FDA aprova donanemab, droga modificadora para doença de Alzheimer
Após a aprovação do lecanemab, o donanemab é a segunda terapia modificadora de doença a ser aprovada regularmente pela FDA. Antes da aprovação dessas drogas (lecanemab e donanemab), as terapias até então vigentes (como os inibidores de acetilcolinesterase e antagonista de receptor NMDA) para essa doença eram de intuito sintomático, isto é, amenizam os sintomas cognitivo-comportamentais-funcionais da doença de Alzheimer (DA) embora não interferissem na fisiopatologia dessa condição.
A doença de Alzheimer é a principal causa neurodegenerativa de demências. Trata-se de uma condição prioritária do ponto de vista de saúde pública, em que 55 milhões de indivíduos atualmente vivam com essa condição globalmente.
Evidências científicas do donanemab
Kinsula, nome comercial do donanemab, pertencente à indústria Lilly, é um anticorpo monoclonal com alvo para terminal N truncado da proteína beta-amiloide. Essa droga, portanto, atua na via da cascata amiloide, principal via fisiopatológica considerada atualmente para justificar a doença de Alzheimer.
A efetividade e a segurança da droga foram avaliadas através do ensaio clínico de fase 3, TRAILBLAZER-ALZ 2 trial, publicado pela JAMA em 2023. A população estudada nesse ensaio clínico foram indivíduos com DA sintomática inicial (CCL ou demência em estágio leve) a partir da escala iADRS (integrated Alzheimer Disease Rating Scale), que mensura aspectos cognitivo-funcionais. Nesse estudo, onde foram realizados biomarcadores para comprovação biológica da DA, o grupo intervenção foi segmentado conforme grau de patologia tau (baixa- média carga ou alta carga).
Após 76 semanas de follow-up, o grupo de participantes com baixa-média carga de patologia tau que receberam tratamento ativo apresentou redução de 35,1% na progressão dos sintomas cognitivos-funcionais ao comparar com o placebo. Ao considerar, em conjunto, os participantes com qualquer grau de intensidade de patologia tau (baixa e média ou alta) do grupo intervenção, também foi encontrada redução da progressão dos sintomas da doença através da aplicação da escala iADRS, mas em menor magnitude (22,3%).
Considerando segurança de droga, um dos desfechos estudados foi o desenvolvimento de Anormalidades de Imagem Relacionadas à Amiloide (ARIA), que são alterações no tecido cerebral compatíveis com edema (ARIA-E) ou hemorragias (ARIA-H) na qual seu impacto pode variar, podendo ser assintomático ou sintomático com graus leve, moderado ou grave. No ensaio clínico, foi observada ARIA-E em 24% e 2,1% e ARIA-H em 31,4% e 13,6% no grupo intervenção e no grupo placebo, respectivamente. Uma grande preocupação descrita nesse estudo foi a ocorrência de três óbitos relacionados ao tratamento em decorrência de complicações de ARIA, sendo dois participantes carreadores heterozigóticos do alelo ε4 do gene da apolipoproteína E, na qual comprovadamente aumenta o risco de ARIA.
Considerações sobre indicação da droga e perspectivas futuras
A aprovação de uma nova terapia modificadora de doença para uma doença neurodegenerativa e de curso progressivo, claramente, é uma notícia bem-vinda. Ainda assim, algumas ressalvas são fundamentais para interpretar esse anúncio com cautela.
Em primeiro lugar, o donanemab não é um tratamento indicado para todos os indivíduos com doença de Alzheimer. A população com doença de Alzheimer indicada são indivíduos com comprometimento cognitivo leve devido à DA ou demência em estágio leve.
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Para prescrição desse medicamento, portanto, os indivíduos devem apresentar evidências biológicas da doença, possíveis apenas com a aplicação de biomarcadores (exames complementares que repercutem em gastos financeiros em saúde). Considerando a realização do tratamento como um todo, no qual é uma droga venosa com infusão a cada 4 semanas e com necessidade de monitoramento através de ressonância magnética de crânio, há um gasto financeiro significativo, o que limita o acesso à terapia.
Embora seja medicamento que demonstrou redução dos sintomas cognitivo-comportamentais com redução da carga amiloide cerebral, o curso progressivo da doença ainda permaneceu mesmo que em velocidade menor ao comparar ao placebo do ensaio clínico. Portanto, essa terapia, mesmo sendo modificadora de doença, não é uma droga na qual expressa uma cura dessa condição.
Portanto, com a introdução dessas terapias modificadoras de doença, o médico prescritor deverá ter um maior preparo quanto às indicações e contraindicações dessa terapia, assim como da prescrição e do monitoramento do uso dessas drogas. É importante enfatizar que, no Brasil, as terapias aprovadas, até então, pela ANVISA são as terapias sintomáticas da doença: inibidores de acetilcolinesterase (donepezila, rivastigmina e galantamina) e antagonistas de receptor anti-NMDA (memantina). Ainda segue pendente o posicionamento da ANVISA em relação ao lecanemab e donanemab.
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