Oferta de proteínas no paciente grave: o que devemos saber
Oferta proteica no paciente grave é um tópico importante nas discussões de terapia nutricional, e nas próximas linhas traremos alguns aspectos.
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O tema da oferta proteica no paciente grave é um tópico importante nas discussões de terapia nutricional, e nas próximas linhas traremos alguns aspectos para nossos leitores.
Alguns aspectos básicos devem ser lembrados, a priori. Devemos lembrar que a energia pode ser estocada mas função, não. Glicose e gordura são armazenados na forma de glicogênio e triglicerídeos; a proteína, porém, não pode ser estocada, mas tão somente desviada de função.
Na doença grave, aproximadamente 20% desse desvio é originado de proteínas viscerais (intestino, fígado, coração, pulmão) e 80% provém da musculatura esquelética. O esgotamento das reservas proteicas resulta em disfunção imune, desmame difícil, cicatrização difícil, reabilitação difícil. No que tange a reabilitação, fica óbvia a relação entre esta dificuldade e o consumo de massa magra observado na beira do leito.
O paradigma atual sugere que ofertas proteicas mais altas em até 50% das metas para indivíduos saudáveis parecem ser benéficas em pacientes graves. Esta noção firmou-se em estudos com end-points metabólicos e fisiológicos, mas não em estudos randomizados e controlados desenhados para testar essa hipótese.
Nos últimos anos, este paradigma tem sido posto à prova diante das conclusões de alguns autores de relevância como Todd Rice e Greet van den Berghe. Segundo esta tese, tais ofertas reduzidas de macronutrientes na primeira semana de doença grave estariam associadas a, no mínimo, não inferioridade em relação a estratégias de aporte aporte calórico pleno. É importante mencionar que esse conjunto de ensaios randomizados são muito heterogêneos, estudam apenas a primeira semana de doença grave, tem case-mixes muito variado e principalmente, todos oferecem proteína muito abaixo do preconizado. Assim, continuamos sem evidências de peso.
Entretanto, alguns estudos observacionais com menor número de pacientes têm trazido novas evidências que convergem para defesa da tese a favor da oferta proteica mais alta. Um estudo observacional com mais de 2 mil pacientes, multicêntrico e multinacional, mostrou que a mortalidade em 60 dias e o tempo de alta vivo foram comparados entre pacientes que receberam mais ou menos de 80% das necessidades proteicos e das necessidades calóricas. O risco de morte foi menor no grupo que recebeu > 80%, sem diferença em relação ao atendimento da meta proteica. O efeito da intervenção parece ser ainda mais nítido após 12 dias, o que nos pode ainda fazer pensar em um certo comportamento dose dependente.
Mais do autor: ‘7 medidas para otimização metabólica e nutricional no paciente cirúrgico’
Outro estudo realizado em pacientes pediátricos mostrou que o atendimento de metas proteicas mais elevadas foi especialmente benéfica justamente nos pacientes mais graves. A capacidade funcional, leia-se, força muscular, também parece experimentar ganhos mesmo no cenário do uso de nutrição parenteral em pacientes cirúrgicos.
Mas uma advertência: não basta ter elevados níveis séricos de aminoácidos circulantes. É necessário também vencer a resistência anabólica, e isto pode ser tingido de diferentes modos, mas principalmente através do exercício resistido e controle da resistência insulínica. O controle glicêmico em pacientes com resistência insulínica foi capaz de “positivar” o balanço nitrogenado de pacientes com grandes perdas nitrogenadas urinárias. Vamos lembrar que a insulina é o primeiro hormônio anabolizante e está envolvida na entrada de aminoácidos em células da mm. esquelética.
Por ora, vamos lembrar que as evidências disponíveis parecem situar em torno de 1.2g ptn/kg/d, o patamar proteico mínimo para os pacientes graves. Alguns desafios ainda se interpõem ao atendimento das metas: fórmulas enterais industrializadas nem sempre conseguem atingir o complexo proteico, o que torna necessário uso de módulos. Existem dúvidas sobre o tipo ideal de proteínas a ser utilizado, sem mencionar a dificuldade operacional de atendimento da infusão completa da programação nutrológica, comprometido por frequentes e injustificadas interrupções.
Este é o resumo da palestra apresentada na Jornada de Inverno da Sociedade de Terapia Intensiva do Estado do Rio de Janeiro, realizada em 1 de julho de 2017. Os slides e as referências podem ser obtidos na timeline de meu twitter, na data de 30 de junho.
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