Existe relação entre uso de inibidores de bomba de prótons (IBPs) e demência?
Estudo randomizado controlado analisou a associação entre o uso de inibidores da bomba de prótons (IBPs) e o risco de demência.
Os inibidores da bomba de prótons (IBPs) estão entre os medicamentos mais utilizados no mundo para tratar doenças gastrointestinais. A introdução dos IBPs na prática clínica revolucionou os tratamentos da doença do refluxo gastroesofágico e das úlceras pépticas, por serem muito eficientes na supressão da secreção ácida se comparados aos antagonistas dos receptores de histamina-2 (antagonistas-H2). Os IBPs são geralmente bem tolerados, com poucos efeitos colaterais imediatos, porém tem crescido a preocupação sobre potenciais efeitos adversos com o uso crônico, tais como: deficiência de vitamina B12, supercrescimento bacteriano do intestino delgado, neoplasia gástrica, fratura de fêmur e demência.
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Muitos pacientes e até profissionais de saúde mostraram-se apreensivos com estes possíveis efeitos colaterais dos IBPs.2 Grande parte dessa preocupação baseou-se em um estudo retrospectivo de Gomm e colaboradores,3 realizado em uma grande base de dados, que concluiu que os usuários de IBPs tiveram aumento de uma a cinco vezes no risco de demência, em comparação com aqueles pacientes não usuários de IBPs. A partir deste estudo, dentre outros anteriores, sugeriu-se que o uso de IBPs estaria associado ao aumento do risco de demência ou declínio cognitivo. O problema é que estes estudos tinham vieses pela avaliação incompleta do uso de outros medicamentos e pela falha na contabilização de fatores de confusão na análise. Outro problema é que consideraram diagnósticos baseados em alegações de demência, sem confirmação por testes objetivos, o que levou a erros de classificação diagnóstica.
Novo estudo e métodos
Em 2023, Mehta e colaboradores publicaram na Gastrenterology um estudo randomizado controlado sobre o assunto.4 O trabalho fez uma análise post-hoc de outro estudo sobre prescrição de aspirina diária em idosos com mais 65 anos. Os participantes não tinham previamente doenças cardiovasculares, demência ou deficiência física ao início do estudo. Os participantes só foram incluídos no estudo sobre IBPs caso pontuassem mais de 78 pontos no Miniexame do Estado Mental Modificado (3MS). Os participantes foram excluídos caso houvesse desistência/falecimento antes da primeira visita anual (n=15) ou se não havia informações sobre comorbidades (n=165). Depois destas exclusões, o estudo ficou com 18.934 participantes que foram acompanhados por até sete anos. Em todas as avaliações, os participantes informaram os medicamentos em uso e foram agrupados de acordo com o tipo de IBPs (omeprazol, esomeprazol, pantoprazol, lansoprazol, rabeprazol ou dexlansoprazol) e a geração da medicação (primeira geração: omeprazol, pantoprazol e lansoprazol; segunda geração: esomeprazol, rabeprazol e dexlansoprazol). Os pacientes também foram agrupados de acordo com o uso de antagonistas-H2 (famotidina, nizatidina ou ranitidina).
Resultados
Entre os 18.934 idosos incluídos no estudo 24,6% eram usuários de IBPs e 9% faziam uso de antagonistas-H2. O uso de IBP não foi associado a maior incidência de demência (HR 0,88; IC 95%, 0,72–1,08) ou com alterações no desempenho cognitivo geral ao longo do tempo (p=0,85). Da mesma forma, não foram observadas associações entre o uso de antagonistas H2 e qualquer parâmetro cognitivo.
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Conclusão e mensagem prática
Em adultos com mais de 65 anos de idade, o uso de IBP ou antagonistas-H2 não foi associado à incidência de demência ou declínio cognitivo ao longo do tempo. No entanto, o caráter do estudo (análise post-hoc) limita a interpretação dos resultados, de forma semelhante aos estudos prévios sobre o tema. A realização de um estudo prospectivo poderia resolver de vez essa questão.
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