avaliar a marcha. Diferenças acima de 1 cm no comprimento dos membros inferiores devem ser investigadas. Deve-se observar sinais de inflamação articular como sinovite (dor à movimentação suave e passiva). Dor à movimentação ativa contra resistência sugere causa extra-articular. O exame neurológico deve avaliar a força muscular (graduada de 0 a 5), a sensibilidade (tátil, térmica, vibratória e dolorosa) e os reflexos (cutâneos superficiais, miotáticos e profundos). 

Saiba mais: Exercício vs. Medicamentos: qual é a melhor opção para osteoartrite? 

Questionários  

É importante complementar a anamnese e o exame físico com questionários específicos para avaliar o impacto da dor crônica na vida do paciente. Eles fornecem medidas objetivas que auxiliam o médico na tomada de decisões e no monitoramento da resposta aos tratamentos. Entre os questionários recomendados estão o Oswestry Disability Questionnaire (ODQ), específico para dor lombar, e o Roland Morris Disability Questionnaire (RMDQ), para dor lombar e outras condições (para avaliar incapacidade funcional); e o Medical Outcomes Study 36-Item Short-Form Health Survey (SF-36) e o World Health Organization Quality of Life Instrument (WHOQOL-100) (para avaliar qualidade de vida).  

Exames complementares  

O PCDT defende uma utilização criteriosa de exames complementares, que deve ser guiada pelos dados da anamnese, do exame físico e dos questionários.  

Os exames laboratoriais, como hemograma, VHS, PCR, glicemia, perfil lipídico, função renal e hepática, eletrólitos, dosagens hormonais e de vitaminas, podem ser importantes para investigar causas e fatores associados à dor crônica, como inflamações, infecções, doenças metabólicas, reumatológicas e deficiências nutricionais.  

A eletroneuromiografia é útil na avaliação da atividade elétrica de nervos e músculos, auxiliando no diagnóstico de neuropatias e doenças musculares.  

Os exames de imagem podem ser úteis para visualizar estruturas anatômicas e identificar alterações que podem estar relacionadas à dor:  

  • Radiografia simples: fraturas, artrites, desalinhamentos, deformidades ósseas, tumores, entre outros. Sugere-se o uso da radiografia anteroposterior e perfil em apoio bipodal para auxiliar no diagnóstico de osteoartrite de joelho e de quadril.
  • Ultrassonografia: avalia tecidos moles e auxilia no diagnóstico de afecções músculo-ligamentares, tendinopatias, tenossinovites, sequelas de rupturas musculares e pode auxiliar na detecção de doença inflamatória ativa. Não é recomendada para confirmação de diagnóstico ou tratamento da osteoartrite de quadril. 
  • Tomografia computadorizada: exame mais sensível que a radiografia na avaliação de ossos, especialmente em casos de fraturas complexas e tumores ósseos. 
  • Ressonância magnética (RM): um dos exames que melhor avalia estruturas ósseas e tecidos moles (encéfalo, medula espinal, articulações). Não se recomenda o uso de RM para a confirmação de diagnóstico ou monitoramento da osteoartrite de joelho e de quadril.
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Referências bibliográficas

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