Polineuropatia Amiloidótica Familiar: o que você precisa saber?
A Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF) é uma doença crônica, progressiva, de herança autossômica dominante. Saiba mais.
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A Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF) é uma doença crônica, progressiva, de herança autossômica dominante. Tem envolvimento multissistêmico grave. Se não tratada, tem sobrevida média estimada de 10 anos1.
Por que a doença acontece?
Há diferentes tipos de amiloidoses sistêmicas, dentre elas, podemos citar as amiloidoses hereditárias ligadas a proteínas precursoras que sofreram mutação, tais como a transtirretina (TTR)2.
A TTR é uma proteína predominantemente sintetizada no fígado (mas também no plexocoroide e retina), cuja função principal é o transporte da tiroxina e do retinol3,4.
Normalmente, a TTR apresenta uma conformação tetramérica. Porém, pode ocorrer uma desestabilização da sua estrutura, e consequentemente, uma dissociação em monômeros, seja por mutações (forma hereditária) ou outro mecanismo (forma senil)4.
Estes monômeros sofrem um enovelamento incorreto com formação de agregados amiloides que podem se depositar em diversos tecidos e causar a doença. É por esse motivo que se trata de uma patologia multissistêmica, com manifestações neurológicas, oftalmológicas, cardiovasculares, gastrointestinais e renais5.
É importante ressaltar que, apesar de ser uma doença autossômica dominante, a penetrância do gene pode ser incompleta, e por isso pode haver casos esporádicos na família6.
Como a PAF se manifesta?
A forma clássica é a forma de início precoce, que tem início por volta dos 30 anos de idade7.
O paciente inicialmente apresenta uma neuropatia de fibras finas com disautonomia. As manifestações mais comuns são parestesias, disestesias, com componente doloroso nos pés, além dos sintomas disautonômicos que são muito variáveis e frequentemente atribuídos a outras condições. São exemplos a hipotensão postural, impotência sexual, sensação de plenitude gástrica, diarreia e/ou constipação3.
Não se pode esquecer que na fase inicial a eletroneuromiografia (ENMG) é, em geral, normal, visto que esse exame, de forma convencional, não estuda as fibras finas. Conforme a doença avança e outras fibras são acometidas, a ENMG se altera. Portanto, é sempre necessário entender as limitações dos exames complementares e não pular etapas8.
Na forma tardia, o início dos sintomas ocorre após os 50 anos de idade, com padrão de polineuropatia sensitivo-motora. O paciente, desde o início, já apresenta comprometimento motor e das fibras sensitivas. Neste cenário, em geral, a ENMG já está alterada7.
Esses pacientes também apresentam algum grau de disautonomia, embora normalmente não seja pesquisada de forma objetiva, o que gera aumento de erros diagnósticos3.
A dica maior aqui é a abordagem ativa de sinais e sintomas de disautonomia, visto que na maioria das neuropatias periféricas, o componente autonômico não se manifesta tão precocemente e rapidamente como na PAF.4
Em relação aos diagnósticos diferenciais, destacam-se: polineuropatia inflamatória desmielinizante crônica (PIDC); estenose lombar; doença de Charcot-Marie-Tooth (CMT); neuropatia diabética; neuropatia etílico-carencial; vasculites; hanseníase9,10.
Como diagnosticar?
A biópsia de tecidos acometidos pode ser utilizada para a demonstração de depósitos amiloides. Os locais preferenciais para biópsia são a glândula salivar e o tecido adiposo subcutâneo abdominal, por serem menos invasivos. Mas também pode-se fazer dos nervos, coração, rim e trato gastrointestinal10,11.
A cintilografia com radiotraçadores ósseos também demonstra uma boa sensibilidade e especificidade para cardiomiopatia por ATTR, principalmente naqueles pacientes que não apresentam gamopatia monoclonal11.
A orientação é que seja feita uma biópsia minimamente invasiva na investigação inicial devido à penetrância variável das mutações da TTR. Mas é importante saber que uma biópsia negativa não exclui o diagnóstico de amiloidose ATTRv, pois os depósitos amiloides possuem distribuição multifocal.11
Além disso, tem sido utilizado, de forma mais frequente, os testes genéticos, que hoje estão mais facilmente disponíveis. Neste teste, é possível fazer o sequenciamento gênico da TTR e identificar as variantes patogênicas10,11.
Em resumo, quanto mais informações que reforcem o seu diagnóstico, melhor.
Tratamento da PAF no Brasil
Em relação ao tratamento, existem algumas estratégias terapêuticas, que agem tanto impedindo a produção da proteína TTR mutada quanto na estabilização desta proteína5.
O fígado, conforme dito anteriormente, é a fonte primária mais comum de produção da TTR. Portanto, o transplante hepático foi uma das primeiras opções terapêuticas, principalmente em pacientes jovens, com poucas manifestações clínicas da PAF.
Contudo, apresenta limitações por ser invasivo, associado a morbimortalidade perioperatória significativa, além dos efeitos adversos resultantes da imunossupressão prolongada13.
Ao longo dos últimos anos temos presenciado o surgimento de novas opções farmacológicas para o tratamento da PAF. A primeira delas foi o tafamidis meglumina, que se mostrou eficaz na estabilização da TTR e redução da progressão da doença14.
Além disso, ele também foi associado a uma melhora ou manutenção do status nutricional, que, durante os estudos do programa clínico, se mostrou um indicador importante de gravidade da doença15.
Atualmente, o tafamidis meglumina é a única opção farmacológica disponível no SUS, preconizado na dose de 20mg/dia (via oral). Seu uso é indicado nos pacientes em estágio inicial da PAF e não submetidos a transplante hepático9.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia preconiza o uso de tafamidis meglumina na dose de 80mg/dia para tratamento de amiloidose cardíaca associada à TTR. Este é o único fármaco, até o momento, que foi especificamente testado e aprovado neste cenário com evidência de aumento da sobrevida2,16.
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As terapias envolvendo silenciadores gênicos, incluindo RNA de interferência e oligonucleotídeos anti-sense diminuem os níveis circulantes de TTR e tem se mostrado efetivas em reduzir a progressão da polineuropatia amiloidótica associada à TTR17,18.
Mensagens práticas
- É importante conhecer a doença para que se desconfie desse diagnóstico diante de um paciente com clínica compatível.3
- O diagnóstico e o tratamento precoces possibilitam maior qualidade de vida e sobrevida dos pacientes. Atenção a sinais de disautonomia nas neuropatias periféricas!3,4
- O maior acesso aos exames diagnósticos, como por exemplo, os testes genéticos, têm favorecido a identificação de novos casos, reduzindo também a necessidade de testes mais invasivos10.
- Estamos em uma nova era para a PAF com o surgimento de mais estudos randomizados multicêntricos e novas possibilidades terapêuticas5.
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