A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) é uma condição frequente na população pediátrica, apresentando-se clinicamente com sintomas de regurgitação, vômitos recorrentes, perda ou dificuldade de ganho ponderal, irritabilidade, epigastralgia e, até mesmo, sintomas extraintestinais. Sua incidência é estimada em cerca de 10% dos lactentes saudáveis, aumentando para 50-90% em lactentes com defeitos congênitos, como atresia esofágica (AE) ou hérnia diafragmática congênita (HDC), podendo evoluir com possíveis complicações, como pneumonias.
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Inibidores de bomba de prótons
Os inibidores de bomba de prótons (IBP) são a primeira linha de tratamento para a DRGE. Dentro dessa classe, o omeprazol é uma das medicações mais conhecidas e utilizadas em lactentes, disponível em cápsulas, comprimidos revestidos ou endovenoso. Um grande desafio é o estabelecimento efetivo do tratamento medicamentoso, devido às dificuldades enfrentadas com a apresentação da medicação.
As apresentações atualmente disponíveis não permitem uma dosagem exata para os lactentes jovens, já que a dose inicial média de 3 mg considerando como base o peso de um recém-nascido (calculado a partir da dose recomendada de 1 mg/kg/dia) é muito menor do que a formulação sólida mais baixa disponível (10 mg/dose). Nesse contexto, surgem buscas por alternativas de oferta do medicamento, como triturar os grânulos ou comprimidos, resultando em comprometimento da eficácia da medicação.
Um estudo holandês realizou um ensaio clínico piloto randomizado em pacientes com DRGE e diagnóstico concomitante de AE ou HDC com correção cirúrgica, avaliando a eficácia de uma dose única de omeprazol via oral (VO) ou viral retal (VR) em lactentes com os critérios acima citados. Para mensurar de forma exata a resposta ao IBP, foi utilizado um medidor de pH portátil (Orion, Medical Measurement Systems) com uma sonda de medição de duas pontas, uma aferindo o pH no esôfago e a inferior aferindo o pH no estômago por 24 horas, com posição confirmada por radiografia de tórax.
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O monitoramento do pH foi realizado por 48 horas. O primeiro monitoramento de 24 horas foi realizado após a interrupção do omeprazol por 4 dias e da domperidona por 2 dias. O omeprazol VO ou VR foi administrado como tratamento padrão após o wash-out, antes de ser realizado um segundo monitoramento de pH de 24 horas. Os resultados relevantes obtidos foram:
- Um total de 34 lactentes foram incluídos no estudo e submetidos ao monitoramento do pH esofágico e estomacal, porém apenas 17 receberam a medicação do estudo por limitações financeiras e necessidade de interrupção do ensaio clínico;
- Dos participantes, 4 pacientes tinham diagnóstico de AE e 13 tinham diagnóstico de HDC com correção cirúrgica;
- Dos 17 pacientes, 8 receberam omeprazol VO e 9 VR;
- O grupo que recebeu omeprazol VO era composto por 50% de pacientes do sexo masculino. Já o grupo que recebeu omeprazol VR foi composto por 7 meninos (78%) e 2 meninas (22%);
- A mediana de peso de nascimento dos pacientes que receberam omeprazol VO era de 3 kg e dos pacientes que receberam omeprazol VR foi de 3 kg;
- A mediana de idade dos pacientes durante a realização da aferição do pH foi de 54 dias de vida para os que receberam omeprazol VO e cerca de 64 dias para aqueles que receberam omeprazol VR;
- O tempo total de refluxo em minutos e porcentagens e o número de episódios de refluxo de pH < 4 foram reduzidos de forma estatisticamente significativa após a administração de omeprazol VO e também VR;
- A administração VO e VR de omeprazol resultaram em níveis séricos semelhantes.
Conclusão e discussão
Os resultados apresentados nos sugerem a possível utilização inovadora e promissora do omeprazol VR como alternativa para o tratamento da DRGE. O estudo em questão apresentou diversos obstáculos, dentre eles o financeiro e logístico para a conclusão e inclusão de um maior número de pacientes para análise.
O resultado obtido com o uso do omeprazol VR foi tão satisfatório quanto o omeprazol VO, sem diferenças significativas entre os grupos. Em alguns países, a apresentação VR de medicações de uso rotineiro, como paracetamol, já é uma realidade ampla, o que sugere que o omeprazol provavelmente será mais facilmente aceito nesses países, especialmente para superar os desafios da administração VO e de outras formulações de IBP orais. Entretanto, barreiras poderão ser encontradas em regiões onde a VR não é comumente utilizada por uma determinante sociocultural.
Referências bibliográficas:
- Bestebreurtje P, de Koning B, Roeleveld N, Knibbe C, Tibboel D, van Groen B, van de Ven CP, Plötz FB, de Wildt SN. Rectal Omeprazole in Infants With Gastroesophageal Reflux Disease: A Randomized Pilot Trial. European journal of drug metabolism and pharmacokinetics. 2020;45(5):635–643. doi: 10.1007/s13318-020-00630-8.
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