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Neurologia30 abril 2022

IM/ACP 2022: demência – evidências e abordagens

A demência é uma síndrome clínica que apresenta um aumento na prevalência com o envelhecimento populacional. O tema foi destaque do IM 2022.

Por Danielle Calil

A demência é uma síndrome clínica que apresenta um aumento na sua prevalência com o envelhecimento populacional. É uma condição que ainda é pouco reconhecida por médicos clínicos em centros de atenção primária, sendo demonstrado em estudo de coorte que, entre os pacientes diagnosticados com demência, 40% dos casos foram reconhecidos por médicos clínicos.

Além disso, o impacto de casos de demência não diagnosticados repercute negativamente não apenas em termos sociais como também em termos de assistência à saúde. Em termos sociais, os indivíduos diagnosticados com demência, comparados àqueles que não foram diagnosticados, apresentavam menos exposição a situações de risco como direção de veículos, manejo próprio de medicamentos ou de contas financeiras e preparo de refeições.

Quanto à assistência em saúde, o grupo com diagnóstico adequado de demência apresentava menor tempo de internação hospitalar e menor mortalidade após internação em período de 30 dias em relação àqueles que não foram devidamente diagnosticados.

O tema foi destaque de uma sessão no Internal Medicine Meeting (IM 2022) do American College of Physicians. Confira as principais temáticas apresentadas.

mão de paciente idosa com demência

Definição de comprometimento cognitivo e seus espectros

Comprometimento cognitivo é um conceito definido por qualquer déficit, seja agudo ou crônico, que afete a função cognitiva cerebral.

Em casos de instalação aguda, essa disfunção costuma ser enquadrado como delirium.

  • Delirium: É uma falha em processos de atenção, consciência ou cognição. Costuma apresentar flutuação ao longo do dia. Ocorre como consequência fisiológica direta de uma condição médica geral. Em casos de instalação crônica, pode apresentar dois espectros clínicos diferentes: comprometimento cognitivo leve (CCL) ou demência.
  • Comprometimento cognitivo leve (CCL): É definido como presença de pelo menos 1 queixa cognitiva subjetiva associada a déficit cognitivo objetivo (evidente a partir de testes cognitivos aplicados) em que não há repercussão nas atividades de vida diária (AVDs). Deve ser excluída a possibilidade de delirium.
  • Demência: Presença de comprometimento em pelo menos 2 domínios cognitivos (memória, linguagem, função executiva, gnosia ou praxia) e há repercussão significativa nas atividades de vida diária (AVDs).
    As etiologias para demência podem ser dicotomizadas em causas reversíveis e não reversíveis. Dentro do grupo de etiologias não reversíveis, destaca-se doença de Alzheimer, demência por corpos de Lewy, demência frontotemporal, demência vascular, entre outros.

Qual propedêutica sugerida para pacientes com síndrome demencial?

A propedêutica inicial deve envolver uma boa coleta na história clínica, em que esta possa ser realizada de forma paralela a partir de perspectivas diferentes advindas do paciente, cuidador ou outros médicos. Durante a avaliação, é importante excluir a possibilidade de delirium para prosseguir nos 5 elementos essenciais para abordagem de uma síndrome demencial.

  1. Excluir etiologias reversíveis: há causas como deficiência de vitamina B12, hipotireoidismo, sífilis, infecção pelo HIV que podem se manifestar por queixas cognitivas.
  2. Reavaliar uso de medicamentos com atuação anticolinérgica que possam piorar sintomas cognitivos: o uso de drogas com ação anticolinérgica pode piorar sintomas cognitivos.
    Esses medicamentos são exemplificados por: tricíclicos (nortriptilina, amitriptilina) , anti-histamínicos (hidroxizina, difenidramina prometazina), neurolépticos (clozapina, clorpromazina), oxibutinina, entre outros.
  3. Exame neurológico: Identificar sinais de parkinsonismo ou alterações de funções corticais superiores (agnosia, apraxia ou afasia, por exemplo) que podem apontar uma etiologia em detrimento de outra.
  4. Baterias cognitivas clínicas + neuroimagem: Tanto a determinação de comprometimento dos domínios cognitivos na avaliação clínica como o resultado de exames de neuroimagem podem também apontar uma etiologia em detrimento de outra.
  5. Acesso sobre atividades de vida diária do paciente a partir de entrevista com o cuidador: Essa avaliação permite conferir se há repercussão significativa na funcionalidade do paciente, muitas vezes auxiliando na diferenciação entre CCL e demência.

Modelo colaborativo na assistência à demência

Como tópico final dessa aula, o palestrante descreve sobre um programa de cuidado no qual ele foi fez parte do corpo clínico de seu estudo: o Modelo de Cuidado em Envelhecimento Cerebral. Foi um ensaio clínico desenvolvido em meados de 2000, apresentando desfecho positivo com NNT equivalente a 3.7. Esse modelo inicialmente realizado em Indiana, atualmente já possui aplicação em outros centros dos Estados Unidos.

O Modelo de Cuidado em Envelhecimento Cerebral consiste em um centro que dialoga com quatro diferentes áreas:

  1. Atenção Primária Clínica: há uma troca dinâmica de discussões clínicas entre o centro e essa área. Consiste em detectar e tratar delirium ou outros sintomas psiquiátricos, assim como otimizar o sistema colinérgico através de descontinuação de drogas anticolinérgicas ou prescrição de inibidores de colinesterase quando há indicação formal para tal.
  2. Time de especialistas: ocorre troca dinâmica do centro com especialistas na área como geriatras, psicologista, entre outros.
  3. Foco no Cuidador: o centro coordena e entrega assistência ao cuidador do paciente a partir de aconselhamento, psicoterapia em grupo, cuidados de descanso e desenvolvimento em habilidades para solução de problemas.
  4. Mudança Ambiental: o centro coordena e oferta acesso à segurança em domicílio assim como suporte na adesão ao tratamento farmacológico.

Um dado extremamente interessante na prática clínica desse modelo de assistência está atrelado aos impactos em serviços de assistência de saúde e em indicadores na qualidade de saúde dos indivíduos acometidos. Foi observado, com a aplicação desse modelo de cuidado, redução em taxas de hospitalização e de tempo de internação hospitalar.

Além disso, os pacientes assistidos por esse modelo apresentavam prescrições farmacológicas mais adequadas, com maior taxa no uso de antidepressivos e drogas antidemência e uma menor taxa no uso de anticolinérgicos. Foi também notado que essa população apresentava melhor perfil metabólico, com taxas mais controladas de LDL e HbA1C quando comparados ao grupo controle.

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